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Mercado Municipal

Mercado Municipal é referência no comércio central

07 de Maio de 2018 às 14:15
Fachada do Mercado Municipal de Sorocaba o Mercadão
Fachada do Mercado Municipal de Sorocaba o Mercadão (Crédito: Arquivo Jornal Cruzeiro)

O Mercado Municipal de Sorocaba "Alcino de Oliveira Rosa" chega, em 2018, aos 80 anos de existência com a missão de olhar para o futuro, sem abandonar a tradição. Clientes, proprietários e funcionários contam como, através de gerações, se formou uma grande família do "mercadão". Os produtos tradicionais, de qualidade, e o atendimento personalizado seguem como os grandes diferenciais do centro comercial. A necessidade de desburocratização do processo de reocupação dos boxes vazios, no entanto, é apontada como necessária pelos mercadores.

Ao público, o mercadão abre as portas às 7h. Desde às 4h, porém, produtores de toda a região começam a abastecer os boxes com seus produtos frescos. São estes trabalhadores os primeiros clientes do dia na tradicional Lanchonete do Bene. "Servimos café da manhã, lanches, salgados, sucos e refrigerantes", conta o proprietário João Carlos Cortez, 53 anos.

João Carlos hoje gerencia a lanchonete que era do pai - Emidio Marques
João Carlos hoje gerencia a lanchonete que era do pai (crédito: Emidio Marques)

 

O Mercado é um turbilhão de pessoas diferentes. "Todo dia tem gente nova. Gente brava, gente alegre", relata o comerciante. Alguns são conhecidos de uma vida toda. "Temos os fregueses de todo dia. Geralmente contam alguma história, um problema, uma alegria. A gente vai participando da vida de um monte de gente".

Para Marcos Vinícius Moraes Gama, 40 anos, que trabalha na região central, comer um salgado da lanchonete é um ritual há cinco anos. Com gosto saboreia o lanche e conta que o sabor é especial. "O Mercado tem a cultura, as comidas. Fico lembrando do interior, lá de casa", conta o homem que veio do Paraná.

João Carlos herdou o negócio do pai, Henrique Benedito Cortez, que trabalhou na lanchonete desde sua criação em 1962 até falecer há aproximadamente seis anos. O comerciante, porém, não sabe precisar há quanto tempo atua no local, cresceu no Mercado acompanhando os pais.


Quintal de gerações

"Meu filhos foram criados dentro do Mercado Municipal. Aqui era o nosso quintal", relata Tereza Henna, proprietária da Mercearia King. A empresária conta que em uma época onde não existia preocupação com a violência no Centro, os filhos dos comerciantes cresciam entre os boxes do Mercado, brincando livremente no entorno.

O presidente da Associação dos Mercadores, Eduardo Cortez, 41 anos, conta que a maior parte dos espaços é ocupado pelos mesmos estabelecimentos há mais de 30 anos. Sua loja -- onde vende calçados, carteiras, ervas e itens de bazar -- era também do seu pai. A tradição se reflete também entre os clientes. "80% dos nosso público são idosos, pessoas tradicionalistas", observa.

O Mercadão Paca, antes conhecido como Armazém da Paca, existe há três gerações. José Antônio Alquezar, 60 anos, conta que tudo surgiu com os avós José Alquezar e Franscica Garbo Moreno Alquezar. A senhora era chamada de Paca -- tradicional apelido para Franscisca na Espanha -- o que acabou batizando o estabelecimento, que passou de pai para filho. De vez em quando, relata José, ainda recebe algum cliente que se recorda dos tempos antigos, mas estão cada vez mais raros. "Brinco que somos os que mais perdem fregueses", diz.

