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Após um ano, pandemia muda perfil de contaminados

03 de Abril de 2021 às 00:01
Ana Claudia Martins [email protected]

Após um ano, pandemia muda perfil de contaminados Há um ano a cidade convive com as várias tentativas de isolamento social. Crédito da foto: Fábio Rogério

Assim como no restante do Brasil, em Sorocaba a pandemia da Covid-19 também apresenta características bastante diferentes das de um ano atrás. Sobretudo, no que diz respeito à faixa etária das pessoas contaminadas, mas também em relação ao próprio vírus, que sofreu mutações e apresenta novas variantes, que são ainda mais contagiosas.

A diferença é claramente percebida nos números oficiais da Prefeitura de Sorocaba se comparados a março de 2020. A cidade teve o primeiro caso confirmado da Covid-19 no dia 24 de março do ano passado, mesma data do início da quarentena em todo o Estado. Quatro dias depois, Sorocaba confirmou a primeira morte pela doença. Já no fim do mês (dia 31), a cidade continuava com um óbito, mas o número de casos confirmados aumentou para 11.

Atualmente, em março de 2021, o cenário da pandemia na cidade é mais crítico. Obviamente que, com o passar dos meses, seriam contabilizados mais casos e mortes pela Covid-19, não somente em Sorocaba, como em todo o País. Porém, os números subiram de forma bastante elevada em março deste ano.

Para os infectologistas, um ano após a pandemia no Brasil, a explicação para o expressivo aumento de casos e de mortes passa pela maior exposição e pelas mutações sofridas pelo vírus.

Em Sorocaba, durante a semana, a própria Prefeitura de Sorocaba confirmou a circulação de um total de cinco variantes na cidade, desde o início da pandemia. Entre elas, uma das mais contagiosas, que é a chamada variante de Manaus (P.1), que infecta pessoas mais jovens e até crianças. Além disso, na quarta-feira (31), o governo estadual confirmou uma sexta variante do coronavírus na cidade, parecida com a da África do Sul.

Para o secretário da Saúde de Sorocaba, médico Vinícius Rodrigues, a detecção da variante justifica a “mudança abrupta do cenário epidemiológico” nos últimos sete dias. Nesse intervalo, segundo ele, houve aumento de 90% nos casos da doença. “Precisamos da ajuda da população para conter a disseminação do vírus. Vamos continuar abrindo leitos, mas é uma variante muito transmissível que causou tudo aquilo em Manaus e hoje circula na Região Metropolitana de Sorocaba (RMS).”

Os números do mês passado de casos e óbitos por Covid-19 na cidade não deixam dúvidas de que o perfil da pandemia mudou em Sorocaba. Conforme os dados oficiais da prefeitura, na última terça-feira (30) a cidade chegou ao total de 43.218 casos e 1.086 óbitos confirmados por Covid-19.

Analisando os números somente do início da pandemia até o final de 2020, ou seja, de março a 31 de dezembro do ano passado, os números oficiais mostram que, no total a cidade havia registrado 563 mortes e 26.320 casos confirmados por Covid-19.

Já os números de 1º de janeiro de 2021 até 30 de março deste ano, mostram que a doença evoluiu bastante e infectou praticamente a mesma quantidade de pessoas em três meses. Foram 16.898 casos e 523 óbitos confirmados por Covid-19 nesse período. Ou seja: em nove meses de 2020 morreram na cidade 563 pessoas por Covid-19 e outras 523 apenas nos três primeiros meses de 2021.

Além disso, os números de 2021 sobre os óbitos mostram que adultos jovens representam aproximadamente 30% das mortes pela doença -- sem falar nos óbitos de crianças --, que afetou até pessoas sem comorbidades.

Filhos lamentam a perda dos pais

Andressa Bueno Aguirra Martins, de 35 anos, de Votorantim, perdeu o pai de 65 anos pela doença. Ele foi o primeiro morador da cidade a ter a morte confirmada pelo coronavírus, no início de abril de 2020.

Já Thiago Morales Tomasi, de 38 anos, de Sorocaba, perdeu a mãe, de 67 anos, no último dia 12 deste mês. Tanto Andressa quanto Thiago afirmam que a Covid-19 é uma triste realidade e que as pessoas precisam se cuidar mais e cumprir as medidas de isolamento a fim de evitar todas as possibilidades de contágio.

Após um ano, pandemia muda perfil de contaminados Andressa Martins e a família: a dor de não poder se despedir do pai em velório. Crédito da foto: Arquivo Pessoal

Andressa conta que o pai, José Geraldo Campos Aguirra, era um homem forte, alegre e que gostava de viajar. “A gente acredita que ele se contaminou em março do ano passado, durante uma viagem de navio. Logo após a viagem ele começou a passar mal, acabou sendo hospitalizado e veio a falecer”, conta a filha. Segundo ela, inicialmente, como a pandemia ainda era novidade do Brasil, a suspeita é que o pai dela estaria com dengue.

