10 milhões de jovens não concluíram ensino médio
Evasão escolar no Brasil se agrava a partir dos 15 anos. Crédito da foto: pixabay.com
Os dados sobre a escolarização da população brasileira vêm melhorando, mas ainda mostram uma forte desigualdade, especialmente a partir da adolescência, quando parte expressiva dos jovens ainda interrompe os estudos. O País tem 10,1 milhões entre 14 e 29 anos que não frequentam a escola nem concluíram o ensino médio, sendo 7,2 milhões pretos ou pardos. As informações são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua: Educação 2019, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na quarta-feira.
Os dados mostram que o abandono escolar se agrava a partir dos 15 anos. Metade dos rapazes que abandonaram a escola alega que precisava trabalhar. Entre as mulheres, 23,8% deixaram os estudos porque ficaram grávidas. “É óbvio, se olhar a realidade heterogênea do Brasil, a gente sabe que muitos têm de trabalhar cedo porque precisam prover dinheiro para casa. Mas impressiona como a questão da gravidez entre as mulheres faz com que haja uma ruptura da questão escolar”, disse Marina Aguas, analista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE.
Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco, organização que atua para a melhoria da educação pública no Brasil, comenta que entre os diversos fatores que explicam a evasão escolar, como vulnerabilidade social e econômica, o racismo é o traço mais importante.
“Proporcionalmente, os negros estão em famílias mais vulneráveis”, diz. Segundo ele, o racismo estrutural que foi naturalizado e é negado ou ocultado no Brasil rebate em todas as estruturas do País, incluindo a educação.
O impacto do abandono escolar, independentemente do motivo ou gênero, é da mesma natureza. “Não entrar na escolaridade básica é preditor garantido de uma péssima inserção na vida adulta e tem uma implicação inequívoca que será a inserção precária no mundo do trabalho”, afirma Henriques. Ele indica, ainda, que parte da evasão tem a ver com o próprio ambiente escolar, como no caso de crianças que sofrem bullying.
Segundo o IBGE, elevar a instrução e a qualificação dos jovens é uma forma de combater a expressiva desigualdade educacional do País, mas também pode facilitar a inserção no mercado de trabalho, reduzir empregos de baixa qualidade e a alta rotatividade, especialmente em um contexto econômico desfavorável. Para o porta-voz do Instituto Unibanco, o discurso de que bastaria dar oportunidades iguais a todos na base educacional não garante menor evasão. “Isso é uma tese abstrata sem vínculo com a realidade brasileira, que não consegue dar conta do desafio histórico da sociedade que tem racismo estrutural e onde a população negra é majoritária”, comenta.
Apenas 41,8% dos adultos pretos ou pardos acima de 25 anos tinham concluído o ensino básico obrigatório em 2019, ante 57% da população branca na mesma faixa etária. Os pretos e pardos tinham, em média, 8,6 anos de estudos, enquanto os brancos tinham estudado 10,4 anos, quase dois anos a mais.
Frequência
As taxas ajustadas de frequência escolar líquida -- que mostram as pessoas em idade escolar que cursam a etapa adequada de ensino para a respectiva idade -- evidenciam que o atraso e a evasão afetam mais a população negra ao longo do progresso escolar. “O início dos gargalos já é no ensino fundamental”, ressaltou Adriana Beringuy, analista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE. Até a faixa de 10 anos, brancos e negros tinham uma taxa de frequência escolar líquida similar, perto de 96%. Entre os 11 e 14 anos, o resultado descia a 90,4% entre brancos, mas ia para 85,8% entre pretos ou pardos. Quando considerada a taxa ajustada de frequência escolar líquida ao ensino médio entre as pessoas de 15 a 17 anos, o resultado foi de 79,6% para brancos e de 66,7% entre pretos ou pardos. “Se já vem atrasado, ele tem mais chance de sair (da escola) nessa idade, e tem o trabalho concorrendo com o estudo”, explicou Marina Águas.
A pesquisadora do IBGE lembra que já existe uma discussão ampla sobre como tornar o ensino médio mais atraente para os jovens, mas ressalta que é preciso também levar em consideração a necessidade de parte expressiva dos alunos que precisa conciliar os estudos com o trabalho e os afazeres domésticos. “Não é só uma questão de atração pela escola, de querer aprender, estudar, mas a questão do trabalho, tem de fazer com que ele também tenha tempo para o trabalho.” (Daniela Amorim e Ludimila Honorato - Estadão Conteúdo)