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Denúncias de maus-tratos a animais passam de mil casos

17 de Fevereiro de 2021 às 00:01
Engenheira Bárbara Maria Brandão Gorgulho com Nairóbi no colo. Crédito da foto: Arquivo Pessoal
Engenheira Bárbara Maria Brandão Gorgulho com Nairóbi no colo. Crédito da foto: Arquivo Pessoal (Crédito: Engenheira Bárbara Maria Brandão Gorgulho com Nairóbi no colo. Crédito da foto: Arquivo Pessoal )

Pedro e Rose, adotados pela estudante Brenda Rodrigues Pinto. Crédito da foto: Arquivo JCS

A Seção de Proteção e Bem-Estar Animal, da Secretaria do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Sema) de Sorocaba, recebeu, em 2020, 1.017 denúncias de maus-tratos a animais domésticos. Entre 1º de janeiro e 14 de dezembro do ano passado, 103 animais, entre cães e gatos, em risco de morte, foram resgatados.

Os casos mais frequentes são de animais presos em corrente curtas, sem abrigo e deixados sozinhos em casas. Além destas, diversas outras situações caracterizam maus-tratos. São elas: abandonar; agredir fisicamente; envenenar; manter preso, de forma permanente, em correntes; deixar em locais pequenos e sem higiene; não abrigar do sol, da chuva e do frio; deixar sem ventilação ou luz solar; ou, ainda, não dar comida e água diariamente.

Segundo a Sema, nos atendimentos, uma equipe é designada para verificar a situação dos animais. Em casos mais simples, os tutores são orientados a fazer todas as adequações necessárias para continuarem com a tutela. Há um prazo para o cumprimento das determinações. Já em situações extremas, quando o animal corre risco de morte, é levado para o Abrigo Municipal. No local, depois de receber os cuidados necessários, é disponibilizado para adoção. Em 2020, 120 foram adotados. Outra providência tomada é o registro de boletim de ocorrência na Polícia Civil, para posterior autuação dos responsáveis.

Em Sorocaba, Organizações Não Governamentais (ONGs) também fazem esse trabalho de resgate e incentivo à adoção. Uma delas é a Associação Protetora dos Animais de Sorocaba (Spaso). De agosto a dezembro do ano passado, a instituição recebeu cerca de 15 solicitações de resgates de animais, por dia. Em outubro, novembro e dezembro, a média mensal variou de 200 a 500 pedidos, informa o presidente da Spaso, Vanderlei Martinez. De acordo com Maristela, as denúncias partiram de Sorocaba e outras 17 cidades da região. Conforme eles, as situações mais comuns são de animais encontrados sem alimento e água e com doenças. Martinez ainda fala que o número de abandonos cresce no fim do ano porque muitos pais adotam animais para presentear os filhos. Posteriormente, os soltam nas vias ou devolvem para as instituições.

Para ele, a principal causa da recorrência desses casos é, sobretudo, a falta de amor. “Se o ser humano abandona a própria espécie, por que não faria isso com outras?”, questiona. Verônica Guedes, voluntária da Associação Abrigo Temporário de Animais Necessitados (Aatan), diz que muitos cuidam dos animais enquanto ainda são filhotes. Porém, quando eles crescem e passam a exigir mais atenção, são “descartados”. “É, literalmente, um descarte. A pessoa larga (o animal) de qualquer maneira”, pontua. A Aatan encerrou 2020 com 250 animais abrigados. Durante o ano, o número de adoções foi alto: 400. Segundo a voluntária, lá, eles chegam, principalmente, mal cuidados, com vermes, carrapatos, pulgas, sem castração e a devida vacinação, patas quebradas, feridas pelo corpo, dentre outros problemas. 

Tanto na Spaso, quanto na Aatan, os cães e gatos recebem atendimento veterinário. Na sequência, são encaminhados para lares temporários ou para adoção.

 

Denúncias

 

As denúncias de animais vítimas de maus-tratos devem ser feitas por meio dos canais da central de atendimento da Prefeitura de Sorocaba (www.sorocaba.sp.gov.br/atendimento), telefone 156 e WhatsApp (15) 99129-2426. O atendimento é de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. Se possível, os denunciantes devem enviar fotos e/ou vídeos da situação do animal.

