Buscar no Cruzeiro

Buscar

No Dia do Médico, profissionais falam sobre desafios e mudanças

18 de Outubro de 2018 às 09:12

Pesquisa mostra que médicos reconhecem a saúde como um direito do cidadão e um dever do Estado. Foto: Divulgação

No mundo em constante ebulição, os médicos constituem uma categoria profissional em contato permanente com um conjunto de grandes desafios. Este 18 de outubro, Dia do Médico, é uma data oportuna para render homenagens a esses profissionais que têm a missão de salvar vidas, muitas vezes em condições difíceis, mas é também um momento de abordar os desafios da atuação médica com o foco na melhoria das condições de cura e tratamento de doenças. É a equação que une conhecimento técnico e sensibilidade humana voltada para a proteção e atendimento aos milhões de pacientes pelo Brasil afora.

Na avaliação do Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), um dos principais desafios dos médicos é lidar com as crises do sistema de saúde no Brasil e com a formação dos novos profissionais. “Além disso, é preciso manter a relação de confiança com os pacientes, mesmo em um processo de mercantilização da medicina, tomando decisões embasadas pela Ciência e levando em conta as escolhas do paciente”, acrescenta a entidade, que traça um painel da área, médica por meio de sua assessoria de imprensa, a partir de questões apresentadas pela reportagem.

O Cremesp conta com 2.533 médicos registrados em Sorocaba. No entanto, não se pode afirmar que todos atuam na cidade, pois o registro do órgão representante da categoria é válido para que possam trabalhar em qualquer localidade do Estado de São Paulo.

Especialidades médicas

Também há especialidades médicas que se destacam com maior número de profissionais. De acordo com a Demografia Médica no Brasil 2018, quatro especialidades representam 38,4% de todos os títulos de especialistas no País. Clínica Médica tem 42.728 titulados (11,2% do total). Pediatria, 39.234 titulados (10,3%). Cirurgia Geral reúne 34.065 especialistas (8,9%). E Ginecologia e Obstetrícia conta com 30.415 titulados (8%).

O Cremesp analisa que, “embora haja um componente subjetivo, no qual cada jovem médico escolhe a especialidade para a qual demonstra ter maior aptidão, existe a importante questão do número reduzido de vagas para Residência Médica, que muitas vezes não acompanha a demanda”.

Se não houve uma mudança significativa nos últimos anos em relação ao número de especialistas, o Cremesp prevê, no entanto, que dentro de seis anos, pode haver mudanças. Isto pode ocorrer porque novas escolas foram autorizadas a abrir novas turmas de medicina, antes de o governo federal decretar moratória de cinco anos para novas liberações.

Questões humanitárias

De acordo com a Demografia Médica no Brasil de 2018, para os médicos recém-graduados, prevalece o desafio intelectual e a preocupação com questões humanitárias, como “ajudar pessoas”, “fazer o bem” e a “relação médico-paciente”. Só depois da referência ao “potencial de remuneração” que aparece em quinto lugar é que são citados fatores como “prestígio da profissão”, “influência familiar”, “aptidão científica” e “possibilidade de realizar pesquisas e exercer o ensino”.

Questões humanitárias e relação médico-paciente são desafios. Foto: Divulgação

Ainda segundo o Cremesp, a grande maioria dos egressos (80,2%) pretende fazer Residência Médica -- fundamental para a formação prática dos médicos -- e, para 83,6% deles, é essencial uma boa combinação entre trabalho e vida pessoal. A maioria também reconhece a saúde como um direito do cidadão e um dever do Estado, diz que o Sistema Único de Saúde (SUS) deve ser expandido e que a falta de financiamento e a gestão deficiente são os grandes problemas do SUS.

O Cremesp analisa que “a incorporação de novos procedimentos e equipamentos permite avanços no tratamento e diagnóstico de doenças e mudanças na relação médico-paciente, influenciadas também pelo maior acesso à informação e autonomia da pessoa assistida”. À medida que as plataformas online e as tecnologias digitais continuam a emergir, continua o órgão, as transformações avançam em ritmo acelerado, com repercussão nos modelos de ensino e pesquisa, assim como na prática médica e na gestão de saúde.

Comparando a 4ª edição da Demografia Médica no Brasil, lançada este ano, com a 3ª edição, lançada em 2015, não há diminuição de profissionais em nenhuma das especialidades.

