Planos de saúde no olho do furacão
Desde sempre, o Brasil nunca teve um sistema de saúde público capaz de dar conta e atender com qualidade a população brasileira. O déficit na saúde pública não é novidade para ninguém. Trata-se de algo que teve início em 1500 e arrasta-se por séculos. Os motivos são muitos, claro!
O principal é a malversação de verbas de governos e políticos que comandaram e comandam o país. Além disso, temos o inchaço da máquina pública, os desvios, a falta de priorização do trinômio saúde, educação e segurança, e outros problemas.
Diante desse quadro histórico, ter um plano de saúde privado tornou-se quase que uma necessidade para uma parcela da população — a parte felizarda que ainda tinha ou tem condições de pagar por isso. Mas o buraco sócio-econômico foi ficando tão profundo que, a cada década, menos pessoas conseguem arcar com esse “luxo”, que muitas vezes significa a diferença entre a vida e a morte.
Afinal, na grande maioria dos casos, existe um abismo entre o sistema de saúde privado e o público no Brasil. O Sistema Único de Saúde (SUS) surgiu para tentar melhorar esse cenário, e felizmente conseguiu avanços. Ainda assim, muito distantes dos necessários ou desejáveis para dar saúde de qualidade para toda a população, de forma indiscriminada.
Pois bem, dentro desse cenário, chegou a pandemia do novo coronavírus no início de 2020. Com ela, o que já era difícil tornou-se ainda mais complexo. Em poucos meses, o sistema de saúde, tanto público como privado, passou a viver quase que permanentemente à beira de um colapso. Simultaneamente, com as necessárias e seguidas medidas de restrição, houve uma significativa redução da atividade econômica, causando desemprego e diminuição de renda.
Muitas empresas passaram a enfrentar enormes dificuldades, outras tantas tiveram de fechar. No mercado de planos de saúde, aquele leito garantido com atendimento diferenciado ao segurado foi para o espaço. A incerteza tomou conta de tudo no segmento.
E ainda surgiram alguns agravantes. Devido a esse cenário de pandemia, no ano passado, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) já havia suspendido os reajustes dos planos. Porém, com o término da medida, em dezembro, as operadoras passaram a efetuar a recomposição dos valores não cobrados em 2020. Ou seja, os valores explodiram, tornando-se em muitos casos impraticáveis.
Em 2021, com a continuidade da pandemia, as dificuldades continuam. Em fevereiro, a Defensoria Pública da União (DPU) recomendou à ANS a suspensão de todos os reajustes também neste ano, diante do quadro de deterioração econômica. No ofício, o órgão afirmou que os “reajustes aparentemente não refletem a necessidade de manter a sustentabilidade econômica das operadoras de planos de saúde”.
A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom), vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, também propôs que a ANS volte a suspender o reajuste de planos de saúde, em razão do agravamento da pandemia. A sugestão foi apresentada à Câmara de Saúde Suplementar, colegiado composto por representantes do governo, dos consumidores e de empresas.
O objetivo é prevenir tratamento discriminatório entre os usuários alvo de aumento e evitar que reajustes díspares possam onerar demasiadamente os consumidores que não possuem poder de negociação.
Na semana passada, o Procon-SP entrou com uma ação civil pública pedindo que a ANS seja obrigada a reverter reajustes abusivos em planos de saúde coletivos.
O órgão de defesa do consumidor disse ter recebido mais de 900 reclamações em janeiro, algumas sobre reajustes que chegaram a 140%, 160% e 228%. No meio disso, enquanto aguarda o desenrolar de toda essa situação, está a população. Acuada pela pandemia de um lado e as contas de outro, mas com a esperança de que dias melhores virão mais à frente.