A Spaso recebe pedidos de resgate pelo número (15) 3221-6714.

 

Adoção

 

De acordo com Martinez e Verônica, os filhotes  são os mais procurados. Ambos afirmam haver certo preconceito contra animais mais velhos, especialmente, idosos. Por isso, eles tendem a permanecer mais tempo nos abrigos e, muitas vezes, nem são adotados. Além disso, as devoluções são recorrentes. Segundo os representantes das ONGs, isto ocorre porque cuidar de um animal demanda responsabilidade e gastos. E muitos adotantes alegam não estar preparados para lidar com as exigências. “Eles não entendem que os animais precisam de cuidados, carinho, atenção e que existe um custo para a criação”, comenta Verônica.

Mas este não foi o caso dos cachorros Pedro e Rose, ex-abrigados da Spaso. Após anos vivendo no canil, ambos ganharam um lar definitivo, graças à família da estudante Brenda Rodrigues Pinto. Apaixonada por animais, ela os adotou em novembro do ano passado. Para a escolha, Brenda se baseou nas histórias deles. Pedro tem entre 8 e 10 anos e é considerado idoso. Por conta da idade, já havia sido adotado e devolvido três vezes. Foi, inclusive, maltratado por um dos adotantes. Já Rose, de 3 anos, antes de chegar à associação, morava na rua e foi atropelada por uma motocicleta.

Brenda é contra a compra de animais domésticos, por acreditar ser importante dar a cachorros e gatos abandonados a chance de uma vida melhor. Outra razão  é a crueldade existente nesta indústria. “Sabemos que há muitos cachorros à espera de um lar e de amor. E, às vezes, aguardam anos por alguém que realmente vai amá-los”.

Engenheira Bárbara Maria Brandão Gorgulho com Nairóbi no colo. Crédito da foto: Arquivo Pessoal

A engenheira Bárbara Maria Brandão Gorgulho sempre quis adotar um animal. Em novembro do ano passado realizou o seu sonho, ao dar um lar para a cadela Nairóbi, de 5 anos. Ela escolheu fazê-lo em meio à pandemia de Covid-19 pois passou a trabalhar em home office. Desta forma, teria mais tempo para cuidar e participar de processo de adaptação da cachorra. Bárbara não tem conhecimento sobre as situações vivenciadas por Nairóbi. Porém, conseguiu identificar, em seu comportamento, diversos traumas e medos.

Segundo ela, adotá-la foi a sua melhor decisão de 2020. “Ela mudou a minha vida para o bem”, conta. Para Bárbara, a adoção é benéfica tanto para o tutor, quanto para o animal. Ela pontua que, enquanto eles ganham um lar, os adotantes, por sua vez, recebem um companheiro, disposto a lhes oferecer amor, carinho e atenção. “Eles nos salvam mais do que nós a eles”. 

 

Para adotar, há critérios

 

A adoção de um animal depende de diversos procedimentos. Eles são necessários para garantir a posse responsável. Na Spaso, depois da escolha do animal, o interessado é submetido a uma entrevista. Na sequência, deve entregar diversas documentações, para a comprovação, por exemplo, de suas condições socieconômicas. O próximo passo é a visita à casa do potencial adotante, no intuito de verificar as condições do local. Devido à pandemia do novo coronavírus, esta análise também pode ser feita por meio de videochamada. Se considerada apta, a pessoa assina um contrato de responsabilidade.

Já na Aatan, é necessário estabelecer contato prévio, para manifestar interesse na adoção. Seja na página do Facebook ou no site da instituição, o interessado deve preencher um formulário. Depois de analisar o documento, os voluntários o convocam para uma entrevista pessoal. Assim como na Spaso, o adotante deve apresentar vários documentos e fotos da área onde o animal ficará. No dia da entrega do cachorro ou gato, a equipe também avalia pessoalmente o local.

