A importância de escolher um bom vice
Há quem diga que o cargo de vice é decorativo. Há também quem afirme que o cargo é meramente de expectativa. Via de regra, a história, nacional, estadual e local, tem mostrado que o cargo de vice tem, sim, sua relevância e importância, mas na hora certa e necessária. E essa definição é tão real que vice decorativo como Michel Temer (MDB) virou presidente efetivo, e a típica “vice de expectativa” como Jaqueline Coutinho (PSL) se tornou prefeita permanente.
João Francisco dos Santos, presidente do Observatório Social do Brasil, em Sorocaba, lembra que a figura de vice, em alguns casos, tem pouco destaque na campanha eleitoral. “Muitas vezes fica escondido de propósito, para não atrapalhar. Não é questionado em debate, pouco aparece”, diz. “Acaba sendo não avaliado corretamente, como se fosse uma figura de menor importância no processo eleitoral. Mas, de repente, lá está ele, ocupando o cargo de titular”, alerta.
Conforme Santos, daí a importância de uma análise aprofundada do candidato a vice. “Tem que ter as mesmas qualidades do titular que foi escolhido, sob pena de arrependimento ao sermos governados por pessoas que não queremos”, complementa.
O ex-prefeito de Sorocaba por dois mandatos, Antonio Carlos Pannunzio (PSDB), lembra que em alguns países não existe a necessidade ou a presença do vice. “Hoje, mesmo em uma viagem internacional é possível continuar ativamente no governo. Somente uma viagem não produz a necessidade da transmissão do cargo”, diz Pannunzio. Mas ele alerta. Segundo o ex-prefeito, é bom pensar no vice, porque no caso de uma cirurgia, ou na pior das hipóteses, da morte, ou em uma eventual cassação, “o governo e a administração não podem parar”.
“Entendo que quando escolhi a Dra. Edith, sabia que ela teria condições e conhecimento para assumir a administração”, fala sobre sua vice de 2013 a 2016, Edith Maria Di Giorgi. “Hoje em dia, os partidos estão pensando no vice só como mais votos. A escolha desse vice é tão importante quanto a escolha do candidato principal”, termina.
Na história recente, José Theodoro Mendes deixou a Prefeitura de Sorocaba, em 4 de maio de 1982, para disputar a eleição como deputado federal. Claudio Grosso, que era o vice, assumiu como prefeito da cidade.
E não dá para falar sobre a questão de vice em Sorocaba sem falar da emblemática e recente situação envolvendo José Crespo (Democratas) e da então vice-prefeita da cidade, Jaqueline Coutinho, à época eleita pelo PTB. Foram dois processos de cassação, sendo um finalizado em agosto de 2017, e o segundo, encerrado em 2019, também em agosto.
A situação de Sorocaba não é única quando se trata da importância do cargo de vice na região. Em se tratando de situações mais contemporâneas, há a cidade de Araçariguama. Com o afastamento do cargo da então prefeita Lili Aymar (eleita pelo PV), por determinação da Justiça, assumiu o vice-prefeito, João Batista Damy Correa Júnior (PL). Outro caso na região ocorreu na cidade de Boituva, no início de 2019. Fernando Lopes da Silva (PSDB) foi cassado e a vice-prefeita Maria Nasaré da Guia Azevedo (PRB) assumiu o mandato até o retorno de Silva.
Há ainda os casos envolvendo as candidaturas, onde os vices ganharam papel de protagonistas e venceram as eleições. Na Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) o fato mais recente ocorreu em Itapetininga. Em 2016, Simone Marquetto foi eleita a primeira mulher prefeita da cidade. Entretanto, o candidato “original” era Ércio Giriboni, cuja candidatura foi cassada após uma representação de outro partido.
Um pouco mais atrás, Sorocaba teve situação parecida. Em 2004, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE) cassou, após representação, o registro da candidatura de Luiz Leite (PSDB) à Prefeitura de Sorocaba. Vitor Lippi, do mesmo partido, assumiu a cabeça da chapa, sendo eleito não só em 2004, mas também no pleito de 2008.
