Aeroporto de Sorocaba é ilha de eficiência e tecnologia
As dezenas de aeronaves hangaradas em um único dia valem R$ 15 bilhões. Crédito da foto: Vinícius Fonseca (1/9/2020)
Imagine o orçamento previsto para Sorocaba em 2021, cerca de R$ 3 bilhões, multiplicado por cinco e concentrado em uma pequena área da cidade. Esse é o valor aproximado de cerca de 300 aeronaves que estavam hangaradas ou realizando manutenção na última quinta-feira (1) no Aeroporto Estadual de Sorocaba -- Bertram Luiz Leupolz em uma estimativa feita por empresários e especialistas ouvidos pela reportagem. O valor de todos os aviões, juntos, se aproximava de R$ 15 bilhões.
Não é à toa que o Aeroporto de Sorocaba é o maior em manutenção de aeronaves executivas na América do Sul e um dos maiores do mundo nessa especialidade. São mais de 50 empresas atuando, somente dentro do aeroporto. Ao sul, mais perto da Vila Angélica, ficam as empresas privadas, ligadas à Associação dos Proprietários, Permissionários e Operadores de Hangares do Aeroporto de Sorocaba (Aprohapas). São os desbravadores financeiros do Aeroporto de Sorocaba, os primeiros investidores que transformaram o local na potência econômica de hoje.
A primeira empresa é a autorizada da fabricante suíça de aeronaves Pilatus Aircraft. A Synerjet ocupa quatro hangares e é especializada na manutenção da Pilatus. Entre os 12 aviões hangarados e aguardando os reparos ou manutenção de rotina, uma aeronave da Azul Linha Aéreas. O avião de pequeno porte faz parte da nova estratégia de transporte regional da gigante nacional de transporte aéreo comercial.
“É trabalho 24 horas. A aviação não pode parar”, comenta o empresário Paulo Oliveira, piloto de avião desde 1985, nosso guia entre as 36 empresas que atuam na área privada do aeroporto. Ele conta que existem procedimentos complexos na manutenção das aeronaves, cujos mecânicos têm responsabilidade civil sobre seus trabalhos. Há uma hierarquia na realização da revisão, que começa no mecânico, passa pelo inspetor e termina no chefe da mecânica ou da oficina. “Nunca passa por menos de três pessoas”, comenta. Os profissionais ainda assinam um documento, uma espécie de termo de responsabilidade sobre o serviço executado. Uma retífica de motor ou turbina pode custar até U$ 250 mil, mais de R$ 1,2 milhão. Isso para as aeronaves hangaradas naquele momento.
Há ainda na área privada a Gold Wings Aviation. Ao menos oito aviões estavam no local quando a reportagem visitou o aeroporto. Ainda preparando os últimos detalhes, a Aero Store Aviation. A empresa atua com serviços de compra, venda, importação e exportação de aeronaves, além de venda de peças e componentes aeronáuticos, hangaragem e atendimento aeroportuário. Ainda na área privada, a Cervejaria Petropólis também tem um hangar.
A Pratt & Whitney Canadá é outra empresa que mantém atividades no Aeroporto de Sorocaba. No local, ela faz manutenção de motores. Há também um centro de distribuição de peças. A Pratt & Whitney é uma das principais fornecedoras de motores de aviação geral no Brasil.
Já a Hangar B é outra empresa com foco na manutenção de aeronaves. Segundo Paulo Oliveira, ela é especialista em aeronaves antigas. A VMF Aero - Manutenção de Aeronaves, também instalada na área particular do aeroporto, é uma das autorizadas da fabricante norte-americana Cirrus Aircraft.
