Meio Ambiente
Tecnologia transforma resíduos de granja em créditos de carbono
Sistema sorocabano monitora a compostagem e comprova a redução de gases do efeito estufa
Nos últimos dias, o tema dos créditos de carbono voltou a ganhar espaço nas discussões ambientais e econômicas. Com a realização da COP30 em Belém (PA), cresceu o interesse em entender como práticas sustentáveis podem gerar benefícios ambientais e financeiros. A conferência, que começou na segunda-feira (10) e segue até 21 de novembro, reúne representantes de mais de 190 países para discutir metas de redução de gases de efeito estufa e economia de baixo carbono. Nesse cenário, iniciativas regionais mostram como ações locais podem gerar resultados mensuráveis.
Em Sorocaba, uma delas é a da Smart Compost, fundada por Thiago Cacuro e Felipe Pedrazzi, que desenvolveu uma tecnologia capaz de transformar o esterco e a cama de aviário de granjas em fonte de créditos de carbono. O sistema mede a diferença entre o gás emitido em aterros e o gerado na compostagem controlada. Criada na região, a tecnologia integra inovação e gestão ambiental, aproximando Sorocaba de um dos temas centrais da COP30: a mensuração transparente das reduções de gases.
O que são os gases de efeito estufa
Os gases de efeito estufa (GEE) retêm calor na atmosfera e intensificam o aquecimento global. Entre os principais estão CO2, metano (CH4) e óxido nitroso (N2O). O metano, liberado pela decomposição de resíduos orgânicos sem oxigênio, tem potencial de aquecimento mais de 25 vezes superior ao do CO2, segundo o IPCC. Em granjas e aterros, o esterco de aves libera esse gás. A compostagem aeróbia, feita com entrada de oxigênio, reduz drasticamente sua formação. “Com a compostagem aeróbia, praticamente não há produção de metano”, explica o doutor em biotecnologia e cofundador da Smart Compost, Thiago Cacuro.
Compostagem, técnica de reciclagem e reaproveitamento
A compostagem transforma resíduos orgânicos em adubo rico em nutrientes. O processo pode incluir poda urbana, resíduos agroindustriais e, quando autorizado, lodos de estações de tratamento de esgoto. Além de reduzir o envio de resíduos aos aterros, reintegra a matéria orgânica ao ciclo produtivo, num exemplo de economia circular. Apesar do grande potencial da região, ainda há poucos pátios estruturados. “Hoje, há apenas uma usina de grande porte em Pereiras, o que indica uma oportunidade de expansão”, afirma Cacuro.
Como o crédito de carbono é gerado
O crédito de carbono certifica a redução comprovada de emissões — cada unidade equivale a uma tonelada de CO2 que deixou de ser lançada na atmosfera. O sistema da Smart Compost compara dois cenários: o de referência, em que o resíduo iria para o aterro e emitiria metano; e o de projeto, com tratamento por compostagem aeróbia. A diferença entre as emissões é convertida em CO2 equivalente. “Nosso sistema calcula essa diferença em tempo real, permitindo rastreamento e auditoria”, explica Cacuro. Esses créditos podem ser vendidos, geralmente a empresas que precisam compensar emissões.
A tecnologia desenvolvida em Sorocaba
A Smart Compost implantou sensores que monitoram temperatura, umidade, oxigênio e emissão de gases, enviando tudo para uma plataforma digital. “O acompanhamento constante garante parâmetros ideais e comprova a redução das emissões”, diz Cacuro. A tecnologia, inédita no Brasil, está entre as mais avançadas do mundo no setor e foi premiada duas vezes pelo United States Composting Council (USCC), em 2020 e 2024.
Certificação e verificação
A validação dos créditos passa por etapas que garantem transparência. O projeto é registrado por um instituto especializado, monitorado continuamente e auditado por certificadora independente. “Registramos cada etapa, o que assegura aceitação no mercado”, explica Cacuro. Só depois disso o crédito é emitido e pode ser negociado.
Impacto social e econômico para Sorocaba
A Região Metropolitana de Sorocaba, com mais de 2 milhões de habitantes, concentra atividades agroindustriais e de gestão de resíduos. Com o sistema, a expectativa é ampliar a criação de pátios de compostagem, beneficiando prefeituras, cooperativas e pequenas empresas. Parte dos recursos obtidos pode ser reinvestida em capacitação e programas ambientais. O composto produzido retorna ao solo como adubo. “O ciclo se fecha: o resíduo que sairia da cidade volta ao campo como fertilizante”, resume o cofundador.
A conexão com a COP30
Segundo Cacuro, a tecnologia dialoga diretamente com a COP30. “A conferência discute formas confiáveis de mensurar reduções. A nossa tecnologia oferece exatamente isso.” Ele lembra que o Brasil está estruturando um mercado regulado de carbono. “Quem tiver dados técnicos e comprovação de emissões reduzidas poderá acessar novas oportunidades da economia verde”, finaliza. (Valéria Amoris)
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