 

Crime prevê até prisão

 

Os maus-tratos a animais domésticos são considerados crimes. Em Sorocaba, a lei municipal 9.551, de 4 de maio de 2011, estabelece penalidades para quem praticar tais atos. Se houver lesões, o responsável é multado em R$ 3 mil, por animal. Em caso de agressão resultante em morte, a multa é de R$ 4 mil. Para situações sem incidência de lesões ou morte, o valor é de R$ 1 mil. Por fim, quem abandona um animal pode ser multado em R$ 3 mil.

Em setembro de 2020, o presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou lei que aumenta a pena para quem maltratar cães e gatos. Pela legislação anterior, era prevista a detenção de três meses a um ano e multa. Caso a agressão resultasse em morte, a punição era aumentada de um sexto a um terço. De acordo com as novas determinações, quando se tratar de cão ou gato, a condenação sobe para dois a cinco anos de reclusão, multa e proibição da guarda.

 

MP vai investigar crime de maus-tratos

 

O Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) abriu um procedimento na terça-feira (16) para investigar o caso em que um gato teve as patas decepadas a facão, na zona norte de Sorocaba, em 12 de janeiro. O procedimento preparatório de inquérito civil está sob responsabilidade do promotor Jorge Alberto Marum.

O documento cita que “a ação criminosa traz danos aos interesses difusos da coletividade” e pede informações para a Prefeitura de Sorocaba, Polícia Ambiental e Delegacia Seccional. O promotor também pede para que a ONG que realizou o atendimento seja parabenizada pela ação e que dê informações sobre o ocorrido.

“Um crime bárbaro, que deve ser punido exemplarmente. Segundo a Constituição Federal, maus-tratos a animais devem ser penalizados civil (indenização à sociedade), penal (prisão) e administrativamente (multa)”, disse o promotor ao Cruzeiro do Sul, após a abertura do procedimento. “Precisamos que a polícia investigue e identifique o criminoso”, acrescentou.

Marum fez um apelo e pediu para que as pessoas que tenham informações sobre o caso denunciem o autor. “Pedimos que alguém que saiba alguma informação que possa ajudar a identificar esse criminoso, que leve ao conhecimento da polícia.” O promotor também destacou o papel do Poder Público na questão. “É prevenir, fiscalizar, conscientizar e, em caso de infração, aplicar com rigor os três tipos de punição que a Constituição prevê no artigo 225”, diz.

A Secretaria do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Sema) informou, na noite de terça-feira, que levantou todas as informações junto aos protetores que socorreram o gato e abriu um boletim de ocorrência para que o caso seja apurado pela Polícia Civil e o autor seja encontrado e responda pelo crime.

 

O caso

 

O gatinho Valente teve duas patas decepadas e passou por amputação. Crédito da foto: Divulgação / ASPA

Valente, nome dado ao gato agredido e que, aparentemente, era de rua, teve as patas da frente cortadas por um facão ou outro material cortante. A ação criminosa ocorreu na Vila Helena. Segundo moradores da região, o crime teria sido praticado por um homem sob efeitos de entorpecentes.

O animal foi socorrido pela Associação Protetora dos Animais (Aspa) e levado a uma clínica veterinária, onde passou por cirurgia. O felino, que precisou amputar completamente as duas patas, está se recuperando bem e a cicatrização ocorre de forma positiva, segundo informações da ONG.

Todas as despesas veterinárias foram pagas após alguns voluntários organizarem uma “vaquinha”. Depois de recuperado, o animal será castrado, vacinado e, por fim, encaminhado para adoção.

 

Morte de capivara

 

Também na terça-feira, o MP abriu um procedimento para apurar a morte de uma capivara em um condomínio no Alto da Boa Vista, ocorrido na segunda-feira (15). Marum alega na portaria que o grupo de animais, do qual fazia parte a capivara, compõe um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para a transferência regular para um parque ecológico. Um grupo de cinco animais teria sido solto, sendo que um deles morreu.

No procedimento, o MP também pede informação para a Prefeitura de Sorocaba, Polícia Ambiental e Delegacia Seccional. A pessoa que teria soltado os animais foi procurada pela reportagem, mas preferiu não se manifestar sobre a situação, ao menos por enquanto. (Vinícius Camargo e Marcel Scinocca)

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