Violência
Abrigos devem proteger mulheres
De janeiro a maio deste ano, entidades de Sorocaba atenderam 2.661 mulheres vítimas de agressões
Quando uma mulher vive em situação de violência, a primeira orientação costuma ser: denuncie! O passo inicial geralmente envolve procurar uma delegacia - preferencialmente especializada, como a Delegacia de Defesa da Mulher (DDM). Mas o que acontece depois? É justamente nesse momento que os abrigos e centros de acolhimento se tornam fundamentais para garantir proteção, apoio e a possibilidade de um recomeço seguro. Em Sorocaba são dois.
De janeiro a maio de 2025, somente na cidade, foram acolhidas 146 pessoas, incluindo mulheres e seus filhos, no Centro de Integração da Mulher (CIM). No mesmo período, o Centro de Referência da Mulher (Cerem) realizou 2.515 atendimentos.
Conforme a Secretaria da Cidadania (Secid), o Cerem oferta atendimento para o fortalecimento da mulher vítima de violência doméstica, realizando orientação, com base na Lei Maria da Penha, assim como encaminhamentos aos serviços pertinentes, frente às demandas apresentadas. É também no Cerem que ocorre a instalação do aplicativo “Protege Mulher” para denúncia de casos de violação de medida protetiva.
A Casa Abrigo Valquíria Rocha, o Cim Mulher, por sua vez, oferece abrigo à mulher vítima de violência doméstica e seus filhos. O serviço funciona em termo de colaboração com a prefeitura. Segundo a Secid, são 20 vagas diárias, que custam ao município cerca de R$ 37 mil mensais. O tempo que cada mulher pode ficar no local depende da necessidade de cada caso.
Os dois locais podem ser contatados pelos números (15) 3238-6770 - Cerem - e (15) 99163-6238 - CIM.
O Cruzeiro do Sul entrou em contato com as prefeituras de Votorantim e Araçoiaba da Serra para saber como é feito o atendimento às mulheres vítimas de violência nas respectivas cidades, mas até o fechamento desta edição não obteve retorno.
Não é sempre assim
Na teoria pode parecer perfeito, mas uma mulher de 31 anos, acompanhada de sua filha, procurou ajuda após entender que estava sendo vítima de violência por parte de seu ex-companheiro. Em entrevista à reportagem, ela contou que fez a denúncia e como estava com receio de retornar para a mesma casa, pediu abrigo. Ainda segundo o relato da mulher, não havia vagas disponíveis nos abrigos da cidade. O Conselho Tutelar também foi acionado na tentativa de conseguir acolhimento, mas sem sucesso. Diante da situação, tanto mãe como filha dormiram na Prefeitura de Sorocaba. O caso ocorreu na segunda quinzena de junho. Após o pernoite, a mulher foi até a casa de uma amiga, onde ficou por alguns dias.
Na ocasião, desabafou: “Eu tô chocada com tudo que aconteceu, porque eu esperava que fosse ter o apoio de outras pessoas. Como eu dependia dele, agora não sei o que fazer. O suporte que eu precisava ter, não estou tendo”. Ainda de acordo com a entrevistada, “por isso mulheres passam tanto tempo sendo agredidas, porque, no fundo, elas sabem que se não se virarem, ninguém vai ajudar em nada”, acrescentou.
De acordo com a mulher de 31 anos, funcionários do Cerem marcaram para o dia 21 deste mês o seu atendimento para verificar o caso.
Prefeitura
Diante do relato, o Cruzeiro do Sul questionou a prefeitura sobre a situação. Em relação à dificuldade em conseguir atendimento, a Secid informou, por meio de nota, que foi feita uma fiscalização no CIM Mulher, constatando que haveria vaga para a mulher e que, diante da recusa, advertiu o abrigo pelo não atendimento.
Referente à demora no atendimento por parte do Cerem, a prefeitura informou que não procede a informação e que, “a munícipe já está sendo atendida, desde que o caso chegou ao conhecimento da prefeitura, e tudo que é possível oferecer, dentro do que permite a legislação a respeito, está sendo oferecido”. Com a resposta, a reportagem voltou a perguntar para a mulher sobre o atendimento, e esta explicou que foi até o Cerem, mas o único serviço feito foi a instalação do aplicativo Protege Mulher e que o agendamento para o final do mês permanece.
Na última semana, a mulher informou ao Cruzeiro do Sul que a Justiça concedeu a medida protetiva e o homem teria saído da residência, assim como recebido a ordem de não poder se aproximar dela.
Como identificar
Muitas mulheres identificam que estão em situação de violência quando um tapa acontece. Mas, na maioria das vezes, ela já está vivenciando outros tipos de agressão. Segundo a Lei Maria da Penha — sancionada em 2006, e que traz proteção às mulheres —, são cinco tipos principais de agressão: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.
Em meio ao conhecimento dos tipos de violência, o Instituto Maria da Penha também esclarece sobre o ciclo da violência. É comum o agressor mudar o comportamento, o que pode fazer com que algumas mulheres desistam da esperança de que haja melhora. Tal situação pode ser dividida em três fases:
Na primeira, há o aumento da tensão. O agressor mostra-se tenso e irritado por coisas insignificantes, chegando a ter episódios de raiva. Ele também humilha a vítima, faz ameaças e destrói objetos. A mulher tenta acalmar o agressor, fica aflita e evita qualquer conduta que possa provocá-lo. As sensações são muitas: tristeza, angústia, ansiedade, medo e desilusão são apenas algumas. Essa etapa também é marcada pela negação da mulher, que também acaba por achar que coisas externas estão influenciando tal comportamento, que pode durar meses e até anos.
Violência
A próxima é caracterizada pelos atos de violência. Isso por que toda a tensão acumulada na fase 1 se materializa em violência verbal, física, psicológica, moral ou patrimonial. Nesse momento, ela também pode tomar decisões, sendo as mais comuns o pedido de ajuda, denúncia, esconder-se na casa de amigos e parentes, pedir a separação e até mesmo suicidar-se.
Na terceira fase ocorre a conhecida “lua de mel”. Esta fase, de acordo com o Instituto Maria da Penha, se caracteriza pelo arrependimento do agressor, que se torna amável para conseguir a reconciliação. A mulher se sente confusa e pressionada a manter o seu relacionamento diante da sociedade, sobretudo quando o casal tem filhos.
Em outras palavras: ela abre mão de seus direitos e recursos, enquanto ele diz que “vai mudar”. Um misto de medo, confusão, culpa e ilusão fazem parte dos sentimentos da mulher. Por fim, a tensão volta e, com ela, as agressões da primeira fase, criando assim o ciclo da violência.