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Em Sorocaba

Criança de 6 anos resgatada de cárcere dá primeiros passos de socialização

Após um mês em abrigo, menina que viveu isolada pelos pais começa a interagir com outras crianças

26 de Setembro de 2025 às 15:11
Beatriz Falcão [email protected]
Neste período, a profissional enxerga uma melhora significativa, além do esperado
Neste período, a profissional enxerga uma melhora significativa, além do esperado (Crédito: João Frizo)

Na próxima segunda-feira (29), completa um mês que o Conselho Tutelar de Sorocaba resgatou a menina de 6 anos, que era mantida em cárcere privado pelos próprios pais em uma casa no Jardim Santa Esmeralda. Durante esse tempo, ela viveu isolada do mundo, sem contato com outras crianças, com a escola e sem receber acompanhamento médico regular. Agora, a criança tenta recuperar esse tempo perdido em um abrigo, onde recebe toda assistência médica e emocional.

De acordo com a conselheira tutelar Ligia Guerra, responsável por acompanhar o caso, a menina está passando por terapia ocupacional, fisioterapia, acompanhamento psicológico, odontológico e fonoaudiológico. É um tratamento em várias frentes, que iniciou há três semanas. Neste período, a profissional enxerga uma melhora significativa, além do esperado.

“Nós temos que considerar as condições que essa criança vivia. Ela se alimentava somente por seringa, nunca havia se alimentado com comida sólida, fazia suas necessidades fisiológicas em pé. Coisas básicas, como beber água em um copo, ela nunca tinha feito”, destaca a conselheira municipal. “Agora, ela está aceitando comida pastosa, aprendeu a comer com colher, a beber no copo, a usar o banheiro”.

O ponto mais importante e de maior destaque é a socialização com outras crianças. No abrigo, além dos hábitos comuns do dia a dia, a menina está tendo contato com outras pessoas pela primeira vez. No começo, choros e gritos eram frequentes. Agora, ela está brincando com os outros acolhidos e, inclusive, demonstrando afeto, pedindo beijos e abraços.

“Ela está reagindo aos estímulos e, o primeiro passo do tratamento, é basicamente isso. Essa menina está conhecendo o mundo agora”, explica Ligia. “Portanto, as coisas que ela não sabe, foi por falta de estímulo. Por exemplo, a própria fala, que não foi desenvolvida. Ela se comunica, mas balbuciando sons. Agora, iremos trabalhar junto com um fonoaudiólogo para que ela possa aprender”.

A conselheira municipal explica que, embora a criança tenha 6 anos, ela perdeu toda a fase da primeira infância – que se estende do nascimento até os 6 anos de idade. Durante o período em que foi mantida em cárcere, ela se alimentava somente por seringa, fazia suas necessidades fisiológicas em pé e nunca havia lavado o cabelo. Todas essas condições geraram um comprometimento no seu modo de ser e agir.

“Ainda está muito cedo para afirmar as condições mentais. Nós precisamos que ela responda primeiro aos estímulos para chegar em um diagnóstico completo”, afirma Ligia. “Algumas coisas são visíveis, como a arcada dentária e o afundamento na região do tórax, que foram causados pela falta da mastigação e da deglutição”.

Os próximos passos do tratamento é continuar com os estímulos e com o processo de socialização, além das medicações. Após o diagnóstico, a atenção será especializada para as necessidades da menina.

E os pais?

Os pais da menina, responsáveis por mantê-la reclusa do mundo, foram presos no dia 4 de setembro. A princípio, eles respondem pelo crime de cárcere privado, com agravante de maus-tratos contra a criança. Após a audiência de custódia, a delegada-titular da Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), Renata Zanin, solicitou a prisão temporária pelo prazo de 30 dias.

Ao Cruzeiro do Sul, na manhã desta sexta-feira (26), a delegada informou que estendeu o período da prisão temporária por mais 30 dias. Segundo ela, o objetivo dessa prorrogação é para fechar as investigações com mais informações.

Maus-Tratos Infantis em Sorocaba

Embora o caso da menina de 6 anos tenha repercutido e chocado grande parcela da população de Sorocaba, episódios de maus tratos à crianças e adolescentes, infelizmente, são comuns. Segundo Ligia Guerra, o Conselho Tutelar recebe diariamente denúncias de violência sexual e doméstica.

“Às vezes, é tanta crueldade, que a gente imagina que não existem mais esses tipos de situações, mas ainda existem, e não são poucas. Por exemplo, nós recebemos denúncias de crianças que são castigadas com mangueira, com Espada de São Jorge”, relata a conselheira tutelar. “Desde a pandemia da Covid-19, os casos aumentaram bastante”.

A população também pode contribuir com o trabalho do Conselho Tutelar por meio de denúncias. Para acionar o órgão, de forma anônima, basta usar o disque 100. A única informação necessária é o endereço completo de onde o crime está acontecendo.