Radares funcionaram por três anos sem estudo técnicos exigidos pelo Contran
Sorocaba tem 160 radares; Contran exige avaliação anual sobre eficácia dos dispositivos. Crédito da foto: Erick Pinheiro / Arquivo JCS (19/05/2016)
Os radares de Sorocaba -- hoje 160 -- funcionaram por pelos menos três anos sem os chamados estudos técnicos de eficácia. Esses estudos são exigência do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) desde 2011. O último estudo disponibilizado pela Urbes, que gerencia o trânsito e o transporte de Sorocaba, foi assinado em 13 de julho deste ano, dez dias após serem solicitados pelo Cruzeiro do Sul. O último anterior ao deste ano havia sido feito em 2014.
Conforme a Resolução 396 do Contran, para determinar a necessidade da instalação de medidor de velocidade do tipo fixo, deve ser realizado estudo técnico com variáveis que venham a comprovar a necessidade de controle ou de redução do limite de velocidade no local. Após o equipamento instalado, esses estudos devem ser feitos periodicamente afim de verificar se a instalação do equipamento trouxe resultados. A periodicidade máxima é de 12 meses, ou seja, deve ser realizado ao menos um estudo por ano.
“Para medir a eficácia dos medidores de velocidade do tipo fixo ou sempre que ocorrerem alterações nas variáveis constantes no estudo técnico, deve ser realizado novo estudo técnico”, determina a resolução.
Desde 2014
Engenheira da Urbes Natássia, apresenta estudo assinado em julho - Crédito da foto: Emídio Marques
Conforme a própria Urbes, esses estudos não ocorreram em 2015, 2016 e 2017. “De 2016 nós não temos. Na verdade eles são controlados por dados estatísticos de acidentes. Temos um setor que controla a eficácia do equipamento”, diz a engenheira da Urbes Natássia Crepaldi Domingues, responsável pelos estudos técnicos. O último, com a assinatura de Natássia e de outro engenheiro da Urbes, é datado de 13 de julho de 2018, curiosamente, dez dias após o Cruzeiro do Sul pedir vistas dos estudos técnicos. Conforme a engenheira, esse estudo ocorreu por conta da troca do responsável técnico pela empresa. “Pensamos em fazer todo (o estudo) de novo porque agora é um novo responsável técnico”, diz. Foi disponibilizado, portanto, para consulta, um de 2014 e o outro deste ano.
Ainda conforme ela, números de acidentes, geometria da via, volume de veículos e solicitações de moradores são os principais aspectos para a instalação dos equipamentos. “Depois de implantar o ponto, pelo setor de estatística, a gente faz um levantamento de como estão os acidentes”, afirma.
A resolução do Contran também apresenta outras determinações. Toda a documentação referente aos estudos deve ser encaminhada às Juntas Administrativas de Recursos de Infrações (JARI) e ao Contran, quando solicitada. Outra exigência é que os estudos devem estar disponíveis ao público na sede do órgão ou entidade de trânsito, no caso a Urbes. A reportagem tentou ver esses documentos no dia 2 de julho. Os estudos não estavam disponíveis, a não ser que se preenchesse um formulário para apreciação da entidade com uma solicitação a respeito.
Avenida Camilo Júlio
Reprodução feita em março de 2017 mostra que não havia radar na avenida Camilo Júlio naquela data. Crédito da imagem: Reprodução / Google Street View
Outros pontos chamam a atenção, como o radar instalado no sentido centro da avenida Comendador Camilo Júlio, logo após a portaria de um condomínio. O equipamento está lá desde 2017, ou seja, conforme a documentação disponibilizada pela Urbes, foi colocado sem o devido estudo técnico, já que o estudo disponibilizado é de julho deste ano, ao menos 8 meses após o equipamento já ter sido colocado na via. Em março de 2017 ele não estava lá, conforme imagem capturada pelo Google Street View.
O contrato vigente com relação à operação dos radares de Sorocaba é de 2014, ou seja, tem pelo menos quatro anos. O contrato tinha duração de 12 meses ao custo inicial de R$ 1,1 milhão. Ao longo dos anos, entretanto, ele sofreu três prorrogações e um aditamento. A última prorrogação ocorreu em novembro de 2017 e o valor atualizado passou para R$ 1,5 milhão.
Motoristas podem recorrer das multas por radar, diz advogado
Para o advogado Ricardo Troy, que atua na defesa de questões envolvendo penalidades de trânsito, incluindo multas, é possível recorrer mesmo com as multas já aplicadas. “Essas multas não possuem validade nenhuma”, diz. Segundo ele, pecou-se com o princípio da legalidade com a falta dos estudos obrigatórios. Ele também diz que seria importante uma ação do Ministério Público do Estado (MP-SP) na questão. Ainda conforme ele, também cabe, por exemplos, ações coletivas como de associações de taxistas e de condutores de vans escolares.
O advogado também lembra que uma súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) permite que os municípios revejam seus próprios atos, assim, em tese, a Prefeitura de Sorocaba, independente de ação, pode devolver os valores já pagos. Por fim, ele critica a situação dos equipamentos na cidade. “Não é só fazer um buraco em implantar o radar”, termina.
Caráter educativo
Especialista lembra e defende o caráter educativo dos radares. Crédito da foto: Luiz Setti / Arquivo JCS (06/06/2015)
Renato Campestrini, gerente técnico do Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV) e colunista de Mobilidade Urbana da Cruzeiro FM 92,3, pensa de forma diferente. “Diante do hábito do condutor brasileiro de respeitar o limite de velocidade em pontos fiscalizados, alguns dispositivos estão sendo utilizados nas vias públicas com o forma de incentivar a redução da velocidade. Painéis eletrônicos com indicação da velocidade, por exemplo, são utilizados em rodovias, infraestrutura similar aos dispositivos também são implantadas com o mesmo objetivo, se valendo da dúvida do condutor, o que o força a reduzir a velocidade ao limite regulamentado”, diz o especialista.
“Sendo assim, ainda que eventualmente o estudo da eficácia não venha a ser realizado, o objetivo maior, incentivar a redução da velocidade acontece, o que nos leva a entender que o objetivo foi atingido”, justifica Campestrini. “Nos últimos anos Sorocaba tem reduzido o número de mortes no trânsito. Em 2016 foram 33, em 2017 o número de óbitos foi 30, e esse é um argumento importante a ser considerado na eficácia das ações desenvolvidas no município. A fiscalização eletrônica de velocidade é a forma mais justa de penalizar única e exclusivamente aquele que desrespeita os limites”, termina.
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