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Meditar é bom, mas não é indicado para todos

20 de Outubro de 2018 às 10:07

Meditar é bom, mas não é indicado para todos Paz interior e autoconhecimento são alguns dos objetivos dos adeptos da meditação. Crédito da foto: Pixabay.com

Em tempos de estresse social e ritmo acelerado de vida, muitas pessoas têm buscado na meditação uma forma de manter o equilíbrio. Essa prática vem sendo cada vez mais difundida e se popularizou, ou seja, aparentemente está ao alcance de todos. Mas será que é mesmo indicada para qualquer pessoa ou há restrições? O que de fato é meditar e quais as diferenças entre as práticas disponíveis?

A meditação pode ser definida como uma prática na qual o indivíduo utiliza técnicas para esvaziar os pensamentos, visando alcançar um estado de clareza mental e emocional. Sua origem é antiga, remontando às tradições orientais, especialmente a ioga, mas o termo também se refere a práticas adotadas por alguns caminhos espirituais ou religiões, como o budismo e cristianismo. O ato de meditar, no entanto, não está ligado a nenhum tipo de religião e tem sido cada vez mais adotado pelas pessoas em geral.

Conforme a médica psiquiatra Ana Paula Ribeiro Zozolotto, a prática leva o indivíduo a um estado mental mais equilibrado e pode ajudar a controlar sintomas de ansiedade e depressão. Mas também tem suas restrições. Roberto Cardoso, no livro “Medicina e meditação: Um médico ensina a meditar”, afirma que as pessoas que já tiveram o diagnóstico confirmado (ou sob suspeita) de esquizofrenia não devem meditar. “Embora ainda não tenhamos uma explicação convincente, temos visto que cerca de 80% desses indivíduos costumam piorar quando meditam.”

Para aqueles que insistem, afirma Roberto em sua obra, costuma-se sugerir que, tanto nos casos de esquizofrenia, quanto nos “transtornos depressivos maiores”, a meditação deve ser introduzida, idealmente, em combinação com um psiquiatra. “Consideramos ideal que não haja sintomas há dois anos, e que o praticante esteja sem uso de medicação há, no mínimo, um ano.”

Para quem é dependente de álcool e/ou faz uso de drogas ou alguns tipos de medicamentos, como para epilepsia, a meditação também é desaconselhada. A atividade altera a química do cérebro e essas drogas têm a mesma ação.

Mais uma recomendação do médico: “Não creio ser uma boa ideia dormir e nem fazer sessão de psicoterapia após meditar, pois o cérebro ainda está ‘processando’ a experiência.”

Para quem pretende fazer meditação ou já faz, o médico alerta que algumas atitudes que podem dificultar a prática, como fazer jejum prolongado por mais de 12 horas ou meditar após ter comido muito, beber ou usar cocaína.

Também é desaconselhada a prática excessiva, principalmente para iniciantes. “O ideal é meditar no máximo umas duas vezes por dia”, diz. Roberto ainda afirma que meditar deve ser um exercício constante, leve e sem expectativas.

Advaita vedanta diz que todos somos um

Meditar é bom, mas não é indicado para todos

Prática advaita vedanta foi tema de atividade em Sorocaba. Crédito da foto: Emidio Marques / Arquivo JCS (27/8/2018)

Em Sorocaba existem diferentes grupos que se reúnem para buscar na meditação uma forma de melhorar a qualidade de vida, por meio do autoconhecimento. O monge indiano Swami Probuddhananda Puri, mestre em meditação advaita vedanta tem percorrido países para divulgar o conhecimento adquirido com seu guru Sri Bhagavan, fundador da Sociedade Vedanta Internacional. Quando esteve no Brasil, Puri passou por Sorocaba e conduziu uma prática durante evento promovido por meio de parceria entre o Saúde a Vida Espaço Terapêutico e Espaço Enéade. Swami afirma que meditar é uma forma de conexão consigo mesmo e com Deus. Mas não deve ser feita sem orientação.

Meditar é bom, mas não é indicado para todos

Swami Puri, monge indiano. Crédito da foto: Emidio Marques / Arquivo JCS (27/8/2018)

A palavra vedanta vem de “Vedas”, os livros sagrados da Índia, e “anta”, que significa final, ou seja, vedanta é a parte final e mais avançada dos Vedas. Apesar de ser vista como religião por alguns, pela sua proximidade com o hinduísmo, vedanta não é uma religião. Confira a entrevista:

Cruzeiro do Sul - Pode explicar melhor o que é o advaita vedanta?