Anualmente, Sorocaba forma cerca de 100 novos médicos

Anualmente, Sorocaba forma cerca de 100 novos médicos Godofredo Campos Borges. Foto: Divulgação

A Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica (PUC) em Sorocaba (Faculdade de Medicina) forma aproximadamente 100 médicos por ano e a maioria vai para a Residência Médica, período em que os jovens médicos buscam uma especialização. Em tempos de grandes avanços da tecnologia, a Faculdade de Medicina reconhece a importância do domínio tecnológico para o atendimento de qualidade na área da saúde, mas também não abre mão da prioridade de o médico ter contato pessoal com o paciente, saber ouvi-lo e conhecê-lo integralmente para obter êxito no combate à doença.

Essa integração de conhecimento técnico e humano é citada pelo diretor-adjunto da Faculdade de Medicina, Godofredo Campos Borges, como fator que faz a diferença no perfil do médico. “Não dá pra afastar a tecnologia do médico, só que não tem como pegar um doente sem olhar no olho, escutá-lo”, descreve Godofredo. “A nova geração está muito ligada à tecnologia, mas nada substitui o ato de escutar um doente.”

“Vai se dar bem na medicina quem aliar o uso da tecnologia com o hábito de escutar e examinar o doente”, acrescenta Godofredo, assegurando que as duas vertentes de atuação se complementam e são necessárias ao bom atendimento na área de saúde.

Conhecer o paciente no conjunto total do seu perfil e não de forma fragmentada é um conceito que tem relação com visão de saúde. Atento a essa necessidade, o projeto pedagógico do curso de Ciências Médicas insere o estudante, desde o primeiro ano de estudos, nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) para contatos diretos com os pacientes.

Anualmente, Sorocaba forma cerca de 100 novos médicos A PUC Sorocaba insere os alunos nas UBSs para promover contato direto com os pacientes. Foto: Emdio Marques / Arquivo JCS

No quarto, quinto e sexto anos da graduação em Medicina, a Faculdade amplia esse contato e a presença dos alunos nas UBSs passa a ser diária para intensificar a aprendizagem prática. Nas UBSs, adultos, idosos e crianças apresentam ampla variedade de questões de saúde e que estão associadas às condições sociais. Marcado por doenças simples e de atendimento primário, que afligem 80% da população, esse contato direto forma um campo especial de atuação para o ensino na área de saúde.

O curso de Medicina tem duração de 6 anos com mais 2 de Residência, podendo chegar até a 5 anos dependendo da especialidade. Isto corresponde a uma formação completa que dura de 8 a 11 anos para que o profissional possa ingressar no mercado de trabalho como especialista.

Cooperativa de médicos é modelo de sucesso no País

O tradicional clichê de que a união faz a força ganhou tradução concreta no conceito do cooperativismo praticado por muitos médicos brasileiros na área de saúde. Fundada em 4 de junho de 1971, a cooperativa de trabalho médico Unimed é um modelo de sucesso nesse mercado.

Com presença em todo o País, o sistema Unimed abrange aproximadamente 350 cooperativas que arregimentam 114 mil médicos e dão a dimensão de grandeza de um mercado que veio para ficar, consolidou-se e inspira até mesmo outras iniciativas do gênero no exterior, descreve o médico José Francisco Moron Morad, presidente da Unimed em Sorocaba.

Cooperativa de médicos é modelo de sucesso no País José Francisco Moron Morad é presidente da Unimed Sorocaba. Foto: Ednilson Jodar Lopes / Arquivo JCS (11/7/2018)

Moron explica que o cooperativismo da categoria surgiu no Brasil como forma de buscar melhoria das condições de trabalho e de valorização do médico. Antes de enveredar pelo novo modelo, os médicos viveram uma época de medicinas de grupo de natureza mercantilista. Os profissionais de saúde enfrentavam condições de trabalho precárias, eram assalariados com remunerações “aviltantes” e sentiam-se explorados como trabalhadores.

Com o desafio de reverter essa situação, a primeira cooperativa com o nome de Unimed foi criada em Santos há 47 anos. A proposta era fundar um organismo que garantisse trabalho digno e remuneração compatível com a importância da profissão.

Na cooperativa, o médico não tem salário, é o dono do negócio com direito a voto nas decisões tomadas em assembleias. E a remuneração é proveniente do resultado da prestação de serviços de saúde vendidos a empresas e também a particulares. Nesse modelo, explica Moron, o médico é cooperado e não tem ganhos, mas resultados.

