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Sorocaba

Enxurrada de benefícios tramita na Câmara Municipal

Em apenas dois anos, vereadores apresentaram 15 projetos que reduzem ou isentam tributos municipais

12 de Novembro de 2022 às 00:01
Wilma Antunes [email protected]
Descontos no IPTU de quem doa sangue ou materiais recicláveis são as duas únicas iniciativas que entram em vigor
Descontos no IPTU de quem doa sangue ou materiais recicláveis são as duas únicas iniciativas que entram em vigor (Crédito: VINÍCIUS FONSECA (28/5/2020))

Entre uma pauta legislativa e outra, o que tem chamado atenção nas sessões ordinárias da Câmara de Sorocaba é a quantidade de projetos semelhantes. A isenção ou redução de impostos estão se tornando cada vez mais comuns nas reivindicações dos vereadores. Em alguns casos, as solicitações são, de fato, legítimas. Em outros, provocam dúvidas e põem sua juricidade em cheque. Ao menos 15 projetos de leis com o mesmo teor foram apresentados durante a atual legislatura. Deste número, apenas dois foram publicados no Diário Oficial do Município e tornaram-se leis. As demais iniciativas ainda seguem em tramitação. A exceção se dá apenas em um caso, que foi arquivado pelos vereadores,

Dos 20 parlamentares da Câmara, oito apresentaram proposituras que carregam a mesma essência. Ítalo Moreira (PSC) é primeiro da lista, com cinco projetos de lei. Rodrigo do Treviso (União) criou três e Aith (PRTB) elaborou dois documentos. Já Francisco França (PT), Dylan Dantas (PSC), Fábio Simoa, Luís Santos e Cristiano Passos -- os três últimos do Republicanos -- têm um projeto cada. As duas propostas que partiram do Poder Executivo e agora compõem a legislação municipal são de autoria de Treviso. Elas estabelecem desconto no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para doadores de sangue e para quem troca materiais recicláveis por créditos tarifários, cujos valores são definidos pelo Poder Executivo, por meio de uma tabela. As duas normas foram sancionadas neste ano.

O Cruzeiro do Sul fez um levantamento sobre as matérias legislativas que tratam sobre descontos nos impostos municipais, com base nas informações disponibilizadas pelo site da Câmara de Sorocaba. Confira abaixo os projetos apresentados pelos parlamentares, desde 2021, em ordem cronológica, e a localização de cada um.

2021

Em janeiro de 2021, a pandemia de Covid-19 enfrentava um de seus períodos mais críticos. Não só Sorocaba, mas todo o País estudava criar novas políticas a fim de diminuir os impactos negativo da crise sanitária. No dia 27 de janeiro, Dantas protocolou um projeto de lei que isentava de tributos os bares, os restaurantes e os comércios semelhantes. Desta forma, ficariam livres do pagamento de Imposto Sobre Serviço (ISS), Imposto sobre Transmissão de Bens (ITBI), IPTU, contribuições de melhoria, taxas de alvará e taxas de coleta de lixo. Apesar de já ter passado por todas as comissões permanentes da Casa e constar como “pronto para ordem do dia”, a proposta nunca chegou a ser debatida em plenário.

No dia 28 de janeiro, foi a vez de Aith solicitar um programa de apoio aos bares e restaurantes da cidade. Entre as diretrizes contidas no documento, está a isenção, por período proporcional ao fechamento dos estabelecimentos, do IPTU e do ISS. Até ontem (8), a iniciativa aguardava parecer das comissões.

Um mês depois, em 2 de março, Aith protocolou o projeto que institui o programa IPTU Azul para estimular o uso racional da água. De acordo com a propositura, ficaria concedido 10% de desconto no valor total do IPTU para quem possuir sistema de captação de água da chuva. O projeto está pronto para ser incluído na pauta do dia.

Em 8 de março, Moreira pediu a obrigatoriedade de isenção de IPTU, taxas de água, esgoto e lixo dos comércios classificados como “não essenciais”, em casos de calamidade pública devidamente regulamentada pelo Poder Executivo. Apesar de a proposta não fazer mais sentido, consta como preparada para ser discutida em sessão.

