TJ derruba lei que libera consumo de merenda por servidores da educação de Sorocaba
Desde agosto de 2015 a Prefeitura de Sorocaba não permite que servidores da educação com carga horária de seis horas comam merenda. Crédito da Foto: Luiz Setti / Arquivo JCS
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) acatou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) apresentada pelo prefeito José Crespo (DEM) e concedeu liminar que proíbe que professores, auxiliares de educação e parte dos funcionários de instituições de ensino municipais comam o que sobra da merenda que é servida aos alunos.
A liminar suspendeu os efeitos da Lei Municipal n.º 11.867, de 11 de fevereiro de 2019, de autoria do Legislativo. Desde agosto de 2015 a Prefeitura de Sorocaba não permite que servidores da educação com carga horária de seis horas comam merenda.
Em despacho proferido no final da tarde de terça-feira (26), o desembargador e relator da ação, Ferraz de Arruda, acatou a Adin e concedeu a liminar para suspender os efeitos da lei, pelo chamado “vício de iniciativa”, uma vez que a lei trata de matéria de competência exclusiva do chefe do Executivo, “violando o disposto nos artigos 25, 47, II, 111 e 144, todos da Constituição Estadual”.
Segundo a decisão, a lei também ignora o princípio da separação dos poderes, previsto no artigo 5º da Carta Estadual. A Câmara de Sorocaba não informou se recorrerá da decisão.
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Segundo a Prefeitura de Sorocaba, a alimentação escolar se destina exclusivamente aos alunos da Educação Básica e, além deles, “só faz jus ao benefício da merenda os inspetores de alunos, auxiliares administrativos e secretários escolares”.
Os demais funcionários, incluindo professores, diretores, vice-diretores, orientadores pedagógicos e auxiliares de educação, de acordo com o Executivo, cumprem jornadas de seis horas e, por isso, disponibilizar a merenda “iria ferir o princípio da isonomia em relação aos demais servidores públicos, que dispõem de um plano de alimentação específico previsto na legislação municipal”.
Na quarta-feira (27), com base na decisão do TJ-SP, o secretário de Educação André Gomes assinou uma instrução normativa que revoga a permissão, antes prevista na lei.
A Prefeitura de Sorocaba foi questionada se foi realizado algum estudo sobre o impacto orçamentário causado pela refeição concedida aos profissionais de educação e também qual seria esse gasto. Também foi questionado a quantidade de professores e demais funcionários impedidos de comer a merenda. As respostas não foram enviadas até o fechamento desta edição.
Histórico
Desde 2009 a lei federal número 11.947 determina que professores de escolas municipais e estaduais não consumam a merenda escolar. Muitos municípios, porém, não seguiam essa recomendação. Em agosto de 2015 a Prefeitura de Sorocaba passou a cumprir tal lei. Em maio de 2017 o vereador Vitão do Cachorrão (MDB) apresentou projeto de lei que permitia que funcionários das escolas também pudessem consumir a merenda.
Depois o mesmo vereador apresentou projeto substitutivo, prevendo que os professores e funcionários poderiam ingerir os alimentos excedentes da merenda, garantindo assim que não haveria maior gasto ao município.
O projeto de lei recebeu parecer de inconstitucionalidade da Secretaria Jurídica da Câmara de Vereadores e a Comissão de Justiça recomendou que fosse encaminhado para a oitiva do Executivo.
Em ofício datado de 28 de dezembro de 2017 e assinado pelo então secretário de Relações Institucionais e Metropolitanas, Marinho Marte (PPS), o Executivo se posicionou contra a lei, assim como a Comissão de Justiça. No dia 7 de fevereiro deste ano, a Câmara derrubou, por 18 votos a 2, o veto do prefeito ao projeto de lei e a promulgou.
“Mesquinho”
Uma professora de matemática que leciona uma escola de ensino fundamental na zona norte de Sorocaba conta que há tempos os profissionais não podem comer a merenda. “A diretora, que também não pode comer, tinha comentado sobre essa lei, mas nós continuamos não comendo para não criar problemas. É algo tão mesquinho”, disse.
Ela leciona há 14 anos na rede municipal e relata que por emendar aulas também em escolas estaduais, comia a merenda no horário do intervalo, mas há alguns anos passou a levar marmita.
Na mesma unidade escolar uma auxiliar de educação comentou que os alunos também estranham essa diferença. “Antes a gente comia junto com eles, mas depois precisamos explicar que estava proibido. É comum sobrar comida, mas ela vai toda para o lixo.”
A professora de uma creche da zona leste da cidade relata que a maioria dos profissionais fica constrangida com a situação. “Alguns podem comer, outros não. Eu estou levando um lanche e não tem problema. Mas não acredito que alguns pratos de comida a mais ou a menos façam diferença para a Prefeitura”, argumenta.
As três profissionais pediram para ter os nomes poupados para evitar retaliação. (Larissa Pessoa)