Saúde
Janeiro Branco: é preciso cuidar da saúde mental
Janeiro é o mês de atenção à saúde mental - Foto: Pixabay
O início do ano costuma ser um período de reflexão para novos caminhos, posturas e hábitos mais saudáveis. Nesse contexto, que tal tornar o cuidado com a saúde mental uma de nossas prioridades? Esse é a proposta da campanha Janeiro Branco criada em 2013 por psicólogos mineiros, com o objetivo de destacar a importância do tema.
A psicóloga clínica Elvira Cairo acredita que seja uma oportunidade de refletir sobre a qualidade dos nossos relacionamentos e como lidamos com as emoções, propondo uma visão preventiva. “Dá para prevenir a saúde mental”, avalia. A psicanalista e grupoanalista Maria Clara Barbbosa observa que há preconceito com o tema. “As pessoas ainda relutam muito em cuidar da mente, da saúde mental. Ainda associam muito com ‘loucura’”, conta. Ela acredita, no entanto, que um movimento de mudança começa a acontecer. “Temos um número crescente de pessoas que procura a terapia porque reconhece a importância de estar bem e em equilíbrio”, diz.
A promoção da saúde mental mostra sua importância em dados como os da Organização Mundial da Saúde (OMS), que indicam que a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio no mundo. A psicanalista Maria Clara aponta que outros profissionais da saúde já passam a reconhecer a importância da saúde mental e muitos encaminhamentos chegam hoje por meio de outras especialidades, como fisioterapia, por exemplo -- uma compreensão das consequências físicas das aflições emocionais.
Abaixo, serão abordado dois aspectos importantes na promoção da saúde mental: o cuidado desde a infância e o amparo às gestantes e mães.
As crianças também sofrem
Atenção à saúde mental deve começar cedo - Foto: Emídio Marques/Arquivo JCS
No imaginário popular, a infância costuma ser retratada como a melhor fase da vida, recheada de pura alegria. Porém, as crianças também estão sujeitas ao sofrimento. Por isso, a atenção à saúde mental deve começar cedo. Elvira Cairo, psicóloga clínica e presidente da Associação Criança, aponta que os cuidadores (pais ou outros responsáveis) e também a escola são essenciais na promoção de um ambiente positivo. “Saúde mental é afeto e diálogo”, diz.
Contudo, ainda há resistência entre os pais para admitir que algo não vai tão bem. “Quando um filho está com dor de estômago o pai corre para o pediatra para ver. Por que quando o pai percebe que essa criança está mais deprimida ou agressiva não pode procurar um profissional para se orientar? Tudo que é preventivo é muito melhor”, diz.
Professores e diretores de escola acabam sendo os primeiros a levantar a questão. “A escola é um fator primordial para a saúde mental de uma criança, tanto no aspecto de diagnóstico quanto em questões de prevenção. É lá que a criança se sociabiliza, é lá que as coisas acontecem no dia a dia”, explica. A promoção do respeito e do diálogo seria importante no ambiente escolar, em que características como a timidez ou a obesidade, por exemplo, podem acabar sendo alvo dos outros colegas de turma.
Elvira Cairo, psicóloga clínica e presidente da Associação Criança - Foto: Erick Pinheiro
Os problemas mais comuns na infância e adolescência seriam os transtornos alimentares, depressão, cutting (auto-mutilações), transtorno de humor e agressividade infantil. Entre as causas estariam os fatores hereditários, infecções durante a gestação e logo após o nascimento, assim como o ambiente. Os tratamentos para as crianças seriam permeados por recursos lúdicos, comunicação e o estabelecimento de um vínculo de confiança com o profissional. O envolvimento dos pais também é necessário.
Ela ressalta que a falta de atenção e diálogo, em tempos de fixação digital, são questões que precisam ser discutidas. Elvira destaca ainda a importância de compreender a criança como um indivíduo, que não atenderá a todas as expectativas dos pais. “Essa criança tem que ser acolhida e amada desde o início da vida. Costumo dizer que o amor cura e a falta dele adoece”, diz.
Associação Criança
A Associação Criança, entidade que está há 25 anos na cidade, coordena três Centros de Atenção Psicossocial (CAP’s), em parceria com a Prefeitura de Sorocaba. O projeto atende crianças de 0 a 18 anos, com transtornos emocionais e psíquicos graves. O trabalho é desenvolvido por uma equipe multidisciplinar abrangendo cerca de 900 crianças ao mês. Os atendimentos ocorrem pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A depressão que pode surgir após o parto
A duração da depressão pós-parto varia de três meses a dois anos - Foto: Pixabay
Os primeiros dias após o parto costumam ser difíceis para as mães, que passam por mudanças físicas e psicológicas. Porém, a atenção e o cuidado com a saúde mental das gestantes e puérperas pode evitar quadros como a depressão pós-parto ou ajudar a detectá-los.
