Homeschooling
Enquanto aguarda chamado da USP, Elisa analisa convites internacionais
Adolescente obteve liminar que lhe dá direito a vaga na universidade
A estudante sorocabana Elisa de Oliveira Flemer, de 17 anos, falou ontem (11) ao Cruzeiro do Sul sobre a liminar da Justiça que permite que ela possa se matricular no curso de engenharia civil da Universidade de São Paulo (USP). A adolescente foi aprovada em quinto lugar, mas estava proibida por outra decisão judicial de cursar a faculdade por ter feito homeschooling, modalidade de ensino ainda não regulamentada no Brasil.
O pedido de liminar para que ela consiga fazer a matrícula foi protocolado no dia 28 de abril. Segundo a família da estudante, o juiz Randolfo Ferraz de Campos determinou que a matrícula seja garantida até que a adolescente apresente o diploma. No entanto, a decisão cabe recurso. A universidade ainda não se manifestou se vai ou não acatar a liminar.
Elisa contou que está muito feliz com a decisão, mas que, por ser possível o uso de recurso, ainda não vai comemorar. “Estamos aguardando para ver se a USP vai recorrer. Eu já mandei e-mail para USP pedindo para fazer a matrícula e, ao mesmo tempo, eu estou vendo outras coisas que eu posso fazer para garantir que vai dar tudo certo no final”, relatou.
Apesar de ser uma grande conquista, a adolescente explicou que a USP não é mais a sua grande prioridade. Após seu caso repercutir internacionalmente, Elisa recebeu propostas de emprego e bolsas de estudo no exterior. “Eu estou na lista de espera de três faculdades americanas. Dependendo do resultado que eu tiver nas faculdades americanas, eu posso começar a organizar a minha vida, já que é a minha prioridade”. Além de aguardar os resultados, a estudante está cursando, de forma on-line, duas matérias em uma faculdade do Texas em que ela conseguiu bolsa.
Elisa resolveu sair da escola há três anos, em 2018, quando percebeu que seu ritmo era diferente dos demais colegas. Em casa, desenvolveu um sistema complexo de estudos e alcançou nota 980 na redação do Enem e média geral de 799,46.
Com o saldo positivo no Enem, Elisa passou em quinto lugar em engenharia civil na USP pelo Sisu, além de ter obtido a nota máxima no SAT, o exame nacional dos Estados Unidos, algo que apenas 1% dos estudantes do mundo todo consegue. Ela também alcançou a melhor nota no SAT Matemática II e, ainda, já teve, por dois anos seguidos, bolsa de estudos na Facens, onde chegou a frequentar aulas, mas foi impedida por conta da lei.
Falta de regulamentação
Segundo o membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB Sorocaba, Henrique Brandão, o empecilho para a matrícula de Elisa se deve a falta de regulamentação sobre o homeschooling. “Essa questão do ensino domiciliar já foi enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2018. O STF entende que, embora a Constituição não faça vedação absoluta sobre o ensino domiciliar, a Constituição exige que, de alguma forma, esse ensino seja regularizado por lei federal”, explica o especialista.
“O caso dela é uma exceção que deve ser analisada pelo judiciário, não sob uma repercussão geral. “O SFT decidiu, então eu não vou desobedecer o STF e todo mundo que pedir isso, eu vou rejeitar, porque, com todo o respeito a juíza da comarca de Sorocaba, foi isso que ela fez. Ela não analisou a adolescente. Julgou que ela não teria capacidade, maturidade ou outra habilidade que não conseguiu provar. Então por que não dá a oportunidade de ela provar?”, disse Henrique Brandão.
O especialista avaliou a situação como uma hipocrisia, visto que, durante o período pandêmico, os estudantes estão estudando em casa. “Como está sendo a educação hoje, em tempos de quarentena? Não está sendo em casa? Não seria uma espécie de ensino domiciliar?”, questionou o advogado.
Conforme Henrique Brandão, a decisão não abre jurisprudência para outros casos, mas confirmou que o caso da estudante pode abrir caminhos para jovens que desejam aderir ao ensino domiciliar. “Já está tramitando há um tempo no Congresso para regulamentar o homeschooling. Cabe ao Estado regulamentar esse tipo de ensino. Mas não cabe só ao Estado decidir o que a gente quer fazer”, opinou.
Este é um dos pontos levantados por Elisa. Segundo a adolescente, um dos objetivos de vida dela é estudar, também, educação para comparar sistemas educacionais e combiná-los de forma a propor uma melhor educação brasileira, para que outros estudantes não precisem passar o mesmo processo que ela. (Kally Momesso - programa de estágio / Supervisão: Aldo Fogaça)