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Busca pela herança cultural

17 de Novembro de 2020 às 00:01

Busca pela herança cultural Vale do Anhangabaú, no centro de SP, integra afroroteiro. Crédito da foto: Divulgação / Prefeitura de São Paulo

A turismóloga Carina Santos embarcou para um mochilão em 2015. Um ano depois, o jornalista Guilherme Soares Dias se jogou em uma jornada por 25 países. Como muitos jovens que se aventuram pelo mundo, os dois voltaram transformados. Mas também com um peculiar estranhamento em comum: a sensação de ser o único negro nos lugares.

“Quando fui fazer mochilão, eu me inspirei em influenciadores, que eram pessoas brancas. Só que nenhum viajante que li me disse que eu poderia ser abordado no meio da rua pela polícia em Veneza, provavelmente porque isso não acontece com eles”, diz o jornalista, que na volta criou o Guia Negro, com dicas de restaurantes, serviços e passeios para esse público. Em 2018, ele fundou com Luciana Paulino a Black Bird, cujo principal produto é a Caminhada São Paulo Negra.

Em três horas de tour, da Liberdade à República, são vistos lugares como a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e o antigo Pelourinho. “A gente apresenta a cidade para quem mora nela: 80% do nosso público é paulistano. Isso é poderoso. A pessoa passa todo dia no Anhangabaú e não sabe que era uma estrada de pessoas escravizadas. Vai à Liberdade e não sabe que o bairro tem esse nome por causa de um negro.” No primeiro passeio após a pandemia, realizado em 20 de outubro, o grupo foi seguido e abordado por policiais. “A pessoa negra é olhada como o diferente, não é o padrão. Não entendem que pode ser um tour.”

Transformação

Dias acredita que o setor de viagens irá se transformar assim como ocorreu com a indústria da estética, com produtos para cabelos de volumes diversos e peles de vários tons. “As pessoas negras estão querendo viajar dessa forma. Travel Noire e Black and Abroad são grandes agências internacionais desse movimento.”

Carina também retornou sentindo necessidade de fazer algo novo. Criou a Black Travelers em 2016 para mostrar a cultura negra do Brasil para estrangeiros -- “meu público é majoritariamente americano”. Dois anos depois, em sua primeira viagem à África, para Moçambique, viu que o próximo passo era levar brasileiros para lá e para países da diáspora negra. “O primeiro pensamento de viagem para o exterior é projetado para Europa ou Estados Unidos porque várias agências oferecem isso”, diz. “A gente pensava que era muito difícil de ir para a África, mas não é.” O próximo grupo embarca em julho de 2021.

O passeio em São Paulo e o pacote para Moçambique são oferecidos ainda pela Diaspora.Black, marketplace, que quase fechou com a crise da Covid-19, mas que atingiu 700% de crescimento no últimos seis meses em comparação ao mesmo período de 2019. “Agora temos experiências afrocentradas online. Continuamos chegando às pessoas com os mesmos princípios, a partir da tecnologia promovendo a história e a cultura negra”, diz Carlos Humberto da Silva Filho, à frente da startup com três sócios. Ele ressalta, porém, que não abandonou os passeios presenciais. (Nathalia Molina - Estadão Conteúdo)