Swami Probuddhananda Puri - É uma ciência a respeito do nosso self não-dual. A gente pensa que existem muitas pessoas, muitos indivíduos, muitas almas, que cada pessoa representa uma alma, a gente acredita que cada pessoa é individual, mas o vedanta diz que existe apenas uma alma que se manifesta em cada um de nós, apesar de termos nacionalidades diferentes, crenças diferentes, religiões diferentes, raças diferentes. Então a nossa alma é uma só, essa é a essência do advaita vedanta.

CS - Mas no que essa prática se difere de outras?

SPP - O que posso dizer é que qualquer meditação que nos conduza à verdade e ao self, pode ser considerada uma meditação vedanta. Qualquer meditação que busque aprimorar qualidades físicas, mentais ou intelectuais não são meditações do vedanta. A base do vedanta propõe ir para além desse mundo, da nossa mente, e alcançar o nosso self. A meditação vedanta não vai ensinar você a melhorar a vida no dia a dia, melhorar a mente ou o corpo... não vai. O propósito é a realização do self. E isso é o que de fato melhora definitivamente a sua vida, independente de qualquer coisa que aconteça. Quando você alcança essa realização do self, aí ganha tudo: paz na mente, comunhão com os outros, isso significa saber reconhecer quem você é.

CS - Existem relatos de pessoas que a meditação as levou a uma despersonalização. Como é possível?

SPP - Isso não é vedanta. O vedanta é guiado, nunca vai levar a pessoa a um estado que ela vai se perder. O propósito é experimentar sua real natureza. Quando você tem essa experiência, a meditação não é mais necessária, isso porque depois da realização pessoal do self, você sempre está em estado de meditação, mas não é aquela de olhos fechados e pernas cruzadas, qualquer coisa que você faça é meditação.

CS - A meditação é indicada para todos?

SPP - Não. O vedanta não pode ser praticado por conta própria, a pessoa precisa aprender com um mestre, passo a passo, para evitar acontecimentos como o da despersonalização. É o mesmo que tomar um remédio sem consultar um médico, pode ser que você tenha um problema. Se tiver pessoas interessadas em adquirir esse conhecimento, eu posso voltar a Sorocaba, só é preciso ter pessoas interessadas em ouvir, assim posso passar para as pessoas esse conhecimento incrível. O contato pode ser feito pelo telefone (11) 99664-8741 com Fábio

ou pelo site www.naodualidadevedanta.org.

CS - Como é ter o self realizado?

SPP - Quando você deixa de se enxergar como corpo, mente e ego, reconhece o seu self. E encontrar esse eu é a verdadeira felicidade, é descobrir quem você é. Quando você realiza isso, você é divino. É sinônimo de liberdade, de paz, de felicidade. Quando encontro resposta para a pergunta quem eu sou, descubro que eu sou um, eu sou todos, e todos nós somos um.

CS - É possível se sentir realizado em meio a essa crise que estamos vivendo?

SPP - A crise de hoje não é nova para nós. A civilização tem seus altos e baixos, então se você quiser fazer algo pela raça humana, realize o seu self, porque assim começará a irradiar uma certa energia para as pessoas ao seu redor.

SERVIÇO - No Espaço Enéade tem meditação de segunda, quarta, quinta e sexta-feira, às 18h30, conduzida pela terapeuta Luzia Santos. Contribuição: R$ 15. O local fica na rua Fernando Silva, 190, Edifício Premium Office, sala 106, Jd. Astro. Contato pelo telefone (15) 99606-3010.

Grupo atende crianças em Brigadeiro Tobias

Meditar é bom, mas não é indicado para todos

Postura correta e controle de ansiedade são benefícios para crianças. Crédito da foto: Emidio Marques / Arquivo JCS (27/8/2018)

A prática da meditação é diferente quando se trata de crianças bem pequenas. No caso delas, não há contra-indicação, porque as características da personalidade ainda estão em formação. Há mais de 20 anos, um grupo de Sorocaba -- que aprendeu o método com o filósofo ucraniano Bohdan Wijtenko --, leva essa prática a escolas infantis da rede municipal. O projeto, que inicia crianças com idade aproximada de 5 anos, é aplicado sob coordenação de Noel de Carvalho Filho, especializado em filosofia clínica. Também atuam no grupo Jane Ernesto, o fotógrafo Sergio Roberg e o empresário Luiz Nitsche. Este último é que coordena as reuniões de meditação para adultos que pretendem ser voluntários. As vagas estão abertas a todos os interessados.