A Conal é um caso à parte, pois faz parte da história da cidade. Seu antigo proprietário, o sr. Bertran, é que dá nome ao aeroporto. Seguramente é uma das maiores empregadoras do local. São mais de 100 colaboradores. Os profissionais são divididos em várias equipes especializadas, que fazem desde os reparos nos tecidos até a manutenção de fuselagem e dos motores. Mais do que somente a manutenção, a Conal revitaliza e também atua no comércio de aeronaves. Cerca de 20% de todas as aeronaves hangaradas no Aeroporto de Sorocaba estão na Conal. São cerca de 50 a 60 aviões.
“A aviação é dinâmica. Todo mundo tem pressa”, diz Hélio Almeida, gestor de segurança operacional da Conal. De acordo com ele, a qualidade e a segurança fazem parte da premissa da atuação da empresa.
Pelo caminho, encontramos vários profissionais de manutenção da aviação área. São mais de 1,5 mil contratados de forma direta. Os cargos são os mais variados possíveis. A lista inclui, por exemplo, mecânicos de várias categorias, passando pelo operador de trator e pelo trabalho de recepção e segurança, até os altos executivos. Os salários, somente entre os mecânicos, podem chegar a mais de R$ 10 mil.
Dentro da área privada, inclusive, há uma área militarizada. É onde são feitas as manutenções das turbinas das aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB). A serviço das empresas que atuam na área, uma pista de taxiway de aproximadamente 400 metros de comprimento. A divisão entre a área particular e da área pública é feita de forma incomum, por uma cancela.
Crescimento acelerado nos últimos anos
A Embraer se instalou em Sorocaba em 2013. Crédito da foto: Divulgação
O sítio aeroportuário de Sorocaba é dividido em quatro áreas, públicas e privada. As áreas públicas são três, sendo uma delas da Prefeitura de Sorocaba, onde está o prédio e as antigas instalações do Aeroclube de Sorocaba. A segunda pertence ao Governo do Estado de São Paulo. É a maior e é administrada pelo Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (Daesp). Na área atuam as empresas que receberam concessão. Elas são ligadas à Associação dos Operadores do Aeroporto de Sorocaba (ASOS). O aeroporto ainda conta com um pequena área que pertence à União.
Foi com o chamado apagão aéreo registrado no Brasil em 2007 que a empresa Falcon Dassault se aproximou de Sorocaba. Era o processo de descentralização das atividades aeroportuárias do Aeroporto de Congonhas, na Capital, que já não suportava tamanho volume de operações. Quem relembra a situação é Fernando Volponi, da Jet Care Aviation. A empresa atua no apoio às oficinas e na guarda de aeronaves.
Conforme ele, havia à época outras opções, como Campinas e Jundiaí. Mas a escolhida foi Sorocaba. “Tinha já algumas oficinas. Era um aeroporto de serviços”, conta Volponi. Era dado início ao processo de hangaragem e manutenção de aeronaves maiores no Aeroporto de Sorocaba.
Gledson Renato Torres é gerente de qualidade da fabricante Dassault. Ele relata os problemas do aeroporto que atrapalham a operação. Em um dos episódios, a empresa contratante se recusou a voar a Sorocaba pela falta de regulamentação de cerca de 150 metros de pista do aeroporto. Com a situação, a empresa de manutenção teve que deslocar para a Bahia para efetivar os trabalhos. “Se acontece qualquer evento, o seguro vai dizer que ‘não é comigo, a pista não está homologada’”, comenta sobre a justificativa do cliente.
Outra dificuldade está na aquisição de alguns equipamentos usados na manutenção. Há casos onde a exportação demora vários dias. Mas a situação poderia ser diferente, caso Sorocaba tivesse, por exemplo, uma empresa especializada em manutenção em hélices, que é feita no Brasil, mas em outras cidades. Também falta de acordo com ele, mão de obra especializada em pintura, por exemplo.
Quando Gledson Torres atendia a reportagem, dois chamados para manutenção foram iniciados paras as equipes comandadas por ele, sendo um para o Aeroporto de Congonhas, na Capital, e o segundo no aeroporto da cidade de São Roque.
