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Eu já li

Bem mais que um livro

Artigo escrito por Vanessa Marconato Negrão

19 de Setembro de 2021 às 00:01
Cruzeiro do Sul [email protected]
(Crédito: Divulgação)

David Lapoujade, um grande filósofo, em um dos seus livros, narra um fato que me lembrei imediatamente quando li pela primeira vez “O que é que isso é?”. Na cena descrita, uma criança junta vários objetos de uso comum, grandes, pequenos, diferentes entre si e os arruma cuidadosamente sobre a mesa, de um jeito que lhe pareça bonito. A mãe chega distraída e pega um desses objetos que vai precisar e o recoloca no seu lugar, e repete o gesto com todos os outros objetos. Só quando termina de recolher tudo, percebe que a criança estava brincando com aquelas coisas, e lamenta dizendo: “Ah, meu amor, eu não vi que era alguma coisa!”

Depois de ter passado tanto tempo da vida observando as crianças, eu aprendi: se uma criança está brincando, sempre é alguma coisa. Uma caixa vazia pode ser um castelo, um submarino, um carro ou uma paisagem inteira. Me lembro uma vez ter me deparado com a minha cama inteira desfeita, os lençois amarrados na cabeceira, uma vassoura escostada de cada lado. Meu filho estava de pé entre os travesseiros, feliz da vida, dizendo que estava navegando, que não era cama, mas um barco. A explicação rica em detalhes foi tão convincente que eu nem cogitei lhe dar uma bronca pela bagunça.

O autor desse livro é um desses caras que conseguiu prolongar a imaginação fantástica da infância pela vida adulta, e o melhor: transformando toda essa criatividade em livros. “O que é que isso é?” é mais uma criação curiosa e cheia de vida de Alexandre Rampazo.

A inspiração veio do Alexandre pai, cujas filhas já são adultas mas que resgatou lá do fundo da memória a lembrança das brincadeiras preferidas das meninas na infância. Os brinquedos prontos (os que andam, falam e até sopram bolinha de sabão) até tinham vez, mas não sustentavam a atenção delas por muito tempo, logo em seguida elas voltavam aos bonequinhos simples, com os quais viajavam na fantasia. Quanto mais comum, melhor, mais espaço para a imaginação.

O livro traz uma surpresa adorável, um acetato vermelho esconde uma figura oculta no desenho. A cara de admiração das crianças (e dos adultos) quando a encontram é a parte mais legal da aventura. Uma publicação da Ciranda Cultural.

Vanessa Marconato Negrão é professora e apaixonada por literatura infantil.