Os resultados correspondem às sobras computadas após descontos dos gastos com a prestação de serviços. E são distribuídos de acordo com a produção dos médicos, medida em volume de trabalho contados nos atendimentos de saúde. “Tudo é baseado na produção”, esclarece Moron. O mesmo compartilhamento, com distribuição entre os cooperados, ocorre caso o balanço de determinado período seja deficitário.

Cooperativa de médicos é modelo de sucesso no País A Unimed abrange cerca de 350 cooperativas em todo o Brasil. Foto: Divulgação

Moron informa que essa forma de operar pauta o funcionamento de todas as cooperativas, como nas áreas de crédito, agrícolas, entre outras. O presidente da Unimed em Sorocaba ressalta que o cooperativismo é um sucesso no Brasil. Na medicina ainda há cooperativa de especialistas, como a de cirurgiões toráxicos, por exemplo.

“O cooperativismo é um modelo de tanto sucesso que o Brasil já começa a exportá-lo para outros países na América”, compara Moron. Ele também informa que o modelo apareceu no século 19 na Inglaterra. Desenvolveu-se em outros países como França e Itália e consolidou-se com força na Espanha, onde há inclusive cooperativas de produtores de vinho.

Profissionais de saúde participam de banco

Entre as novas oportunidades geradas pelo mercado de saúde está a criação de um banco voltado preferencialmente para o atendimento a essa categoria de profissionais. A cooperativa de crédito Uniprime tem agências em Sorocaba e outras cidades de São Paulo e do Paraná. Foi criada há 21 anos especialmente para atender aos profissionais liberais de saúde com os produtos tradicionais da rede bancária.

Com o passar dos anos, a cooperativa de crédito ampliou a abrangência de atendimentos e incluiu também entre os seus cooperados os profissionais liberais de outras categorias como engenheiros, arquitetos, economistas e professores. Os profissionais liberais da saúde, no entanto, representam 80% dos cooperados.

Profissionais de saúde participam de banco Jabur é um dos fundadores. Crédito da foto: Divulgação

“O princípio do cooperativismo é único e, independente da forma, o objetivo é que as pessoas aprendam a trabalhar em conjunto em busca da defesa dos seus interesses”, afirma o presidente do Conselho de Administração da Uniprime, Alvaro Jabur, um dos fundadores da cooperativa.

Criada inicialmente em três cidades do Paraná (Londrina, Maringá e Apucarana), hoje a Uniprime também tem agências em Sorocaba, Campinas, Marília, Bauru e São José do Rio Preto. A próxima será em Ribeirão Preto. “Oferecemos tudo o que uma agência bancária tradicional oferece, com algumas diferenças”, descreve Jabur.

Segundo ele, o primeiro destaque é que o cooperado tem direito a participar de todas as decisões tomadas em assembleia e dos processos de decisões da Uniprime. Há vantagens na isenção de algumas tarifas e benefício tributário. E há a possibilidade de participar do resultado, com devolução do lucro ao cooperado conforme seu nível de participação no negócio.

Jabur compara a Uniprime a um “banco de família”, levando em conta que as agências conhecem os perfis dos cooperados. Além disso, acrescenta, a cooperativa se pauta pela atuação ética e socialmente justa. “Colaborando com o crescimento da sociedade como um todo, a Uniprime se insere em atividades assistenciais e culturais, com várias linhas de créditos para projetos socioambientais. São propostas bastante amplas e equilibradas e que vão de encontro com o que o País precisa”, completa Jabur.

Médicos que foram (e vão) além do ofício da medicina

Muitos médicos brasileiros entraram para a história com legados de grande contribuição para a saúde pública e entre eles podem ser citados Osvaldo Cruz, Álvaro Soares, Adolfo Lutz e Emilio Ribas. Álvaro Soares e Osvaldo Cruz tiveram atuação de destaque também em Sorocaba por ocasião dos combates contra às epidemias de febre amarela e a gripe espanhola, entre o final do século 19 e início do século 20. Uma rua da área central de Sorocaba tem o nome de Álvaro Soares.

Mas não só na profissão que escolheram os médicos se destacaram ao longo da história. Muitos também ganharam projeção na política, nas artes, na literatura, nas ciências. Na política, Juscelino Kubitschek de Oliveira, o JK, que foi presidente da República e construiu Brasília, veio da medicina. O escritor João Guimarães Rosa, autor do clássico “Grande sertão: veredas”, também era médico.

