Buscar no Cruzeiro

Buscar

Novo normal

Orquestras inovam pensando no mundo virtual

12 de Setembro de 2020 às 00:01

Orquestras inovam pensando no mundo virtual

Obras foram escritas para serem gravadas individualmente. Projeto envolveu 40 artistas. Crédito da foto: Reprodução Youtube

Existe vida inteligente no reino das orquestras sinfônicas. Esta é a melhor notícia destes tempos pandêmicos em que todos nós fomos relegados à interação virtual.

Mas vamos por partes. Primeiro, a má notícia. Em geral, nossas orquestras passaram por dois estágios nos últimos seis meses: atarantadas, descobriram as lives; e crentes que descobriram ouro, estão simplesmente replicando as situações convencionais de concerto no mundo digital. Detalhe: não há nada mais constrangedor do que maestros e músicos agradecendo a uma sala totalmente vazia. Nada mais empobrecedor, tedioso mesmo, do que assistir a concertos e recitais com som vagabundo e “câmeras-estátuas”, inertes em frente aos músicos.

A grande notícia é que, ao menos, uma orquestra realizou não um, mas dois projetos absolutamente inovadores e adequados para os tempos atuais. Nada de replicar situações de concerto. O maestro Abel Rocha, de 58 anos, entendeu rapidamente, desde março, que, para continuar se legitimando na sua comunidade e realizando um trabalho adequado ao novo normal, era necessário virar tudo do avesso. Começou fomentando a criação de um repertório pensado para o novo normal. Microestreias da Quarentena, lançado em maio, é um ovo de Colombo, tamanha a simplicidade. Rocha encomendou obras a oito compositores brasileiros de várias tendências, de Neymar Dias a Alexandre Guerra, de Leonardo Martinelli a José Guilherme Ripper, de Alexandre Lunsqui e Mauricio de Bonis a Chico Mello e João Cristal.

Detalhe: obras já pensadas, antes mesmo de chegarem ao pentagrama, que deveriam circular nas redes sociais. E mais: que os músicos tocariam separadamente, cada um em sua casa. O resultado está disponível no YouTube. “Cada obra foi escrita para quatro a seis músicos, que gravaram individualmente suas partes em suas casas”, diz Rocha. “Ao todo, 40 artistas participaram do projeto.” A equipe técnica trabalhou com extremo cuidado na edição e sincronização dos vídeos. “Foi um enorme desafio”, diz o maestro, que chegou a gravar bases para orientar cada músico.

Ou seja, um trabalho ao mesmo tempo minucioso e monumental para pôr em pé cerca de 40 minutos de música distribuídos em 8 obras bem diversificadas. Cada uma também é apresentada pelo compositor. Não exagero em dizer que é um divisor de águas, uma lição de como a música nova deve - e pode - ser dignamente produzida e interpretada. Bingo. Acesso universal, gratuito, a qualquer tempo. Como todas as cabecinhas digitais funcionam hoje em dia. (João Marcos Coelho - Estadão Conteúdo)