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Maioria das cidades da região descumpre Lei de Acesso à Informação

26 de Dezembro de 2020 às 21:25

Cidades descumprem Lei de Acesso Em seis cidades da RMS sequer foi possível requisitar a demanda por meio do Sistema Eletrônico de Informações ao Cidadão (e-SIC); site da Prefeitura de Ibiúna tem falha. Crédito da foto: Fábio Rogério (26/12/2020)

 

Apenas um terço das prefeituras das 27 cidades da Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) respondeu dentro do prazo as demandas feitas neste mês por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Sancionada há nove anos, a lei federal nº 12.527 regulamenta o direito constitucional de acesso de todos os cidadãos de pedir informações, dados e documentos públicos aos três poderes da União, dos estados e dos municípios, com regras específicas para documentos considerados sigilosos.

No entanto, a medida que obriga a prestação de contas de órgãos e entidades públicas ainda não é cumprida de forma plena nos municípios da região: das 27 prefeituras da RMS, 18 não atenderam aos pedidos feitos pela reportagem.

Entre os dias 1º e 2 de dezembro o jornal Cruzeiro do Sul fez ou tentou fazer pedidos de informações a todas as 27 cidades da RMS por meio do Sistema Eletrônico de Informações ao Cidadão (e-SIC). O requerimento, endereçado a todas as cidades, solicitou saber quantos funcionários concursados e quantos cargos comissionados de livre provimento estavam lotados na administração municipal em 2020.

Das 27 prefeituras, apenas nove (33%) responderam dentro do prazo legal de 20 dias. São elas: Boituva, Tatuí, Cerquilho, Jumirim, São Roque, Araçoiaba da Serra, São Miguel Arcanjo e Tapiraí e Araçariguama. As prefeituras de Boituva, Tatuí e Tapiraí e São Miguel se mostraram as mais ágeis e forneceram as informações completas logo no dia seguinte à solicitação.

Já Sorocaba está entre as onze cidades que descumpriram a lei, ao não responder a demanda dentro do prazo, juntamente com Alambari, Capela do Alto, Cesário Lange, Itapetininga, Sarapui, Mairinque, Porto Feliz, Piedade, Pilar do Sul e Votorantim.

Em seis cidades da RMS sequer foi possível requisitar a demanda por meio do Sistema Eletrônico de Informações ao Cidadão (e-SIC). Os sites das prefeituras de Tietê e Ibiúna, que exigem que o cidadão crie cadastro, apresentaram falhas na geração de login e senha, e, por isso, o envio do questionário não pode ser concluído. O site da prefeitura de Alumínio constou “erro no servidor” e o site da prefeitura de Iperó, ao clicar no ícone e-SIC, apresentou link inválido. O portal da prefeitura de Salto endereça o internauta à página de acesso à informação do governo federal.

Já o site da Prefeitura de Itu sequer oferece ao cidadão a possibilidade de solicitar informações de maneira online. Por telefone, uma servidora confirmou que o pedidos com ase na lei de acesso à informação o requerente deve se dirigir pessoalmente setor de Protocolo da Prefeitura. A prática contraria o artigo 8º da lei, que obriga os órgãos a viabilizar alternativa de encaminhamento de pedidos de acesso por meio de seus sítios oficiais na internet.

A lei também veda qualquer exigência relativa aos motivos da solicitação de informações de interesse público. No entanto, a Prefeitura de Sorocaba deixou de responder à demanda enviada pela reportagem alegando que o “pedido deve ser formulado com a especificação clara e precisa da informação requerida”. A solicitação foi feita em formulário online disponível no “e-SIC” da página “Portal da Transparência - acesso à informação” do site oficial da Prefeitura de Sorocaba. No entanto, no retorno à demanda, assinado pelo Serviço de Informações ao Cidadão da Ouvidoria-Geral do Município, a prefeitura diz que o referido campo é destinado exclusivamente ao registro de solicitação de serviço público; desabafo, reclamação, denúncia; sugestão ou elogio.

Cidades descumprem Lei de Acesso Luiz Fernando Toledo é pesquisador de transparência pública na Universidade de Oxford. Crédito da foto: Divulgação

 

Co-fundador da Fiquem Sabendo, agência independente de dados públicos especializada na Lei de Acesso à Informação (LAI), e pesquisador na área de Transparência Pública e Jornalismo na Universidade de Oxford, o sorocabano Luiz Fernando Toledo destaca que a LAI é resultado de um longo processo de pressão da sociedade civil e representa o marco legal para a criação de regras e estruturas voltadas à efetivação do direito de acesso às informações públicas, garantido no artigo 5º da Constituição Federal.

No entanto, o pesquisador destaca que boa parte das prefeituras ainda não está preparada para atender a lei devido à falta de regulamentação, por meio de leis e decretos, que define estruturas e condições para que os órgãos possam atender aos cidadãos. Além dos custos financeiros que essa eventual estrutura demanda -- e que tende a afetar os municípios menores -- Toledo comenta que outro obstáculo é o “custo político”. “Uma coisa é vender a bandeira da transparência, mas a transparência efetiva, quando aplicada, inevitavelmente é mais suscetível a crítica”, diz.

Toledo ressalta que existem dois tipos de transparência pública: a ativa, quando o órgão é obrigado a informar determinados dados em seu portal de transparência, como salários dos servidores, orçamento e gastos das secretarias; e a passiva, na qual o órgão, por meio da LAI, fornece informações mediante solicitações e pedidos realizados pela sociedade civil, empresas ou qualquer cidadão.

No final de novembro, uma audiência da pública da Frente Parlamentar Mista da Ética contra a Corrupção da Câmara Federal discutiu propostas de aperfeiçoamento da Lei de Acesso à Informação. Na ocasião, especialistas defendem a exigência de prazos para que todos os órgãos públicos regulamentem a lei internamente para poderem aplicá-la. Além disso, eles ressaltaram a necessidade de fiscalização para evitar a chamada “transparência escondida”, que é quando a informação está na internet, mas é difícil de encontrar.

A gerente de projetos da organização não governamental Transparência Brasil, Marina Atoji, disse que a lei não trouxe prazos para a regulamentação local e que o resultado disso é que 80% dos municípios ainda não detalharam itens como o tratamento de informações sigilosas ou quais são os procedimentos de recurso contra negativas de acesso. “Principalmente as assembleias legislativas e câmaras municipais não respondem a pedidos de informação. Esses legislativos têm formas de receber os pedidos, mas ou eles vão para um limbo ou são simplesmente ignorados. E a lei é descumprida na cara dura”, disse Marina à Agência Câmara de Notícias.

Toledo acrescenta que outro entrave se deve à baixa demanda, o que faz com que os órgãos públicos não invistam na melhoria do atendimento das informações públicas. Ele destaca que a LAI uma das ferramentas mais importantes de empoderar o cidadão e pode ser usada para, por exemplo, monitorar a frequência dos profissionais do posto de saúde do bairro ou em que itens e a que preço, especificamente, estão sendo comprados materiais escolares. “A democracia é mais forte quando o cidadão consegue questionar e entender as decisões do Estado”, completa. (Felipe Shikama)

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