Comportamental
Após casos de depressão, escola usa primavera e psicologia para ajudar estudantes
Houve até mesmo casos de automutilação entre os alunos. A diretoria de uma escola enxergou, na primavera, uma forma de trazer mais cor para a vida dos estudantes
Perder alguém que se ama é uma situação difícil e dolorosa para a maioria das pessoas. A angústia perdura por tempo indeterminado. Pode durar dias, meses, anos. As lágrimas escorrem e a saúde mental pode até ficar abalada. Milhares de crianças tiveram de passar por esse processo espinhoso antecipado ao perderem familiares para a Covid-19. Nesse turbilhão de emoções, o desenvolvimento no ambiente escolar também pode ter sido comprometido.
Em Sorocaba, colaboradores de uma escola estadual notaram que alguns alunos andavam deprimidos nas salas de aula. Eles não interagiam como antes e o brilho no olhar já não era mais o mesmo. A tristeza chegou de forma tão avassaladora que teve até casos de automutilação entre os estudantes. O episódio preocupou a diretoria da instituição de ensino, que decidiu realizar ações de conscientização e prevenção ao suicídio.
A florada do pau-brasil plantado na escola despertou novas ideias aos coordenadores. Os laços entre o mês de setembro e a primavera nunca pareceram tão fortes. Quatro mudas de ipês marcaram o início de uma batalha contra a depressão. Para os colaboradores, o plantio das mudas teve um significado profundo: a benção de estar vivo e a gratidão. A iniciativa fez com que a vida dos alunos ganhasse mais cor, especificamente tons de amarelo, roxo e branco, que em breve embelezarão a unidade escolar em lindas flores.
Uma psicóloga também foi convidada para acompanhar e ouvir os alunos, que desabafaram sobre suas aflições. Em uma roda de conversa grande o bastante para acomodar estudantes e professores, a valorização da vida foi o principal assunto. “Temos muito alunos que passam por quadros depressivos e que são, inclusive, medicados. Diante deste cenário obscuro, enxergamos uma oportunidade de trabalhar a autoestima das nossas crianças”, destaca a diretoria da instituição.
Tempos difíceis fazem pessoas fortes
O luto é um estado emocional específico vivenciado de diferentes formas. Ele não está necessariamente relacionado à morte, mas sim a uma perda muito significativa. Com o endurecimento das medidas restritivas por conta dos casos de coronavírus, parte da sociabilidade das crianças foi arrancada. Carla Denari Ayres é psicóloga e trabalha com foco em crianças há mais de 25 anos. Ela notou que o número de pais que buscam terapia para os filhos aumentou.
“Nós somos feitos para conviver em grupo. Esse rompimento abrupto da interação social assustou as pessoas e causou muita angústia. Com as pessoas em casa, notou-se novos problemas. Muitos pais se separaram, membros de famílias faleceram por conta da Covid. Esse conjunto de reações, ainda cedo, é prejudicial ”, conta.
Carla explica que todo ser humano passa por um luto natural. Por volta dos oito anos, a infância começa a se despedir para dar lugar a uma nova fase, a pré-adolescência. Já é uma etapa extremamente confusa, na qual um redemoinho de emoções desestabiliza emocionalmente a criança. Quando uma perda significativa acontece ainda nesse período, ela passa por dois lutos ao mesmo tempo.
“Normalmente, as crianças entendem o que é a morte pela ordem natural da vida. Perdem primeiro os avós ou pessoas mais velhas e vão assimilando. Com a antecipação do luto, essas crianças acabam não sabendo lidar com a situação e desenvolvem transtornos mentais”, destaca.
A psicóloga comenta que, apesar de muitos obstáculos, as pessoas tiveram a oportunidade de repensar suas vidas durante o período de recolhimento social. Ela notou que as pessoas estão mais preocupadas com a qualidade de vida e resolução de conflitos. “Precisamos amar ao próximo, ser mais solidários. De alguma forma, saímos mais maduros dessa situação. Tivemos oportunidade de olhar para as nossas famílias, nossos problemas e ter atitude para enfrentá-los”, finaliza.