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Oficinas da antiga Estrada de Ferro Sorocabana estão deterioradas

02 de Fevereiro de 2020 às 00:01
Eric Mantuan [email protected]

Oficinas da antiga Estrada de Ferro Sorocabana estão deterioradas No local, há mais de 400 vagões abandonados, tomados pelo matagal que passa dos dois metros de altura. Crédito da foto: Fábio Rogério (29/1/2020)

Em total abandono desde que foi desativado pela empresa Rumo Malha Oeste S/A em janeiro de 2016, o complexo ferroviário formado pelas antigas Oficinas de Vagões, Carros e Locomotivas da Estrada de Ferro Sorocabana (EFS) se transformou em um criadouro de animais peçonhentos, insetos e roedores. Uma afronta aos quase 90 anos de história materialmente representados pelos pavilhões construídos na década de 1930 e um problema de saúde pública em pleno centro de Sorocaba.

A situação é mais grave para os moradores da rua Aparecida e alameda Kenworthy, cujas residências fazem fundo para a área de quase 500 mil metros quadrados. “Os insetos invadem a nossa casa a toda hora. Inclusive escorpiões. Está tudo abandonado e desde que fechou começou a juntar muitos bichos aqui”, reclama a aposentada Diva da Silva, 80 anos. O receio da idosa é pela proliferação do mosquito da dengue, principalmente nesta época do ano, marcado por calor e chuvas.

Abandono

A constatação do abandono é ainda mais visível de uma das arquibancadas do Estádio Rui Costa Rodrigues (Estrada). Dali se nota que parte do telhado de um dos pavilhões da oficina já veio abaixo. Dentro deles e nas linhas do pátio há mais de 400 vagões abandonados -- muitos deles completamente tomados pelo matagal, que passa dos dois metros de altura. “Há uns dois meses eu tive que pessoalmente pedir autorização para roçar o fundo do terreno da Rumo porque o mato e os cipós estavam invadindo as casas. Eu tive que fazer o serviço por eles”, revela o comerciante Ezequiel Ervilla, 47 anos.

Proprietário de dois imóveis alugados na rua Aparecida que fazem fundo com a antiga oficina ferroviária, Ervilla conta que os escorpiões viraram visitantes frequentes na região. Já os pernilongos formam verdadeiras nuvens nos fins de tarde. “É um inferno. Nós aqui descarregando os caminhões na loja, pedestres passando pela calçada e os pernilongos em enxames sobre nós”, relata, também preocupado com o risco de dengue.

Responsabilidades

Embora seja de propriedade da União, por intermédio do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), a responsabilidade pela área e pelas edificações nela existentes é da Rumo. A empresa sucedeu as antigas Ferrovia Novoeste e Ferrovias Bandeirantes S/A (Ferroban) nas obrigações do contrato de arrendamento 037/96 firmado com a extinta Rede Ferroviária Federal (RFFSA), vigente até julho de 2026.

Por tal instrumento, a Rumo fica obrigada a “manter as condições de segurança operacional e responsabilizar-se pela conservação e manutenção adequadas dos bens objeto do contrato”, bem como de “abster-se de descaracterizar os imóveis arrendados”. Em nota enviada pela assessoria de imprensa, a Rumo informou que parte dos vagões acumulados na área da oficina “não são arrendados à concessionária” e que “todos os cuidados estão sendo tomados para evitar transtornos à população”.

Limpeza

Sobre a limpeza da área, a concessionária limitou-se a informar que “executa os serviços de roçada nas áreas que são de sua responsabilidade de acordo com o cronograma interno”. Os últimos trabalhos em Sorocaba teriam sido realizados em novembro e uma nova programação estaria sendo elaborada, sem estabelecer prazos.

Oficinas da antiga Estrada de Ferro Sorocabana estão deterioradas Oficina de locomotivas e vagões da Fepasa, em Sorocaba. Crédito da foto: Romildo S. Ferreira / Arquivo JCS (22/1/1993)

Polo tecnológico era o maior da América Latina

O fechamento das Oficinas de Vagões de Sorocaba pela empresa Rumo, em janeiro de 2016, pôs fim a uma história de 80 anos de pioneirismo tecnológico que foi praticado naquele local. No passado, o polo também respondeu pela manutenção de locomotivas e carros de passageiros, chegando a ser considerado o maior complexo de manutenção ferroviária da América Latina. Nele, os ferroviários da Estrada de Ferro Sorocabana (EFS) construíram, por exemplo, o primeiro trem de aço carbono em bitola métrica do País a empregar tecnologia 100% nacional, o Bandeirante, inaugurado em 1940.

Na desativação, a Rumo transferiu as operações do local para a unidade de Mafra, em Santa Catarina, como reflexo dos desinvestimentos no corredor de bitola métrica entre Corumbá (MS) e Mairinque, demitindo 96 ferroviários. De origem de uma das mais importantes ferrovias brasileiras, Sorocaba foi relegada a mero ponto de passagem de trens -- que trafegam com frequência cada vez menor.

Reativação do complexo

O engenheiro José Carlos Carneiro, especialista na área ferroviária e presidente da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Sorocaba (AEAS), vê na renovação antecipada da concessão da Rumo Malha Oeste -- caso seja de interesse da empresa -- a única possibilidade da reativação do complexo. “A Rumo não investe na bitola estreita (Malha Oeste) porque o enfoque é na carga de granéis pela Malha Norte de Mato Grosso a Santos”, observa.

O mecanismo da renovação antecipada viabiliza investimentos maiores nos ativos concessionados por parte do operador ao oferecer a ele mais 30 anos de contrato, ao mesmo tempo em que impõe metas de transporte de carga.

Alternativa

Como alternativa ao destino da área, Carneiro defende uma reurbanização por intermédio de Operação Urbana Consorciada. Por esse modelo é possível liberar alguns espaços para construções comerciais, de modo a obter a sustentação econômica do projeto e garantir o movimento de pessoas, ao mesmo tempo que se assegura a preservação das edificações tombadas pelo Conselho Municipal de Defesa do Patrimônio Histórico e Conselho Estadual de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). “Sem esquecer de um museu que fosse capaz de trazer visitantes de todo o mundo”, finaliza. (Eric Mantuan)

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