Embraer
A partir de 2013 o Aeroporto de Sorocaba ficou ainda mais fortalecido. Foi o início das operações da Embraer S.A., a gigante fabricante de jatos executivos. Junto com a empresa, à época, vieram ao menos 300 empregos diretos. A Embraer segue como a maior empregadora do aeroporto. Junto com ela, as chamadas sistemistas ou fornecedores de produtos e serviços também se instalaram no local.
Além da Dassault, da Jet Care e da Embraer, a lista de associados da ASOS ainda conta com as empresas América do Sul, Dedalus, Crefisa, Icon, Embraer e BR Combustível Aviação.
Apoio a negócios bilionários
Em junho de 2017, um jato executivo de última geração e grande autonomia partiu de Sorocaba com destino à Inglaterra. Não era um voo qualquer. Levava executivos para realizar um negócio na Europa que equivaleria hoje a R$ 6,6 bilhões. Tudo para a tranquilidade de voo foi feito a partir de Sorocaba. Da limpeza e manutenção da aeronave, à documentação necessária para a partida. Essas são algumas das funções de dezenas de empresas que atuam no aeroporto. O cuidado com o trem de pouso, o distanciamento entre as asas na hangaragem, as calibrações necessárias. Tudo é checado e rechecado. Não uma, mas várias vezes. Como se diz com frequência entre os profissionais do ramo aeroviário, no céu não há acostamento.
Mas os profissionais fazem mais que isso. Há espaço e tempo necessários para ajeitar e sobrepor no lugar certo até as pantufas do “passageiro”. Como se ainda não fosse suficiente, naquela viagem para a Europa, a que resultou no grande negócio, ainda de quebra, de Sorocaba, o aeronave levou produtos de uma padaria da cidade. Com o perdão da piada, uma mostra de que a coxinha de Sorocaba se internacionalizou bem antes do aeroporto.
O aeroporto é vetor de desenvolvimento
O economista Geraldo de Almeida. Crédito da foto: Fábio Rogério (1/10/2020)
Para o presidente da Associação dos Operadores do Aeroporto de Sorocaba (ASOS), o economista Geraldo de Almeida, é necessário olhar e focar para as possibilidades do aeroporto. Ele também opina sobre o momento do Aeroporto de Sorocaba. “O momento é de reflexão, de mostrar o que nós temos, quais as possibilidades que ele tem. Precisamos refletir sobre como ele está vivendo, levando em consideração o público e o privado. Mas é a hora de a gente pensar e abraçar esse aeroporto como um vetor de desenvolvimento da cidade. Pensar com um grande gerador de empregos e de impostos”, afirma.
O economista defende a união para se enfrentar os desafios, em especial no que diz respeito à concorrência. “É olhar para dentro de uma pérola, de uma joia que está escondida em Sorocaba. É a hora de a gente se unir. Se existe o risco de concorrência de outros aeroportos em um momento difícil que e a economia está, você não pode dar as costas para o emprego e para a oportunidade.”
Almeida diz que o local pode gerar muito mais possibilidades, o que não ocorre pelo fato da subutilização. De acordo com ele, é importante que as ações sejam sincronizadas entre o setor público, em todos os âmbitos, e o setor privado. “Quando a economia retomar, nós vamos estar preparados para receber grandes aeronaves, gerar mais empregos. Esse momento é reflexivo, de pensar o que eu quero para Sorocaba com esse aeroporto”, comenta.
Geraldo de Almeida é um dos entusiastas do Aeroporto de Sorocaba. Foi secretário de Desenvolvimento da Prefeitura de Sorocaba no governo de Antonio Carlos Pannunzio (PSDB). No exercício do cargo deu o primeiro passo para o processo de internacionalização. Almeida também foi um dos defensores da transformação do local em zona de desenvolvimento especial. A situação está na lei municipal de incentivos fiscais. Ele também foi a ponte para que a reportagem visitasse as empresas privadas que atuam na área pública do aeroporto. (Marcel Scinocca)
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