Liga Metálica
Pesquisa resulta na descoberta de materiais metálicos de extrema qualidade e dureza
O objetivo é que esses materiais possam substituir os materiais já consolidados no mercado
A panela, o garfo e a latinha de refrigerante. O carro, o avião e o navio. O brinco, a presilha do cabelo e a pulseira... Basta olhar a nossa volta para encontrar milhares de produtos feitos de metal. Desde a pré-história, o ser-humano utiliza este tipo de material para fabricar ferramentas e produtos que facilitam a nossa vida.
“E, cada vez mais, estamos dependentes dos metais”, afirma Rafael Fonseca Beccari, pesquisador da Universidade de Sorocaba (Uniso). “Embora o ser-humano utilize metais como bronze, ferro e cobre, há mais de 5 mil anos, a maioria dos metais de alto desempenho foram desenvolvidos nos últimos 150 anos. E, na última década, surgiu um novo paradigma para o design de ligas (mistura de dois ou mais metais) para melhorar o produto”, explica Beccari.
Para contribuir com o aperfeiçoamento das ligas metálicas, Beccari desenvolveu uma importante pesquisa para sua dissertação em Processos Tecnológicos e Ambientais da Uniso. Ele criou uma série de ligas equiatômicas (mesma concentração molar) de alta entropia compostas de seis a nove elementos, resultando em materiais inéditos e de qualidade. “As ligas que produzi apresentaram propriedades de dureza excepcionais, superando trabalhos semelhantes da literatura mundial", ressalta o pesquisador.
O estudo, que resultou na dissertação chamada de “Projeto e Caracterização de Ligas Multi-elementares", foi apresentado em 2019 e produzido sob a orientação do professor doutor Thomaz Augusto Guisard Restivo.
Aperfeiçoando o metal
Apesar de todos os avanços na metalurgia, muitas ligas metálicas continuam apresentando defeitos que podem aparecer de diversas formas. Recentemente, em 2004, um novo conceito em metalurgia física foi introduzido, chamado de Ligas de Alta Entropia (LAEs). Essas ligas são definidas como tendo mais de cinco elementos metálicos principais, cada um com uma porcentagem atômica entre 5% e 35%. Na liga ideal, todos os elementos possuem a mesma porcentagem atômica.
“Existem muitas oportunidades para criar ligas novas, melhores que as tradicionais, e com uma ampla gama de aplicações. Por exemplo, as LAEs têm três vantagens sobre os sistemas atuais de ligas metálicas: exibem alta resistência à tração, inibem a formação e crescimento de precipitados a temperaturas mais altas e mostram excelente resistência à corrosão”, detalha Beccari.
Segundo ele, as Ligas de alta entropia podem ser usadas em aplicações de alta temperatura, como turbinas a gás, bicos de foguetes e construção nuclear. Os pesquisadores esperam que essas ligas possam substituir materiais convencionais em condições operacionais difíceis e rigorosas, fornecendo desempenho superior em serviço. “Em resumo, essas ligas têm aplicações potenciais em diferentes campos e espera-se que substituam os materiais tradicionais em muitos setores”, diz o pesquisador.
Aplicações inovadoras
Em sua pesquisa, Beccari elaborou novas ligas multielementares equiatômicas monofásicas nos sistemas cúbico de corpo centrado (CCC) e cúbico de face centrada (CFC) para avaliar suas propriedades mecânicas e físico-químicas. “O objetivo é que esses materiais possam apresentar aplicações inovadoras e substituir os materiais já consolidados no mercado, com ênfase em ferramentas de corte e conformação”, explica.
Após elaborar e produzir as novas ligas metálicas, Beccari estudou suas propriedades mecânicas, como dureza e tenacidade, microestrutura, propriedades físico-químicas e resistência à corrosão em meio salino. “Alguns novos conceitos e processamentos foram desenvolvidos para o emprego de critérios baseados em equivalentes de cromo e níquel e fusão de mistura preparada a partir de pós metálicos”, detalha.
Beccari também fez um tratamento de cementação nos materiais, que consiste na introdução de carbono na superfície da liga para aumentar a dureza e melhorar suas características. "A cementação conduziu a endurecimentos contundentes dos materiais, criando uma liga metálica comparada às cerâmicas avançadas de elevada dureza, o que permite novas aplicações para esse material", afirma. A resistência à corrosão em meios salinos também foi um sucesso, apresentando resultados muito superiores em relação a materiais consolidados, como aços inoxidáveis.
Para produzir as ligas, os elementos foram selecionados, pesados, homogeneizados, prensados, fundidos em forno a plasma e a arco elétrico. As amostras foram cortadas, embutidas e polidas, possibilitando a condução de ensaios de dureza, de onde se pôde estimar a tenacidade à fratura, análise metalográfica, fluorescência, difração de raios-X, espectroscopia por energia dispersiva em microscópio eletrônico de varredura e ensaios de corrosão eletroquímica.
Depois de todos esses testes técnicos, Beccari tinha em mãos materiais metálicos de extrema qualidade e dureza superiores a todos os materiais já conhecidos. “A pesquisa cumpriu os seus objetivos, que visam ao desenvolvimento de novas ligas para aplicações inéditas ou alternativas a materiais como o metal duro ou, até mesmo, para substituir ferramentas diamantadas para corte e conformação", conclui.
Texto elaborado com base na dissertação “Projeto e Caracterização de Ligas Multi-elementares”, do Programa de Pós-Graduação em Processos Tecnológicos e Ambientais da Universidade de Sorocaba (Uniso), elaborada sob orientação do professor doutor Thomaz Augusto Guisard Restivo e aprovada em 4 de abril de 2019. A dissertação pode ser encontrada e baixada no site.
Texto: Marcel Stefano
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