Frutas, verduras e legumes são apenas alguns dos produtos encontrados no mercadão - EMIDIO MARQUES
Frutas, verduras e legumes são apenas alguns dos produtos encontrados no mercadão (crédito: EMIDIO MARQUES)

 

A renovação da clientela, no entanto, tem ocorrido de forma inesperada, por meio de velhos conhecidos, como grãos e ervas, que impulsionam a "geração saúde". Hoje, os idosos dividem espaço com jovens trajando roupas de academia em busca de produtos naturais. Para Tereza, o ramo é assim, cheio de mudanças. "Foi mudando, todo o ramo varejista, que trabalha com comida, sempre trabalha com os altos e baixos, tem muitas novidades", explica.

 

Atendimento personalizado

A administradora de empresas Claudenete Agalha de Andrade, 60 anos, vai ao mercadão por volta de três vezes na semana há 18 anos. Para ela, muito além de fazer compras, ir ao local é um passeio. A qualidade e variedade das nozes, castanhas, frutas, sementes e azeites são diferenciais apontados pela senhora, mas o atendimento tem destaque. As conversas com os vendedores -- que muitas vezes são os próprios donos dos boxes -- são um dos atrativos. "Você pega amizade com o pessoal, parece uma família", diz.

A proprietária da Mercearia King, Tereza Henna, destaca que o atendimento é personalizado, cheio de dicas e sugestões. "A melhor coisa que tem é o relacionamento com a freguesia. É o corpo a corpo. Aqui você conhece os fregueses. Aqui não é como um supermercado que você entra, pega o que quer e sai, vai paga e acabou. Aqui o que vale é a interação, a comunicação e a gentileza", afirma. Para a cliente Claudenete, o Mercado Municipal é um ponto turístico. "Tem que passar para conhecer, para ver o que Sorocaba tem", diz.

O Comercial Zé Franco é referência desde os primórdios do Mercado Municipal, sendo um dos boxes mais conhecidos. O estabelecimento foi fundado por José Franco de Camargo e comercializa itens de tabacaria e ervas. O comerciante, que hoje tem 95 anos, ainda pode ser visto pelos clientes no local em alguns dias da semana -- sorte que a reportagem não teve. Zé Franco foi alvo de várias reportagens do Cruzeiro do Sul ao longo dos anos.

 

Prédio do Mercado é tombado como patrimônio há 30 anos

O prédio do Mercado Municipal de Sorocaba foi inaugurado em 12 de outubro de 1938, como um imponente e moderno centro comercial -- sendo tombado como patrimônio histórico em 1988. O Mercadão foi erguido no que era conhecido antigamente como Largo de Santo Antonio, um espaço que reunia uma igreja em homenagem ao santo e um galpão que funcionava como o principal mercado da cidade -- ambas as estruturas já foram demolidas. Hoje, a área fica entre as ruas Francisco Scarpa e Padre Luiz, no Centro de Sorocaba.

Historiador José Rubens Incao: Mercado é cultural - Fábio Rogério
Historiador José Rubens Incao: Mercado é cultural (crédito: Fábio Rogério)

 

O historiador José Rubens Incao explica a relevância do centro comercial na época. "As pessoas moravam no sítio e vinham aos domingos para a cidade para se abastecer do que não produziam no sítio, geralmente sal e carne", explica. Deste hábito, persiste ainda nos antigos a expressão "vou para a cidade", quando falam da região central. Como muitos usavam charretes, o largo contava com um grande bebedouro para cavalos. Já entre os anos 50 e 90, o entorno do Mercado era conhecido pelos pontos de embarque e desembarque dos passageiros de ônibus.

De acordo com o inventário dos bens tombados de Sorocaba, levantamento feito pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), o prédio foi projetado pelos arquitetos Affonso Iervolino e Zenon Lotufo em estilo art déco. De 2000 a 2002 o edifício passou por reforma, e em 2003, o entorno foi revitalizado. O espaço tem grau de preservação 2, de acordo com seu tombamento, que prevê preservação parcial, apenas do exterior do edifício, compreendendo sua fachada.

