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Sorocaba

Acessibilidade ainda é ‘luxo’ nas escolas

Em Sorocaba, apenas um terço das unidades da rede estadual estão preparadas para cadeirantes

20 de Abril de 2023 às 23:01
Ana Claudia Martins [email protected]
Escadas continuam sendo o grande empecilho às pessoas com deficiência
Escadas continuam sendo o grande empecilho às pessoas com deficiência (Crédito: CEZAR RIBEIRO)

Apesar de a acessibilidade nos edifícios públicos ou de uso coletivo estar prevista em lei e o Brasil ter, desde 2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, das atuais 84 escolas estaduais de Sorocaba, somente 28 são consideradas acessíveis para alunos cadeirantes -- 33,33% do total. Os números são da própria Secretaria da Educação do Estado de São Paulo.

Segundo a pasta, atualmente a cidade conta com mais de 20 alunos cadeirantes matriculados na rede estadual e todos estudam em unidades com acessibilidade nos prédios. Questionada, a pasta afirma que tem concentrado esforços nas constantes adequações dos prédios escolares, “de forma que todos os estudantes desfrutem de uma educação igualitária e inclusiva”.

Uma das principais razões de a maior parte das escolas não ter acessibilidade total é que, praticamente, todos os prédios são antigos. Quando essas unidades escolares foram construídas, não existiam leis como as da atualidade. E isso é algo que ocorre em muitas cidades brasileiras.

Assim, na rede estadual de Sorocaba somente prédios escolares mais recentes ou que passaram por adaptações e reformas conseguem oferecer acessibilidade para estudantes cadeirantes. No entanto, a secretaria não informou quais são as 28 escolas estaduais da cidade que contam com esse recurso.

A reportagem constatou que boa parte das entradas principais das unidades escolares tem escadas, bem como pavimentos e lances de escadas no interior, o que impede a livre locomoção de cadeirantes. Em alguns casos, o problema ocorre já antes mesmo de entrar na escola, visto a falta de calçadas rebaixadas.

Questionada a respeito, a Secretaria da Educação do Estado informou que a previsão é que outras três unidades escolares estaduais sejam adaptadas para cadeirantes em Sorocaba ainda para 2023. Mas não disse os nomes das escolas.

Segundo a pasta, “nas escolas acessíveis os prédios contam com vagas de estacionamento reservadas e próximas às entradas, sinalizadas e com dimensões adequadas; calçadas rebaixadas e guias de balizamento para facilitar a travessia de ruas e acessos aos prédios; portas e corredores largos o suficiente para permitir a passagem de cadeiras de rodas; elevadores e/ou plataformas elevatórias com dimensões adequadas e comandos em altura acessível, além de sinalização em braile e sonora; banheiros adaptados, com barras de apoio, altura adequada de pias e espelhos e espaço suficiente para manobra de cadeira de rodas e pisos táteis direcionais e de alerta para orientação de pessoas com deficiência visual”.

Outros recursos enumerados pela secretaria são “mobiliário adaptado, como carteiras e cadeiras em salas de aula, laboratórios e outros ambientes da escola; e sinalização visual e tátil que facilite a orientação e identificação de ambientes e serviços”.

Mas, na prática, a realidade é diferente. A Escola Estadual Professor Aggeo Pereira do Amaral, no bairro Jardim Cruzeiro do Sul, atualmente tem dois estudantes cadeirantes matriculados. A escola passou por adaptações para poder atendê-los, mas o prédio ainda não é considerado ideal do ponto de vista da acessibilidade. Não tem, por exemplo, elevadores ou plataformas elevatórias. Os dois estudantes cadeirantes ficam praticamente todo o período escolar somente na parte térrea do prédio, onde foi possível adaptar os espaços para proporcionar a eles mais acessibilidade.

Esforço da comunidade

Gabriel Marques Santos e Kethllin dos Santos Correa, ambos de 16 anos, frequentam o segundo ano do ensino médio na unidade escolar. A diretora Regina Viana conta que Gabriel estuda na escola desde a sexta série do ensino fundamental e, quando chegou, os próprios estudantes o carregavam com a cadeira de rodas até a sala de aula.

“Tivemos de adaptar os espaços na parte térrea da escola e quando teve uma reforma, foi feito um banheiro totalmente adaptado. Hoje temos sala de recursos e uma sala de aula, além do refeitório e uma quadra, todos na parte térrea, para que o Gabriel e a Kethllin possam frequentar as aulas com um pouco mais de acessibilidade”, afirma.

“O prédio ainda não é o ideal do ponto de vista da acessibilidade até porque é antigo, de 1968, e a maioria dos prédios escolares não foi projetada para cadeirantes. Naquela época praticamente não se falava em acessibilidade e os alunos eram praticamente segregados”, afirma Regina. Outra iniciativa da escola foi trazer para o pátio, na parte térrea do prédio, uma espécie de biblioteca ao ar livre.

Além disso, a direção da escola conseguiu com a Diretoria de Ensino de Sorocaba professores auxiliares, chamados de cuidadores, para atender os dois alunos. “O Gabriel e a Kethllin, apesar das limitações, estão bastante integrados com a comunidade escolar. Eles foram bastante acolhidos pelos demais estudantes e com os cuidadores eles conseguem ter uma rotina quase normal e frequentam a escola diariamente. O Gabriel usa o transporte especial e, a Kethllin, os pais a trazem para a escola. A gente vê o sorriso deles em poder estudar e frequentar a escola e ficamos felizes, valeu a pena todo o esforço. Outro dia, falei para o Gabriel: ‘Ano que vem será o seu último ano aqui na escola’. E ele respondeu: ‘Vou seguir meu rumo’. Fiquei emocionada, pois ele é um guerreiro”, conta.

Abaixo-assinado

No início do mês, o Cruzeiro do Sul mostrou a iniciativa da comunidade escolar da Escola Técnica Estadual (Etec) Fernando Prestes, também de Sorocaba, que criou um abaixo-assinado na internet pedindo mais acessibilidade para o seu prédio. A petição on-line é em prol da estudante Maria Clara Hailer de Moraes, de 15 anos, matriculada no curso de administração integrado ao ensino médio, que é cadeirante, e já conta com mais de 26 mil assinaturas.

Por conta da cadeira de rodas, Maria Clara fica limitada a somente alguns espaços do prédio, por conta dos pavimentos e das escadas. Questionado a respeito, o Centro Paula Souza, órgão estadual responsável pelas Etecs, informou que o prédio em questão tem condições de acessibilidade parcial, o que permite que Maria Clara frequente as aulas sem comprometimento do aprendizado.

“As atividades acadêmicas da estudante estão concentradas no mesmo piso, onde também é distribuída a merenda, sem a necessidade de deslocamento entre os andares. Apenas as disciplinas de física, matemática e inglês são ministradas em um andar intermediário, cujo acesso externo se dá sem a necessidade de escadas”, ressalta.

O abaixo-assinado pode ser assinado no endereço eletrônico: https://bit.ly/3Lgdrtp.