Como os atuais candidatos escolheram os seus vices
Os candidatos a chefiar a Prefeitura de Sorocaba foram convidados pela reportagem para destacar a importância do vice na composição da chapa e do possível governo futuro. Todos as campanhas receberam a mesma pergunta e tiveram espaço parecido para tratar da questão. O ordem de publicação está como na divulgação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“Dentro do projeto Solidariedade para os próximos quatro anos para Executivo, o vice-prefeito tem que estar muito bem sintonizados com prefeito, para que possamos atender os anseios da população sorocabana. Além de poder exercer funções dentro da administração municipal, o vice-prefeito é o substituto imediato do prefeito municipal em caso de ausências”, afirmou Carlos Péper (Solidariedade) sobre o vice Leonildo Nicolete, do mesmo partido.
“O vice do Dr. Leandro (Democratas) é o empresário e publicitário Fernando Baddini. Dr Leandro confia em Baddini devido aos muitos anos de relacionamento. O publicitário tem ficha limpa, é novo na política (participa do pleito pela primeira vez), tem experiência e vivência no meio corporativo e está alinhado com os valores de renovação da política em Sorocaba”, comenta Leandro Fonseca, do Democratas sobre Fernando Baddini, do mesmo partido.
A candidata pelo PSL, Jaqueline Coutinho, terá como vice Roberto Freitas (PSB). “Para o PSL a escolha do vice-prefeito fez-se pelo trabalho de liderança com parceria, com companheirismo da chapa e engajamento na gestão pública. Roberto Freitas revelou-se um excelente gestor enquanto secretário de Desenvolvimento Econômico e presidente do PTS, onde conquistou importantes parcerias com empresas que contribuem para o crescimento de Sorocaba”, lembra.
Maria Lúcia Amary (PSDB) também falou do que considera as qualidades de Anselmo Neto (Podemos), seu vice. “A escolha pelo Anselmo Neto para ser o meu candidato a vice-prefeito é pelo seu caráter, determinação, história política e ficha limpa. Ter o Anselmo Neto na chapa é ter o compromisso redobrado com a ética na vida pública. Um homem cristão, de palavra, que cumprirá exclusivamente o papel de vice-prefeito, sempre pensando no bem da cidade de Sorocaba.”
Para o Avante, com Flaviano de Lima, a escolha foi Edson Santos. “Nosso vice escolhido é o autônomo do setor do comércio e também bacharel em Direito, o sr. Edson Rubens dos Santos. Entendemos a figura do vice-prefeito como alguém atuante nas funções políticas e, dentro do nosso objetivo, o vice-prefeito escolhido reúne as qualidades técnicas, experiência e sensibilidade política, atendendo a nossas expectativas de que não será só um cargo de mera formalidade”, afirma nota do partido.
“O meu vice-prefeito Paulo Estausia terá papel fundamental, pois representa a união nossa com o Partido dos Trabalhadores. Licenciado do cargo de presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte, Paulo é evangélico e tricampeão sul-americano de caratê. Vai nos ajudar a construir um projeto de saúde ligado ao esporte e transformar o transporte da cidade”, afirmou Raul Marcelo (Psol), sobre seu vice, Paulo Estausia (PT).
Renan Santos, candidato pelo PDT, falou sobre Rosana Batista, candidata a vice pelo mesmo partido. “Dra. Rosana é advogada, especialista em direito público, atuou em importantes comissões da OAB, como de Direitos Humanos e Cidadania. Com sequelas da poliomielite, ela atua em defesa das pessoas com deficiência e simboliza a equidade de gênero. Representante certeira das mulheres, é arrimo de família, começou a trabalhar cedo e sempre lutou por causas sociais.”