Poucos dias depois, em 16 de março, Moreira protocolou um projeto parecido com o anterior, em que pede a isenção de Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) e da taxa de fiscalização de instalação e funcionamento dos comércios também classificados como “não essenciais”. A iniciativa também está pronta para ser incluída na ordem do dia.

O projeto que obrigava a isenção de IPTU para igrejas ou templos de qualquer culto que funcionem em imóveis cedidos ou alugados foi protocolado no dia 16 de abril, por Passos. A propositura até chegou a ser debatida e foi aprovada em primeira discussão, mas foi arquivada pouco tempo depois. Em 10 de maio, Treviso pediu desconto de 30% no valor da tarifa mínima mensal do serviço de água e esgoto, proporcionalmente aos dias que a água chegar suja ou imprópria na casa do consumidor. A proposta ainda está sendo avaliada pelas comissões da Casa.

Moreira protocolou mais um projeto, no dia 21 de junho, a fim de garantir desconto de 5% no IPTU para os proprietários de imóveis que adotarem cão ou gato, castrado e vacinado, que se encontrar sob a guarda do órgão sanitário responsável pelo controle de Zoonoses ou de entidades protetoras de animais cadastradas no município. A iniciativa passou pelas comissões permanentes e já pode ser discutida em plenário.

No dia 5 de agosto, Luís Santos apresentou uma matéria que cria um programa de fomento e incentivos fiscais aos prestadores de serviços turísticos de Sorocaba. Entre as diversas diretrizes estabelecidas, está a isenção da taxa de fiscalização de instalação, do ITBI, do ISS, do IPTU, das taxas de construção civil e redução de 2% no ISSQN. O projeto está pronto para ser incluído na pauta legislativa.

O último projeto protocolado em 2021 é de Moreira e elabora um programa IPTU Verde, que reduz em até 15% o imposto aos proprietários de imóveis que adotem medidas que estimulem a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente. A iniciativa também está pronta para ser colocada em votação.

2022

Moreira também abriu 2022, no dia 3 de janeiro, com o projeto de lei que autoriza a concessão de incentivo fiscais às empresas de economias criativas, como startups. O documento prevê isenção do IPTU para cada inscrição imobiliária, até o limite de área construída de 180 m², e isenção de 50% no ISSQN nos três primeiros anos. Aprovada pelas comissões, a matéria já pode ser discutida em plenário.

Em 17 de maio, Francisco França protocolou o projeto que dá desconto de 20% no IPTU para imóveis que tenham contêiner de lixo em frente à sua fachada. A proposta também foi considerada adequada para ser votada.

Por fim, Simoa apresentou, no dia 19 de setembro, o projeto que cria políticas públicas de subsídios tarifários e não tarifários em benefício dos abrigos de proteção animal da cidade. Assim, esses abrigos teriam direito a tarifa social nos serviços de água e esgoto e desconto no IPTU. É necessário manifestação do Poder Executivo para que a matéria seja incluída na ordem do dia.

Vale o interesse público, diz tributarista

Todo incentivo é um benefício, mas nem todo benefício é um incentivo. É o que afirma Fabiana Moreira, advogada especialista em sistema tributário, ao explicar como funciona a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Ao Cruzeiro do Sul, a tributarista declarou que, para um incentivo se enquadrar na legislação, ele precisa ser considerado “interesse público”. Além disso, também é importante que a renúncia da receita acompanhe os valores previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Caso contrário, a atividade pode gerar improbidade administrativa ao município.

Para melhor compreensão, receita nada mais é que o total de valores que ingressam de forma definitiva no tesouro público. Já a renúncia da receita é o ato em que a administração pública concede incentivos ou benefícios como isenção, anistia, remissão e outras concessões permitidas legislativamente que promovem a redução do montante devido pelo contribuinte. Outra forma de definir o que é renúncia é descrevê-la como o consentimento para deixar de receber valores que poderiam ser utilizados para atender a direitos e políticas públicas. Ela salientou que a renúncia só é permitida depois de analisado seu efeito. Por isso, faz-se necessário estimar o impacto orçamentário-financeiro, como previsto na LRF. (Wilma Antunes)