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Saúde

Secretários de Saúde se autofiscalizam

19 de Junho de 2021 às 00:01
Marcel Scinocca [email protected]
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Em pelo menos dois municípios da Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) os secretários de Saúde de autofiscalizam. Na medida em que ocupam o cargo de secretário municipal de Saúde também são presidentes dos respectivos conselho municipais que é deliberativo e, por lei, fiscaliza as ações da Secretaria de Saúde. A situação ocorre em Itu e em Sorocaba. Esse acúmulo contraria norma de 2017 do Conselho Nacional de Saúde. A Prefeitura de Sorocaba diz que a situação está estabelecida por lei e o Executivo de Itu não comentou a situação.

Em Sorocaba, o Conselho Municipal de Saúde tem como presidente o médico Vinícius Rodrigues, que também é o secretário de Saúde da cidade. Em Itu, Janaina Guerino de Camargo, secretária de Saúde, também tinha ligações com o Conselho de Saúde da cidade, ao menos até o mês passado. A reportagem teve acesso a uma ata do CMS de Itu, de 31 de maio, Na reunião, a secretária afirma que não pretendia mais ser presidente da entidade. Uma nova escolha deve ocorrer até julho e não fica claro se a saída dela é de imediato ou somente quando ocorrer a escolha de novos membros.

Entretanto, a sexta diretriz, da Resolução 554, de 15 de setembro de 2017, do Conselho Nacional de Saúde (CNS) é clara: “A autoridade máxima da direção do SUS em sua esfera de competência não deve e nem pode acumular o exercício de presidente do Conselho de Saúde, a fim de privilegiar o princípio da segregação das funções de execução e fiscalização da administração pública”, determina o documento.

Em Sorocaba, aparentemente, nunca houve interesse em mudar o contracenso e a autofiscalização, que é recorrente dentro das governos municipais. Os conflitos também são recorrentes, tanto que em algumas oportunidades, já houve abandono da sessão por parte do presidente. Esse acúmulo, conforme relatado à reportagem, é uma situação de desconforto entre parte dos conselheiros das duas cidades. Em Sorocaba, já houve até pedido para que a situação fosse revista, mas sem sucesso. Vale lembrar que entre as atribuições do presidente está a organização da pauta da instituição. Já o Conselho analisa as contas do secretário, podendo aprová-la ou rejeitá-la.

A Prefeitura de Sorocaba e o secretário foram questionados se acham compatível as duas ocupações de forma simultânea. Em resposta, o Executivo informou que a presidência do Conselho Municipal de Saúde (CMS) decorre de previsão em lei. “No caso de Sorocaba, trata-se da Lei Municipal 3.623/1991, em seu art. 4º, não sendo um ato discricionário da Administração Municipal, mas, sim, o cumprimento da referida lei. Após o mandato do atual presidente, inicia-se o mandato de presidência de um representante de outro segmento, que faz parte do CMS. Sendo assim, por lei, durante um ano, o secretário de Saúde deverá ser o presidente do CMS”, diz.

Ainda conforme o Executivo, a situação não atrapalha o processo de fiscalização que cabe ao Conselho. “De forma alguma, visto que o CMS é composto em paridade, com membros do Poder Público, de entes privados e de representações da sociedade, sendo suas deliberações decididas por maioria de votos”, garante.

Mas não isso que pensa o Conselho Nacional de Saúde. “Para a democracia participativa se efetivar, é necessário que os conselhos tenham um olhar crítico e com autonomia. O controle social municipal e estadual precisa ter, em sua presidência, representantes dos segmentos de usuários ou de profissionais em saúde. É uma normativa. É um ato do Conselho Nacional de Saúde que precisa refletir nos demais conselhos para garantir o legítimo controle social. Essa resolução foi homologada pelo ministro da Saúde à época”, afirma Fernando Pigatto, presidente do CNS. “Os conselhos que não seguem essa norma ficam fragilizados. Se a lei diz que o conselho deve fiscalizar a gestão, como o secretário de Saúde - sendo presidente - vai ser fiscal de si mesmo? É preciso transparência e independência dos órgãos participativos para fortalecermos o SUS”, ressalta Pigatto.

O Observatório Social do Brasil (OSB), em Sorocaba, também não concorda com a situação. A entidade vê com preocupação a forma de atuação de conselhos municipais, em todo o Brasil. “Conselheiros municipais têm enorme responsabilidade naquilo que deliberam. Não devem ser simples homologadores das decisões do Poder Executivo. A contrário sensu não se admite que autoridade gestora ocupe cargo nos conselhos, justamente porque estes fazem parte do controle social das ações do Executivo, representando os interesses da comunidade”, afirma João Francisco dos Santos, presidente do Conselho de Administração OSB-Sorocaba, sobre o dupla função. (Marcel Scinocca)