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Pai cursa faculdade em Sorocaba para seguir com sonho de filho falecido

11 de Agosto de 2019 às 00:02

Pai transforma a dor da perda em realização Trabalhos feitos Felipe são fontes de lembranças e inspiração para o pai. Crédito da foto: Arquivo Pessoal

Claudinei Alves, de 52 anos, é um homem de sorriso fácil, de gentileza abundante e um colecionador de histórias. Por 39 anos morou em Pilar do Sul e há 13 vive em Salto de Pirapora.

É pintor, letrista, serigrafista e estudante. Aliás, essa última atividade é o que nos leva a ouvi-lo. Isso porque ele transforma ausência em realização, lembrança em conquista.

Desde muito cedo Claudinei observava os desenhos do filho Danilo Felipe Alves da Silva, que além de possuir um talento nato, se mostrava muito dedicado à arte da ilustração. Mas o jovem que sonhava em cursar a graduação em design teve o sonho interrompido por uma depressão, em maio de 2017, aos 26 anos.

O pai havia acabado de se matricular no mesmo curso em uma universidade de Sorocaba, trancado por Felipe, como era chamado pela família. E, apesar da morte do filho, Claudinei não desistiu da graduação e decidiu seguir com o sonho do rapaz. Esse ano, movido também pelo desejo do filho, ele se forma.

À mesa, em uma pizzaria, com um emaranhado de trabalhos, parte do legado do filho, registrando para o mundo o menino sensível e inteligente que era, Claudinei lembra de quando a arte começou a aflorar em Felipe, ainda com 8 anos. Claudinei conta que, além de inspirar, estimulava o filho. “O que eu podia, eu dava para ele, livros, revistas, gibis”, lembra.

Antes mesmo de ter um computador, Felipe se debruçava sobre revistas de ilustração e design para aprender as técnicas do dom que já possuia.

Rabiscos viraram rascunhos

Aos poucos, rabiscos viravam rascunhos, que viravam desenhos, que viravam arte e que faziam um artista. Venceu concursos, aumentou o desejo de ir mais longe e ele foi.

Não demorou muito e Felipe já tinha trabalhos reconhecidos em sites nacionais, trabalhos vendidos em outros estados. Mas não era tudo. O ápice foi quando um artista espanhol, por quem Felipe tinha extrema admiração, também passou a pedir trabalhos. “Ele fez amizade com esse artista e até prestou serviços”, conta o pai orgulhoso.

A ilustração deixara de ser um hobbie de menino. Aos 15 anos, quando o adolescente, fazia trabalhos freelancers. Os grandes trabalhos vieram a partir de 2009, aos 18 anos do rapaz, assinando a criação da identidade de marcas, produtos e serviços.

Tempos depois de iniciar a faculdade, vieram os problemas. “Foi uma explosão de ideias na cabeça dele”, conta Claudinei.

Os primeiros sinais de depressão foram percebidos em 2015. “Ele foi criando os fantasmas dele, os traumas”, comenta. Em dado momento, Felipe chegou a trocar o dia pela noite, a cidade onde morava por qualquer outro lugar. Ficava dias longe da família e havia parado de entregar os trabalhos como ilustrador e design. Até quando não suportou, com fortes sinais da depressão, e decidiu que deixaria a vida.

E quantas histórias conta Claudinei ao apreciar cada desenho, como se a tinta ainda estivesse fresca, como se o grafite acabasse de descansar. Em cada ilustração uma saudade, em cada traço uma recordação. Em cada folha, um pedaço de Felipe. Ao encartar os trabalhos do filho, ele conta que deixou de olha-los com tanta frequência e explica os motivos: “Os últimos dois anos foram muito pesados”, diz.

A ideia da faculdade era como forma de facilitar a vida do filho, organizar a agenda, prospectar. Perto de concluí-la, ele lembra que os estudos deixaram de ser apenas uma forma de driblar a imensa tristeza e vazio deixados por Felipe. “ Tive que terminar essa missão. Tenho obrigação de me formar para materializar o sonho dele. Entrei na faculdade para ele e vou terminar por ele”.

Outro sonho

Depois de concluir a realização do sonho do filho, Claudinei se dedicará a outro sonho, que é trabalhar em uma agência de comunicação em sua área de formação.

Neste Dia dos Pais, o pai, com coração de estudante, celebra a realização do sonho de Felipe que também passou a ser o dele, ao lado das duas filhas, a mais velha, Sabrina Graziele Brisola Silva, a e caçula, Luane Carolina Alves da Silva, que está fora o país. Juntas, elas apoiam a determinação e prova de amor do pai. (Marcel Scinocca e Aline Albuquerque - Programa de estágio)