Presença: O médico poeta
Crédito da foto: Pedro Negrão / Arquivo JCS
Há 70 anos chegava em Sorocaba o médico e escritor Edgar Steffen. Natural de Indaiatuba, ele veio para estudar na primeira turma da Faculdade de Medicina de Sorocaba, em 1956. Aqui construiu sua carreira como médico pediatra, sempre focado no carinho e no amor pelos seus pequenos pacientes. Doutor Edgar é casado com Adélia há mais de 60 anos, têm quatro filhos, e é um poeta. Já lançou três livros, e desde 2003 é um dos colunistas do jornal Cruzeiro do Sul mais lidos e respeitados. Conheça a história do médico poeta, Edgard Steffen o nosso personagem da semana.
Como foi sua infância?
Nasci em Indaiatuba (SP) aos 23 janeiro de 1931. Caçula entre onze filhos de Christiano Steffen (neto de alemães e suíços) e Augusta Maria Magnusson (filha de sueco com alemã), três irmãos e sete irmãs. Tive uma infância feliz. Embora minha mãe trabalhasse (era agente dos Correios) nunca me faltou gente carinhosa que de mim cuidasse. Dos 2 aos 7 anos, morei no Capão Grande, fazenda de meus tios Carlos Oscar e Marta, onde meu pai trabalhava. Cresci num ambiente de liberdade mas com disciplina. Aprendi muito sobre plantas e animais e lides da roça. Comer frutas apanhadas no pé, pescar no ribeirão, amassar barro com pés descalços, caçar o permitido e até realizar pequenos serviços como a cata de gravetos para o fogão, coleta de ovos e alimentar o plantel de galinhas caipiras. Talvez essa vida tenha me condicionado a almejar ser médico de roça.
Sempre quis ser médico?
Não. Em 1948 completei o Curso Normal. Habilitava-me à carreira de professor primário. Queria galgar alguma profissão que propiciasse vida confortável para a família que eu viesse a constituir. Pensei em agronomia, engenharia e até odontologia. Medicina estava entre as opções, mas havia o impeditivo de ser curso longo e exigir dedicação exclusiva. Irmão Lauro, bancário, transferido para cá, no mesmo ano em que se criou a Faculdade de Medicina, tornou possível optar pela Medicina. Sorocaba era minha Indaiatuba em ponto grande.
O senhor fez parte da primeira turma da Faculdade de Medicina de Sorocaba, como foi o período?
Cheguei a Sorocaba há exatamente 70 anos. No cair da noite de 16 de agosto de 1950. Por coincidência também o 16 de agosto é a data gravada no cartão de desembarque de Hans Steffen, meu bisavô, o primeiro Steffen de nossa linhagem no Brasil. Veio do Holstein, trazido pelo veleiro Johanna Elizabeth, do porto de Hamburgo para o de Santos (1856). Sou um dos 51 que passaram no vestibular e um dos 39 que se formaram na 1ª turma da Faculdade de Medicina de Sorocaba. O curso de medicina, no Santa Lucinda como Hospital escola, foi muito bom. Os docentes eram de 1ª linha, postulantes às cátedras da USP e Paulista de Medicina. Nos conheciam pelo nome e estruturaram muito bem suas respectivas cátedras. Tudo o que usávamos (peças de anatomia, lâminas, microscópios, aparelhos) era novo, de primeira mão.
E sua esposa Adélia, como o senhor conheceu?
Conheci Adélia Hortência, notando-a entre as belas sorocabanas que frequentavam os clubes da praça Cel. Fernando Prestes. Somente fui tirá-la a dançar e conhecê-la no Baile do Calouro de 1952 (2ª turma). Namoramos e noivamos por cinco anos e, após um ano de trabalho como médico generalista no município de Piedade, casamo-nos. Adélia formou-se em pedagogia também na 1ª turma da Faculdade de Filosofia (hoje Uniso).