“O resultado saiu somente após a morte dele, mas como havia a suspeita, já foi aquele enterro praticamente sem a presença dos familiares. “A gente não pôde fazer um velório e nem fazer o enterro do meu pai como as pessoas estavam acostumadas. Depois da morte dele, ficou aquele vazio. Parecia que ele tinha ido viajar e não voltou mais, já que sem o ritual do velório e do enterro, fica ainda mais difícil a gente passar pelo processo do luto”, conta a filha.

Após um ano, pandemia muda perfil de contaminados Thiago perdeu a mãe, Fátima, que teve de ser internada em outra cidade. Crédito da foto: Arquivo Pessoal

Thiago também conta que a mãe, Fátima Valéria Morales Tomasi, era uma pessoa alegre, ativa e que estava se cuidando, evitando sair de casa. “Teve um dia em que ela saiu com duas amigas e depois ficou sabendo que uma delas teve contato com uma nora, que confirmou positivo para Covid-19. Alguns dias depois, minha mãe começou a ter os primeiros sintomas. Começou a fazer o tratamento em casa, mas piorou e precisou de internação hospitalar”, afirma.

Ele ainda conta que a mãe precisou de leito de UTI, mas só conseguiu vaga em um hospital de Jundiaí, onde ela faleceu. “Além de tudo, ela morreu em outra cidade. Tivemos que fazer o traslado do corpo e enterrar minha mãe sem velório. Foi bastante difícil. No começo, no ano passado, cheguei a duvidar da doença. Hoje em dia não penso mais assim e digo que é preciso se cuidar, pois também tive. Só que fiz o tratamento em casa e me recuperei”, revela.

Quem se curou, sente-se ‘vencedor’

A pandemia ainda está longe de ser vencida, mas quem se infectou e se curou, mesmo sabendo da possibilidade de reinfecção, sente que venceu uma etapa importante. É o caso da técnica em administração de empresas Marta Mayara dos Santos Alves, de 33 anos. Ela conta como se sentiu ao perceber a presença do vírus. “Senti muito medo quando me dei conta que estava com o vírus. Me recordo que havia feito uma carne de panela, bem temperada e com uma salada, mas, quando coloquei a primeira garfada não senti gosto de nada. Minha reação? Chorei enquanto me alimentava, porque ali tinha certeza que havia sido infectada”, conta.

Após um ano, pandemia muda perfil de contaminados Marta agradece por não precisar de internação. Crédito da foto: Arquivo Pessoal

“Hoje, ao ver tantos entes queridos que estão sofrendo com essa doença e, infelizmente, aqueles que perdemos, me sinto privilegiada por ter conseguido vencer a Covid 19, com a benção divina, sem precisar ser internada. Sabemos que os profissionais de saúde tem dado seu melhor, que estão exaustivamente buscando ajudar a todos”, comenta Marta.

Para ela, manter o equilíbrio psicológico ajudou a evitar um possível agravamento da doença. “Com certeza fez total diferença. Desde que a pandemia iniciou, em nossa comunidade espiritual (Testemunhas de Jeová), mantivemos nossas reuniões e atividades de pregação de forma virtual e nossa conexão se intensificou. Fomos incentivados a manter a mente de forma racional, mas positiva, buscando fazer o que estava ao nosso alcance. Naquele momento, era preciso seguir as recomendações da Organização Mundial da Saúde e tomar todas as medidas de proteção que eram ensinadas”, lembra. “As conexões de amizade, com a família foram intensificadas”, acrescenta.

Alívio

Após um ano, pandemia muda perfil de contaminados Thaila teve apenas sintomas leves. Crédito da foto: Arquivo Pessoal

“O período de isolamento foi bem difícil, porque trabalho com o público e ficar sem conversar e sem sair de casa mexeu muito com o meu lado psicológico”, conta Thaila Sandrine de Oliveira, atendente de farmácia de 25 anos. “Foram dias tristes sem ver meus sobrinhos e estar juntos com eles, dias de indisposição”, diz. Thaila também perdeu um primo na pandemia.

“Agora me sinto bem melhor, não tive sintomas tão graves, foram leves, o que me deixou mais aliviada. Só de saber que não precisaria ser internada, foi muito bom. Sei como está o sistema de saúde neste momento e me tratar em casa, com tranquilidade, foi uma obra de Deus”, diz agradecida. (Ana Cláudia Martins e Marcel Scinocca)

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