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Uniso Ciência

Fitoterápicos como tratamento para a artrose

Ainda faltam evidências científicas para embasar a prescrição médica

04 de Abril de 2022 às 15:16
Nem toda pesquisa da saúde se faz em laboratório: as pesquisadoras cruzaram os resultados de múltiplos estudos clínicos
Nem toda pesquisa da saúde se faz em laboratório: as pesquisadoras cruzaram os resultados de múltiplos estudos clínicos (Crédito: Paulo Ribeiro / Arquivo-Uniso)

Dor nos quadris? Rigidez nos joelhos? Pode ser sinal de osteoartrite, também conhecida como artrose, uma das doenças musculoesqueléticas mais comuns entre adultos e idosos, principalmente entre as mulheres. A linha de frente no tratamento — ao menos aquela recomendada pelos médicos tradicionais — é o uso de anti-inflamatórios não esteroides, mas nem todo mundo opta por seguir a recomendação. Uma das justificativas é a ocorrência de efeitos indesejados, que podem incluir doenças cardiovasculares e gastrointestinais. Quais são, então, as alternativas?

Garra-do-diabo, unha-de-gato, sucupira-preto. Pelo menos três variações de salgueiro. Algumas delas você pode até encontrar na sua cozinha: gengibre, cúrcuma, abacate. São muitas as opções de medicamentos fitoterápicos, como são chamados aqueles cujas bases são as plantas medicinais. As formas de apresentação também são várias: soluções, cápsulas, extratos e por aí vai.

“É crescente o uso de medicamentos fitoterápicos em todo o mundo. Esse uso varia significativamente de país para país, dependendo das práticas culturais, da disponibilidade das plantas e também da disponibilidade de programas voltados à saúde.” A afirmação é de uma equipe de pesquisadores da Uniso — os professores doutores Cristiane de Cássia Bergamaschi, Luciane Cruz Lopes e Marcus Tolentino Silva, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, além da doutoranda Mariana Del Grossi Moura e da mestra Maria Carolina Silva, do mesmo programa —, com a participação dos seguintes coautores externos: a professora doutora Maique Weber Biavatti, da Universidade Federal de Santa Catarina, e o professor doutor Sean Alexander Kennedy, da canadense McMaster University. Eles tiveram publicado um estudo sobre o uso de medicamentos à base de fitoterápicos para o tratamento da osteartrite, cujos resultados integrais podem ser conferidos no periódico especializado Phytotherapy Research.

A grande vantagem dos fitoterápicos em relação aos anti-inflamatórios é a suposta falta de efeitos indesejados. Todavia, ainda que o uso desse tipo de medicamento seja uma prática comum no Brasil, os pesquisadores alertam para o fato de que a segurança e a eficácia de alguns desses agentes pode não ser assim tão clara. E é exatamente por isso que se faz necessário cruzar os dados dos estudos clínicos a respeito desse assunto, especialmente para embasar a prescrição dos fitoterápicos no sistema público de saúde, como é o caso do artigo produzido pela equipe.

“Esses achados norteiam aqueles que prescrevem os medicamentos, os gestores do sistema público de saúde e os pacientes no que diz respeito à tomada de decisão quanto ao uso dos fitoterápicos”, ressalta Bergamaschi, a orientadora do estudo.

Processo e resultados

Metodologicamente, a pesquisa se deu por meio de uma revisão sistemática, de modo a sintetizar os resultados de múltiplos estudos clínicos controlados já publicados por pesquisadores em todo o mundo. A partir daí, foi aplicada uma técnica chamada meta-análise, que permite combinar os resultados de vários estudos científicos sobre o mesmo assunto.

Foram estabelecidos critérios para que os estudos existentes fossem elegíveis ou não. Depois, grandes repositórios de pesquisas foram vasculhados, em busca de estudos clínicos que incluíssem os fitoterápicos disponíveis no Brasil para o tratamento da osteoartrite. A análise considerou estudos clínicos envolvendo pacientes adultos e vários tipos de fitoterápicos. No total, após uma seleção inicial conduzida pelos autores, que trabalharam em pares, 16 estudos foram considerados (dos quais nove foram considerados para a meta-análise). Nenhum deles foi realizado no Brasil.

Alguns dos aspectos considerados a partir dos resultados foram o alívio da dor dos pacientes, a recuperação das suas funções físicas, melhorias na qualidade de vida, a presença de efeitos indesejados e a satisfação geral do paciente em relação ao tratamento.

Das 16 plantas consideradas na pesquisa, há estudos clínicos disponíveis compreendendo apenas seis: a indiana salai guggul, a cúrcuma, a garra-do-diabo, uma das variações de salgueiro, a unha-de-gato e o gengibre. “Desses, apenas três fitoterápicos se mostraram benéficos em relação a alguns dos critérios observados”, resumem os pesquisadores.

A cúrcuma (C. longa ou C. domestica) apresentou efeito semelhante ao ibuprofeno, anti-inflamatório indicado para dor, inflamações e febre, exceto pelos efeitos indesejados no sistema digestivo. Já em relação à unha-de-gato (U. guianensis) e ao gengibre (Z. officinale), ambos mostraram-se mais eficientes para a redução da dor do que o placebo aplicado em grupos de controle. Esses são alguns resultados positivos para quem está procurando uma alternativa, mas infelizmente eles não são suficientes.

Os autores advertem que a qualidade da evidência é baixa ou moderada, em parte devido ao fato de a maioria dos estudos ter apresentado falhas metodológicas significativas, o que dificulta a análise tanto da eficácia quanto da segurança desses medicamentos. Daí a necessidade de mais pesquisas clínicas que contemplem o tema. “Ou seja”, resume Bergamaschi, “até o momento não há certeza dos benefícios e da segurança no uso destes fitoterápicos para o tratamento da osteoartrite.”

Para saber mais: Osteoartrite e fitoterápicos no Brasil

A pesquisa indica que, no Brasil, as formulações de fitoterápicos comercializados para o tratamento da osteoartrite são baseadas nas seguintes plantas:

- Harpagophytum procumbens (ou garra-do-diabo);

- Uncaria tomentosa e Uncaria guianensis (ambas conhecidas como unha-de-gato);

- três variações diferentes de salgueiro: Salix alba, Salix daphnoides e Salix purpurea;

- Curcuma longa (a popular cúrcuma, também usada na culinária);

- Chenopodium ambrosioides (ou erva-de-Santa-Maria);

- Cordia curassavica (ou sálvia negra) e Cordia verbenacea (ou erva baleeira);

- Zingiber officinale (gengibre);

- Persea gratissima ou Persea americana (abacate);

- Boswellia serrata (planta de origem indiana conhecida como salai guggul);

- Bowdichia virgilioides (ou sucupira-preto).

Com base no artigo “Oral herbal medicines marketed in Brazil for the treatment of osteoarthritis: a Systematic Review and Meta-analysis”, publicado no periódico Phytotherapy Research, em setembro de 2017, de autoria da doutoranda Mariana Del Grossi Moura, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Uniso, com orientação da professora doutora Cristiane de Cássia Bergamaschi. Também são coautores os seguintes pesquisadores da Uniso: Luciane Cruz Lopes, Maria Carolina Silva e Marcus Tolentino Silva, além dos seguintes pesquisadores externos: Maique Weber Biavatti (Universidade Federal de Santa Catarina) e Sean Alexander Kennedy (McMaster University). Acesso: https://cutt.ly/ED5r73s

Texto: Guilherme Profeta