Mercado Alcino de Oliveira Rosa foi inaugurado em 1938 e projetado em estilo art déco -  ACERVO BIBLIOTECA INFANTIL DE SOROCABA / 1950
Mercado Alcino de Oliveira Rosa foi inaugurado em 1938 e projetado em estilo art déco (crédito: ACERVO BIBLIOTECA INFANTIL DE SOROCABA / 1950)

 

Em 1964 o prédio foi nomeado, pela Câmara de Sorocaba, Alcino de Oliveira Rosa em homenagem ao prefeito responsável pela construção. Segundo lembra o historiador, o prédio foi feito no estilo francês art déco, que pode ser visto em outros imóveis da cidade, como a agência dos Correios na rua XV de Novembro. Um estilo geométrico e imponente, que era destacado pelas escadarias na entrada principal -- que não existem mais, o que facilita a acessibilidade. O historiador conta que o prédio representava um evolução na época, sendo arejado, belo e com muitas janelas. "Era a modernidade chegando a Sorocaba", diz.

Para Incao, o Mercado Municipal é um centro de convivência e de cultura gastronômica. Ele lembra, por exemplo, da presença de dezenas de senhores e senhoras que há décadas se reúnem no entorno do mercadão para realizar a troca e venda de produtos, como relógios e outros itens, Nessas transações, o ganho financeiro é um coadjuvante às conversas e arte da negociação. "Você quer conhecer uma cidade? Você conhece pelo que ela come e o que ela reza. Então o Mercado para mim é o local mais cultural de Sorocaba. Lá está toda a mesa do sorocabano, desde a cozinha bandeirante, a tropeira que é a caipira, até hoje as mais "fashions", como a orgânica", afirma.

 

Comerciantes pedem ocupação dos boxes

Dos 54 espaços para comércio no Mercado Municipal de Sorocaba, em torno de 45 estão ocupados, segundo o presidente da Associação dos Mercadores, Eduardo Cortez. Porém, os espaços vazios chamam a atenção por estarem nas áreas internas e são alvo de reclamação dos mercadores, que acreditam ser mais benéfico aos negócios um mercadão ocupado. O problema é que para promover a reocupação dos espaços, a Prefeitura de Sorocaba precisa realizar um processo licitatório -- o que não ocorre. O município diz que as licitações estão suspensas aguardando a conclusão de estudos de um novo modelo de gestão para modernização do mercado, que deve se concluir em aproximadamente 90 dias.

Cortez relata que, recentemente, foi obtido junto à Prefeitura permissão para ampliação do estacionamento e que, em geral, sente "boa vontade da Prefeitura". O espaço do centro comercial é municipal, mas a administração é realizada pelos mercadores por meio da associação. A preocupação, no momento, é com a questão do esvaziamento dos boxes, em grande parte devido aos falecimentos de antigos proprietários.

Hoje, segundo a Prefeitura de Sorocaba, os interessados em abrir um comércio no Mercado Municipal devem participar de processo licitatório, na modalidade de concorrência do tipo maior oferta. Para participar da concorrência, é preciso estar em conformidade com a habilitação jurídica, regularidade fiscal e qualificação econômico-financeira previstas no edital. Assim que um dos interessados for habilitado, o contrato tem vigência de 12 meses, a partir da emissão da Ordem de Início dos Serviços, podendo ser prorrogado a critério das partes envolvidas.

O presidente da associação relata que o objetivo é realizar uma reocupação, sem perder as características do espaço -- conhecido pela venda de produtos fracionados, cereais, mercearia no geral, hortifruti, produtos naturais, ervas e peixaria. "O maior desafio é manter a história viva e não deixar declinar o comércio, apesar da crise (econômica) e dos falecimentos", avalia Cortez. Para o presidente da associação, o Mercadão é um marco cultural da cidade. "Acho que a gente tem que saber um pouco de nossa cultura. Se você não sabe de onde veio, não sabe para onde vai", diz.

 

Serviço

O Mercado Municipal de Sorocaba funciona de segunda-feira a sexta-feira, das 7h às 18h30. Aos sábados o atendimento é das 7h às 14h.

 

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