Atualmente, como a equipe está pequena, o projeto é oferecido apenas no CEI 13, Centro de Educação Infantil em Brigadeiro Tobias. Os exercícios também contam com enfoque voltado aos ensinamentos da médica e educadora Maria Montessori, que chamava a prática de Lição do Silêncio. Entre os benefícios para os pequenos, afirma a voluntária Jane Ernesto, está evitar hábitos como o de ficar em posição inadequada, seja no sofá ou assistindo TV, por exemplo. “A postura errada compromete o bom funcionamento dos órgãos do corpo”, diz. Em seguida, vem a questão da respiração, que vai se tornando mecanicamente inadequada e curta, ou rápida demais. Por último tem a agitação mental, que vai se instalando na mente desde cedo e com isso vem estados ansiosos e, consequentemente, depressivos.

Nitsche, que orienta o grupo de adultos, de forma gratuita, lembra que meditar não é brincadeira. “Se a pessoa pratica às vezes, como forma de relaxamento é uma coisa, mas se for algo regular, diário, com o objetivo de focar no silêncio mental, é preciso orientação”, observa ele. “Quando você vai numa academia, seu corpo não está acostumado a fazer musculação, então se você usar o aparelho de forma equivocada, pode lesionar o músculo, por isso é necessário ter alguém para orientar. Com a meditação é a mesma coisa, tem técnica específica”, acrescenta.

Ele lembra que há casos em que a prática não é recomendada. “Precisa ser cuidadoso. Pessoas com alguns tipos de distúrbios psiquiátricos não podem meditar. Há casos de gente que tem dopamina (uma substância química no cérebro) em excesso e a meditação amplifica essa substância, o que pode levar a alucinações”, afirma Nitsche. O técnico é que irá avaliar quem pode ou não participar. O grupo se reúne na av. Antonio Carlos Comitre, 1.350, Campolim, toda quarta-feira, às 19h, e sábado, às 10h. Contato: (15) 3231-7799, com Nitsche.

Projeto Una quer espalhar paz e união

Aristides Mendonça Júnior e Pétuli Consentini coordenam o projeto Una Mundo, que consiste na meditação por meio do cântico de mantras pela paz e união. “Os mantras cantados, que nós fazemos, se chamam bhajans ou kirtans, é uma forma um pouco mais extrovertida”, afirma Aristides, mais conhecido como Ari.

De acordo com ele, também é possível alcançar esse estado de equilíbrio entoando mantras com o auxílio de um colar chamado de japamala. Nesse caso, o mantra é recitado e não cantado; dá também para fazer isso apenas mentalmente. Já o cultivo do silêncio é outra forma de se concentrar. Nesse caso, a meditação é feita através do foco em um ponto por entre as sobrancelhas. “É uma forma de abstrair de qualquer pensamento e conseguir entrar em contato com a sua parte mais íntima”, diz Ari, sobre outras técnicas.

Para o coordenador do Una Mundo, “a humanidade anda muito louca.” “Existe muito ódio, intolerância, necessidade de correr e esvaziamento das emoções mais verdadeiras, dos sentimentos mais nobres. Precisamos resgatar essa emoção que existe em cada um por meio de práticas que possam trazer a pessoa para o próprio centro.”

Por isso a proposta de levar adiante o projeto. “A ideia é que a pessoa esteja consigo mesma, que consiga se sentir, se perceber, que descubra o que traz prazer para ela, quais coisas fazem sentido para ela, o que está fazendo nesse mundo, o que ela pode entregar de melhor”, reflete.

Ari lembra que não basta só exercitar o físico, mas os espaços de silêncio, para cada vez mais acalmar os pensamentos.

As reuniões, que eram semanais, estão sendo feitas agora uma vez por mês na Biblioteca Infantil, situada na rua da Penha, 673, Centro. A contribuição é voluntária. Contato e datas dos eventos podem ser obtidos na página do Facebook unamundo.pelapaz. (Daniela Jacinto)

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