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Onde está o direito deles?

28 de Janeiro de 2021 às 16:41
Da Redação [email protected]

Estudo feito pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, e publicado na Revista Scien­ce, mostrou que a Covid-19 é dez vezes mais mortal em pacientes com síndrome de Down. Crédito da foto: Adival B. Pinto (20/03/2014)

A Lei Brasileira de Inclusão (LBI) já determina que o poder público reconheça as pessoas com deficiência como vulneráveis e obriga o Estado a adotar medidas de proteção em caso de situação de risco, emergência e calamidade pública.

O Brasil é referência mundial na criação de leis que defendem os direitos das pessoas com deficiência, mas existe uma grande dis­tância entre “ter” e “cumprir” as leis. A campanha de vacinação contra a Covid-19 é apenas mais um episódio nesta luta constante pela garantia de direitos.

No estado de São Paulo, assim como ocorre na maioria do País, apenas as pessoas com deficiência com mais de 18 anos que vivem em instituições de longa permanência foram inseridas no grupo prioritário que irá receber a vacina na primeira fase.

O assunto gerou debate entre as lideranças do setor que passaram a questionar o poder público e buscar respostas. Se na briga política pela vacina o estado de São Paulo se coloca como “defensor da ciência”, na hora de executar o plano de vacinação parece que a coisa não é bem assim.

Um estudo desenvolvido pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, e publicado na Revista Science em 15 de dezembro, mostrou que a Covid-19 é dez vezes mais mortal em pacientes com síndrome de Down, além de aumentar em cinco vezes os casos de hospitalização em função da doença. O mesmo estudo já havia sido publicado em outubro na revista científica Annals of Internal.

O assunto gerou repercussão em vários países do mundo, nos quais autoridades epidemiológicas passaram a refletir sobre a vacinação prioritária para pessoas com síndrome de Dow e Transtorno do espectro autista, além de considerar todas as pessoas com deficiência intelectual como grupo prioritário.

A decisão também levou em consideração outro estudo inglês, desta vez desenvolvido pelo Public Health England, comandado pelo Sistema Público de Saúde da Inglaterra, que revelou que a taxa de mortalidade por Co­vid-19 em pessoas com deficiência intelectual no país é quatro vezes maior que a média da população em geral.

Enquanto isso, no Brasil, parece que nossas autoridades se permitem o direito de escolher apenas a parte da “ciência que lhe convém”, deixando de fora do grupo prioritário quase 3 milhões de pessoas com deficiência intelectual.

Para que LBI fosse fielmente cumprida, todas as pessoas com deficiência deveriam ser incluídas no grupo prioritário. Segundo dados do IBGE, o Brasil tem cerca de 50 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência (24% da população). Um número grande? Sim.

Mas é possível fazer uma outra leitura sobre a questão e criar uma política de vaci­nação eficaz, se considerarmos o número de pessoas com deficiência de acordo com as recomendações do Grupo de Washington, que estabelece um panorama nacional e internacional da produção de indicadores so­ciais:

“Considera-se somente pessoa com deficiência aquela que declarou, no Censo Demográfico (IBGE, 2010), ter “grande dificuldade” ou “não consegue de modo algum” enxergar (deficiência visual), ouvir (deficiência auditiva) ou se locomover (deficiência motora), além daquelas pessoas que declararam

ter deficiência mental/intelectual”.

O grupo de pessoas com deficiência contempladas neste caso seria de 17,4 milhões de pessoas (8,3% da população total). Ao menos este grupo deveria ser prioritário, claro.

Para que as mudanças ocorram será preciso uma intensa pressão popular, já que as pessoas com deficiência têm pouca representatividade nas esferas políticas. Aliás, este problema é um reflexo da falta de políticas inclusivas, já que mulheres e pessoas negras, por exemplo, têm cota mínima de candidatos e utilização de verbas nos pleitos eleitorais. A pessoa com deficiência tem? Não! A falta de representatividade faz isso: direitos que existem, mas são ignorados.