Rodrigo Manga (Republicanos) falou sobre a missão de Fernando da Costa Neto, do PSD. “Tem um trabalho reconhecido como dirigente do Esporte Clube São Bento. Como empresário, é ex-presidente da rede de supermercados Bom Lugar. Sua principal missão como vice será contribuir para o desenvolvimento econômico da cidade e a qualificação e geração de empregos. Uma de suas principais atuações será a desburocratização da máquina pública, para a simplificação da abertura de novas empresas”, afirma.
Participação na história do Brasil
A figura do vice mostrou sua importância e relevância também ao longo da história da República brasileira, Para se ter ideia, o primeiro vice-presidente da República, Floriano Peixoto, foi também o primeiro vice a se tornar presidente. Isso ocorreu porque Marechal Deodoro da Fonseca renunciou em 23 de novembro de 1891.
Ex-presidente José Sarney. Crédito da foto: Antonio Cruz / Agência Brasil
Ao longo do período chamado de 1ª República, ainda houve outros casos de vices que se tornaram presidentes. Afonso Pena, por exemplo, era vice de Rodrigues Alves, que o antecedeu. Pena foi presidente entre 15 de novembro de 1906 até 14 de junho de 1909. Quando Pena morreu, vem novamente a figura do vice a assumir a presidência da República. Esse papel foi desempenhado por Nilo Peçanha. Curioso é que antes de Pena virar vice, o cargo era de Silviano Brandão, que morreu antes de ser empossado.
Hermes da Fonseca foi presidente da República entre 1910 e 1914. Após cumprir integralmente seu mandato, o vice, Venceslau Brás, se tornou presidente. O sucessor de Brás foi Rodrigues Alves, que morreu antes de tomar posse. Delfim Moreira, então vice, se tornou presidente em 1918. E não foi só isso. Ele se tornou vice, novamente, durante uma parte do governo de Epitácio Pessoa.
Ex-presidente Michel Temer. Crédito da foto: Ed Ferreira / Arquivo JCS
E a história segue: após a morte de Getúlio Vargas, assumiu o vice, Café Filho, em 24 de agosto de 1954. Com problemas de saúde, Artur Costa e Silva se afastou da Presidência da República, mas dessa vez a regra foi quebrada. Pedro Aleixo, seu vice, não assumiu. Em seu lugar governou o País uma junta militar formada por representantes do Exército, Marinha e Aeronáutica. Em 1985, um novo presidente da República morre sem poder tomar posse. Nesse caso, Tancredo Neves. Assumiu o vice José Sarney, que permaneceu no cargo até 1989.
Em 1990, assume o presidente Fernando Collor de Mello, o primeiro eleito pelo voto direto após o regime militar. Em 29 de dezembro de 1992, Collor renuncia. Assume Itamar Franco. A história de vices que se efetivaram como presidente, por enquanto, termina em 2016. Em 31 de agosto, Michel Temer assume como presidente. Entretanto, ele já ocupava o cargo como interino desse a abertura do processo de cassação de Dilma Rousseff, em 12 de maio de 2016.
Governo de São Paulo
Entre tantas histórias de governadores do Estado de São Paulo, é possível que a mais marcante envolva o então governador Geraldo Alckmin. Com a morte de Mário Covas, então governador pelo PSDB, em 2001, Alckmin virou o titular do Palácio dos Bandeirantes.
Porém, antes de Alckmin há ao menos outros três casos de vices que acabaram sendo efetivados como governadores. Isso, sem contar os três casos de vice-governadores que assumiram o mandato para que o então detentor do cargo pudesse ser candidato a presidente da República. Na lista, Cláudio Lembo, que assumiu em 2006 após a renúncia de Geraldo Alckmin; Alberto Goldman, que assumiu o governo do Estado após renúncia de José Serra, em 2010; por fim, Márcio França, que assumiu o governo paulista após a segunda renúncia de Geraldo Alckmin, em 2018. (Marcel Scinocca)
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