A psicanalista e grupoanalista Maria Clara Barbbosa, fundadora do Instituto Las Lobas, explica que até 15 a 30 dias do parto é normal que a mulher sinta oscilações de humor, apatia, tristeza e momentos de euforia. Esse estado é chamado de “baby blues”. Mudanças hormonais influenciam no comportamento da mulher, assim como a assimilação das profundas alterações em sua vida. Nessa fase, muitas passariam por um “luto” em relação a mulher com menos responsabilidades que um dia foram. “Essa mulher nunca mais existirá quando nasce um bebê”, observa. Porém, se o estado emocional se prolonga ou é muito acentuado pode ser um caso de depressão pós-parto.
Essas mulheres podem sentir uma dificuldade de vínculo com o bebê e com todas as mudanças que ocorrem. “As mulheres com depressão pós-parto sentem acima de tudo uma desconexão consigo mesmas”, aponta. Além disso, ainda sofrem com a culpa gerada por aqueles no entorno que insistem em minimizar a dor, com frases como “esse é momento mais feliz da vida de uma mulher”. As mulheres com depressão pós-parto têm dificuldade para buscar ajuda, sendo importante a intervenção dos companheiros e familiares.
Maria Clara lembra que oscilações hormonais influenciam no pós-parto - Foto: Divulgação
Mulheres que precisam interromper a ingestão de medicamentos para depressão ou ansiedade, devido a gestação, precisam de atenção especial. Segundo a psicalinalista, florais e terapias podem ajudar nesse processo. “A mulher durante a gestação precisa ser amparada pelo companheiro, família e amigos para prevenir a depressão pós-parto”, explica.
A duração da depressão pós-parto varia: três meses, seis meses ou até dois anos, por exemplo. Quando o quadro é muito grave pode desenvolver surto psicótico, com o desejo de ferir a si mesma e até o bebê. Se não tratada corretamente, pode se tornar uma depressão crônica, com recorrências ao longo da vida. Por isso, a ajuda profissional é essencial.
Vínculo
A profissional explica que nos primeiros seis meses é normal que mãe e filho formem um forte vínculo -- fase em que as mulheres dedicam-se quase que integralmente ao bebê. Influenciadoras digitais e celebridades, porém, exibem corpos perfeitos e rotinas alucinadas pouco tempo após o parto. A profissional, no entanto, ressalta que esses são exemplos irreais de pessoas que contam com um sistema de apoio formado por dinheiro e recursos que não costuma estar disponível para mulheres comuns. “É um caso em um milhão de mulheres que conseguem retomar a vida de maneira rápida”, diz.
Ajuda profissional auxilia a entender fase de adaptação
Conversas e a confiança no psicólogo ajudam a atravessar períodos difíceis - Foto: Pixabay
O auxílio profissional foi essencial para que a família de um estudante de 13 anos, de Boituva, conseguisse compreender melhor sua personalidade e como lidar com ela. A mãe do menino, Carla*, de 49 anos, conta que a família se mudou de São Paulo para o interior e que perceberam que ele estava enfrentando dificuldades de adaptação na nova escola. A preocupação era com o impacto da mudança na saúde mental do adolescente. “A gente pensou que ele estava guardando alguma coisa, por sentir a falta dos amigos”, recorda.
A família também temia que o garoto guardasse alguma mágoa de um período na infância em que a irmã mais nova ficou doente e os pais precisaram dar mais atenção para a menina. O medo era de que o filho pudesse ter se sentido deixado de lado. A terapia com a psicóloga Elvira Cairo, no entanto, dissipou os temores e ajudou na compreensão de que o adolescente é na verdade mais reservado e tímido, sendo preciso encorajá-lo a se engajar nas atividades. “O que ele precisa é de motivação”, conta.
A mãe relata que o tratamento durou por volta de um ano e que o vínculo criado entre o filho e a psicóloga foi essencial. “Ele se sentiu bem e confiou nela”, diz. Sobre o preconceito que ainda possuem alguns pais, que não procuram ajuda, acredita que os maiores prejudicados sejam os filhos. “É uma judiação para essa criança”, avalia. Ela conta que sua família, assim como o adolescente, estiveram abertos para o tratamento, que trouxe lições positivas.
*nome fictício
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