O senhor é um escritor nato. De onde veio a sua paixão pela escrita e literatura?
Não sou escritor nato. Mas vivi em meio a gente que gostava de ler. Em minha casa, além da Bíblia e das revistas da Escola Dominical, havia sempre os jornais e livros circulando entre os irmãos. Nas casas de tios onde vivi, em Salto e Campinas, bons livros nunca faltaram. Professora de português (Maria Aparecida Pinho) do Regente Feijó em Itu, ensinou-me a gostar de Literatura Brasileira. Meu autor predileto foi e continua sendo Érico Veríssimo. No colegial, a professora Maria Aparecida premiou-me por um trabalho sobre Augusto dos Anjos. Inscreveu-me num concurso estadual promovido pela “A Lareira”; meu conto de Natal -- baseado em personagens que conheci -- deu-me o 2º lugar. A partir do vestibular até a formatura, concentrei-me apenas na Medicina. Aposentado (na compulsória) enchi meus dias produzindo crônicas e contos. Passei a colaborar com O jornal Cruzeiro do Sul, semanalmente. Produzi três livros “O Anjinho dos Pés Tortos”, “O Picolé Milagroso” e “Os Steffen”. Este último reunindo história e estórias da minha família. Também produzi em vídeo “Eu e a Tísica” sobre a sintomatologia da tuberculose na poesia de Augusto dos Anjos.
Enfrentamos uma pandemia, em todos estes anos de sua vida como medico, imaginava que iríamos passar por isto?
Quanto à pandemia de Covid19 não foi minha primeira experiência com epidemias. Mas confesso-me atordoado com a evolução da doença e preocupado com o que poderá acontecer. A cada 10 anos alguma doença infectocontagiosa assola nosso planeta. Meu primeiro ano de exercício da medicina, coincidiu com a pandemia Gripe Asiática (1957). Trabalhei muito, porque exercia medicina geral na região de Piedade/Tapiraí. O trabalho em postos de Puericultura de 1957 até 1970 punha-me em contato direto com varíola, difteria, coqueluche, sarampo, paralisia infantil, e outras tantas doenças “infantis” porque o acervo de vacinas e baixas coberturas não impediam sua propagação. A medicina evoluiu muito a vacina para o Covid-19 em breve ja estará disponível para todos.
O senhor está com 89 anos, qual a receita da longevidade?
Vida normal. Entre as besteiras das quais me arrependo, o tabagismo dos 16 aos 33 anos. Não houvesse parado, seguramente minhas artérias estariam muito endurecidas (se o câncer de pulmão não me levasse antes). Descendo de longevos. Meus antepassados, europeus do norte, morreram com mais de 70 anos, numa época em que a esperança de vida não chegava aos 40. Minha mãe faleceu quase centenária e as duas últimas irmã que perdi alcançaram mais de 90 anos. Sou otimista. Se levar em conta o Eclesiastes tenho “que correr atrás do vento” com minhas vaidades. Ecumênico. Sou evangélico por formação e convicção. Creio na perfeição das leis do Criador de Tudo e na salvação pela graça sacrificial de Jesus Cristo. Tenho orgulho da família Steffen da qual descendo e da família Steffen que iniciei com minha companheira Adélia. Agradeço à Divina Providência pelos nossos quatro filhos, oito netos e dois bisnetos. Tenho orgulho de ser médico. Embora não mais exerça a profissão, mantenho ativo meu CRM e participo da Diretoria da Sociedade Médica de Sorocaba. Entre minhas vaidades: ser rotariano, ter o Título de Cidadão Sorocabano (por indicação do vereador João Donizete Silvestre), ter servido ao governo Paulo Mendes como Secretário da Saúde, ter recebido a medalha Luiz Matheus Maylaski do Gabinete de Leitura Sorocabano, ser membro da Academia Sorocabana de Letras, ocupar há 17 anos o honroso espaço como colunista do jornal Cruzeiro do Sul.
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