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Eu já li

Um livro para acarinhar a memória

Artigo escrito por Vanessa Marconato Negrão

09 de Setembro de 2023 às 23:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Divulgação)

Eu me lembro com carinho de um grande pilão que ficava na casa da minha vó Dinha. Achava graça quando minha mãe dizia para eu não mexer na “mão” do pilão -- “mão” é o que pessoas comumente chamam de socador. Eu ficava imaginando como aquele objeto tão curioso era útil no passado. Minha mãe explicava que nele se fazia o pó dos grãos de café torrado, quirera de milho para alimentar as aves e que sua principal função era a de descascar arroz (sim, arroz antes do beneficiamento tem casca). Enfim, o pilão da minha bisavó mora na minha memória: seu contorno acinturado, a aspereza de sua madeira, o peso do socador. Uma lembrança que imediatamente veio na memória assim que eu li “Os dengos na moringa de voinha”, publicado pela Brinque Book.

Objetos assim ajudam a contar uma história e, nesse caso, quem está presente do início ao fim como testemunha do afeto entre vó e neta é uma moringa, “avermelhada igual dendê e uma barriga imensa que mais lembra o baobá do quintal”. As moringas são objetos usados para armazenar e servir água, mantendo-a sempre fresquinha, muito utilizadas em comunidades quilombolas.

O texto de Ana Fátima é entremeado com palavras de origem banto, uma língua de ascendência africana, o que reforça a ancestralidade na narração. As ilustrações de Fernanda Rodrigues, cheias de tons terrosos, aguçam ainda mais a sensação de sentir o âmago daquela família em seus dengos, cafunés e amores.

Vanessa Marconato Negrão é professora e apaixonada pela literatura infantil