Outros médicos se destacaram na literatura e entre eles podem ser citados Pedro Nava, Moacyr Scliar, Afrânio Peixoto, Lair Ribeiro e Joaquim Manuel de Macedo. Nas letras de outros países também se encontram o russo Anton Thekhov e o português Antonio Lobo Antunes. Um dos líderes da revolução cubana do fim da década de 1950, Ernesto Che Guevara, também era médico e ensaísta.

Em Sorocaba, o médico Edgar Steffen, autor do livro, “O picolé milagroso - crônicas escolhidas”, também tem se projetado como escritor e é colunista do Cruzeiro do Sul.

Como registro, São Lucas, padroeiro dos médicos, além de evangelista e profissional da medicina, acumulou a atividade de artista plástico. Sobre ele há uma citação do padre Antonio Vieira, num dos seus sermões, que o descreve assim: “Admirável, quando com três dedos tomava a pena como evangelista; admirável quando com três dedos tomava o pincel como pintor; admirável quando com três dedos tomava o pulso como médico.”

Por que escrevem

Perguntam-se por que médicos habitualmente se desdobram em talentos para a literatura. A natureza da profissão os coloca em contato intenso com os conflitos humanos perante situações extremas, carregadas de sofrimento e morte, e em constante desafio com a missão de salvar vidas. O acúmulo de histórias e sentimentos vistos e experimentados abre caminhos para traduzir essas emoções em contos, romances, poesia, ensaios, teatro.

Outras figuras históricas que se inserem nessa categoria são o astrônomo Nicolau Copérnico, o sacerdote francês François Rabelais e o geógrafo e poeta italiano Girolamo Fracastoro.

Hipócrates

Hipócrates (460.a.C. a 377 a.C.) é um nome considerado por muitos uma das figuras mais importantes da história da medicina. Outra figura da antiguidade associada ao combate às doenças é Imhotep, do Egito antigo, muito antes de Hipócrates. Nascido numa ilha grega, os dados sobre Hipócrates são raros e incertos, deixou obras com descrições, pelas quais se pode diagnosticar doenças como a malária, papeira, pneumonia e a tuberculose.

Profissão tem desafios, diz diretor de hospital

Os desafios da medicina começam pela carreira profissional, avalia o médico Rafael Moraes, diretor clínico do Hospital Samaritano. Segundo ele, a carreira tem reconhecimento social, mas depara com dificuldades como carga horária prolongada e a necessidade de conseguir equilibrar vida social, família e profissão. Ele observa que alguns médicos chegam a trabalhar até 80 horas por semana.

Sobre outro desafio, em relação à tecnologia, Moraes acha “impressionante” a velocidade da informação que chega aos pacientes e aos médicos. “Isso exige muito de nós, médicos, no sentido de nos mantermos atualizados e saber utilizar a informação a nosso favor”, diz.

Carreira é reconhecida, mas há dificuldades, avalia Moraes. Foto: Erick Pinheiro

O avanço tecnológico chegou a tal ponto, acrescenta Moraes, que às vezes os pacientes trazem novas informações aos médicos. Isso acontece porque os pacientes também se organizam em grupos nas redes sociais, que compartilham avaliações entre os perfis de convênios e suas coberturas de tratamento. A novidade gera implicações, inclusive jurídicas, e isso traz dificuldades para operadoras de saúde e convênios médicos. Segundo Moraes, a Agência Nacional de Saúde (ANS) tenta inserir regras nessas relações.

A tecnologia também permite que o paciente possa receber exames em aplicativos, o que é “fantástico”, na visão de Moraes. Ele acredita, porém, que não se deve perder de vista a necessidade do contato pessoal entre médico e paciente: “Essa é a base do raciocínio clínico e é o que direciona o tratamento.”

Perguntado se os governos atrapalham ou são fontes de solução para a saúde, Moraes avalia: “De uma forma geral, falta muito gestão. Existem recursos, mas são mal utilizados. Temos possibilidade de ampliar, melhorar, e ter resolutividade muito melhor com menos desperdício. Falta ainda cortar desperdício, pagar bem o médico que trabalha direito, que gosta do que está fazendo e dá valor ao emprego que ele tem.”

Galeria

Confira a galeria de fotos