Cassado há um ano, Crespo diz não ter mágoas e que continua na política
O prefeito cassado José Crespo durante entrevista. Crédito da foto: Vinicius Fonseca (12/8/2020)
Um Crespo contido e ameno, bem diferente do que se viu ao longo de boa parte de sua vida política. O agora prefeito cassado José Antonio Caldini Crespo recebeu o Cruzeiro do Sul para entrevista exclusiva, cujo mote é o aniversário de um ano de sua cassação.
O encontro ocorreu em residência que virou escritório, no centro de Sorocaba, cujo imóvel, segundo ele, é herança de família. Futuro político, mágoas, a cassação, inimigos e Jaqueline Coutinho foram alguns dos temas da entrevista.
O retrato de quem já levou uma serpente à tribuna da Câmara de Sorocaba, que insinuou que um promotor trabalharia alcoolizado, que fez de um secretário em imagem em papelão presença em uma reunião, que distribuiu pizza na votação do Plano Diretor de Sorocaba, que chamou um chefe do Executivo durante quatro anos de rainha da Inglaterra, que quase partiu para as vias de fato com outro vereador por causa de um assessor, o agora Crespo, ao menos durante a entrevista, demonstrou ser paz, amor e resiliência.
Entretanto, ele nega mudanças. “Não sei, não enxergo isso. Me considero a mesma pessoa. Naturalmente agora, que deixei o cargo, e depois, com a pandemia, a vida de todos nós mudou, até pelo isolamento”, diz.
Durante os últimos meses, Crespo afirmou que recebeu apoio, visita e telefonemas. “Tive atividades caseiras, mas tive também atividades políticas”, comenta. “Foi um período sabático para a gente analisar melhor todas as relações, não só a política, mas a relação de vida. Foi muito positivo também”, afirma.
Ele também respondeu sobre quem deu apoio no momento pós-cassação. “Tive muitos apoios, mas, claro, muito do nosso grupo político. Não só daqueles que estavam no próprio governo, de partido e de simpatizantes”, garante. “A vantagem minha é que já completei 30 anos de atividade pública e política. Então, as pessoas já conhecem quem é o Crespo, quanto às coisas boas, em paralelo com falhas”, comenta.
Sem ressentimentos
Crespo não respondeu sobre pessoas que não o procuram, mas garante que dialogou com muitas. “Não sei citar o nome de alguém que não veio. Antes (da pandemia) acredito que conversei com todas as pessoas envolvidas na política. Diálogo creio que é a obrigação de todo agente público”, opina.
Quando questionado sobre diálogos com vereadores que votaram pela sua cassação, ele é enfático. “Também, incluindo esses (...) sem problema nenhum.”
“A vantagem minha é que já completei 30 anos de atividade pública e política. Então, as pessoas já conhecem quem é o Crespo”
Ele diz ainda não sentir mágoa. “Além de cidadão e de uma pessoa experiente na política, sou cristão. Perdoar é uma virtude e ser tolerante, compreendendo as razões do outro, mesmo que não seja da sua conformidade. Então, não tenho rancor, não tenho ressentimento. Não fiquei em depressão, nada disso”, lembra.
Crespo não relutou em ser entrevistado, mas evitou cravar o ato com a data em que se completava os 365 dias da cassação. A data inicial, inclusive, sugerida por ele, era 13 dias depois, mas antecipada para 11 de agosto.
De fato, ocorreu em 12 de agosto, já que no dia anterior haveria uma audiência na Justiça do caso que ficou conhecido como marido de aluguel. Aliás, ele tratou sobre o assunto. Foi questionado pela reportagem se denunciaria a então vice-prefeita se eles não tivessem se desentendido, ao que respondeu que sim, que não incorreria em prevaricação.
Armação política
Pivô de um dos momentos mais conturbados da história política de Sorocaba, José Crespo não adjetiva a situação que o levou a perder o mandato como conspiração, mas tacha como armação política. “O que posso dizer é que não houve motivos para a cassação. São assuntos técnicos. A minha cassação não foi jurídica ou judicial, foi legislativa, o que é possível. Mas vereadores podem cassar o prefeito, independente do motivo ou da consistência das acusações. Não houve nenhum tipo de comparação.”
Ele ainda diz que não há inconformidade de sua parte, mas ressalta. “Mas se não foi conspiração, com certeza foi uma armação política que sofri.”
Na sala azul da discreta residência, apenas o homem que ocupou o mais alto cargo do Executivo de uma das cidades mais importantes do Estado de São Paulo. Dois assessores acompanharam do corredor, incluindo Carlos Mendonça, seguidor de Crespo desde os tempos do Legislativo e conhecido no episódio de distribuição de coxinhas para servidores na casa de Crespo, em um protesto, em 2017.
“Nada impede a minha candidatura a vereador. Pode ser que eu seja, mas ainda não tomei essa decisão”
O fato de ter sido eleito com uma base de 16 vereadores e ter sido cassado pelo mesmo número de votos, em 2019, também foi tema de questionamento. “Falhas pessoais minhas ou do governo, sempre existem. Não considero dessa forma. Eu nunca nem sequer pretendi tutelar quem quer que fosse. Nunca assediei vereadores, agentes políticos nesse caso para estarem incondicionalmente do meu lado. Sempre respeitei o mandato”, garante.
Crespo também foi questionado sobre a escolha do seu primeiro escalão, em especial, se se arrepende dos nomes. “E creio que não é adequado agora e não foi antes eu tecer em nomes, seja de quem for. Todas as nomeações que fiz, com a liberdade que o meu mandato permitia, foram para pessoas da minha confiança. Se alguém me enganou, não cumpriu as diretrizes do governo (...) é um julgamento difícil de eu fazer. Se alguém traiu a minha confiança, é um problema que aconteceu e que o tempo irá julgar”, comenta. Questionado se sente traído, ele alega que não guarda sentimento negativo.
O Dia D
Sobre a dia da cassação, Crespo afirmou que tinha convicção, além da garantia de parlamentares, que tinha votos suficientes para evitar a cassação. Por isso, foi determinada a paralisação da leitura de todo o processo, contrariando o que havia solicitado anteriormente a defesa. “De fato, eu entendi que não seria cassado. Já tinha, na conversa pessoal com uma quantidade suficiente de vereadores, recebido essa informação. Infelizmente, vários votos mudaram, por algo que eu chamo de interesses venais. Nada mais do que isso, nesse momento, eu posso dizer.”
Ele também comentou se, nas mesmas condições de 2016, aceitaria concorrer à Prefeitura de Sorocaba. Crespo afirma que se tivesse continuado no cargo, a reeleição ocorreria de forma automática, mas que, na situação atual, não tem essa intenção.
Sobre a disputa na Câmara, ele diz que já há uma lista do partido, mas que ele não está nela. “Nada impede a minha candidatura a vereador. Pode ser que eu seja, mas ainda não tomei essa decisão.”
Crespo disse que respeita Jaqueline Coutinho, tanto que não tem feito críticas ao seu governo. Ele ainda alega que no tempo de seu governo, 500 obras e serviços foram realizados em Sorocaba.
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Por fim, ele afirmou que está bem de saúde, física e mental. “A gente pretendia, por sinal, voltar ao cargo. Isso não aconteceu. Então, essa questão técnica, jurídica, está superada. A vida continua. Todos os fatos vem à tona, mesmo que leve algum tempo.” (Marcel Scinocca)