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Vítimas paralelas da pandemia

19 de Março de 2021 às 00:01

Não bastassem as mortes, o sofrimento e todas as dificuldades impostas às pessoas pelo novo coronavírus, a pandemia também tem contribuído decisivamente para a piora de diversas situações.

Uma delas é o aumento dos casos de violência doméstica, por exemplo. E isso tem sido registrado em todo o mundo. Por conta do isolamento social e do confinamento domiciliar, infelizmente, agressor e vítima tiveram de ficar mais tempo sob o mesmo teto.

A instabilidade econômica, a moradia insegura, a violência e a falta de creches e apoio social aumentam o risco de violência doméstica. Isso foi potencializado com a pandemia.

E quando falamos em violência doméstica, os maiores alvos são as mulheres. Em 2020, segundo o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, foram registradas 105.821 denúncias de violência contra a mulher, somente nas plataformas do Ligue 180 e do Disque 100.

Apenas em Sorocaba, os casos registrados na Delegacia da Defesa da Mulher (DDM) tiveram aumento de 15% nos dois primeiros meses de 2021, em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo dados da DDM, de janeiro até início de março foram registrados 800 boletins de ocorrência de violência doméstica na cidade.

O total representa 15% a mais em relação ao mesmo período de 2020. As ocorrências deste ano foram registradas na DDM, também em outras unidades policiais e pela delegacia eletrônica.

Além disso, até o início de março, a Justiça já havia expedido cerca de 300 medidas protetivas solicitadas pelas mulheres, sendo que 296 foram aceitas.

Segundo Veraly de Fátima Bramante Ferraz, titular da DDM de Sorocaba, inicialmente a pandemia contribuiu para diminuir os casos de violência doméstica em Sorocaba, mas, conforme os meses foram passando, e com as pessoas mais tempo em casa, as ocorrências subiram.

É até fácil entender as causas. Primeiramente, existe o estresse permanente de ter de lidar com uma doença traiçoeira e mortal por um longo período de tempo e sem previsão para acabar.

Para piorar, boa parte da população ainda enfrenta outras enormes adversidades que podem facilmente levar a um maior desequilíbrio emocional.

Uma delas é a questão econômica. Com a crise decorrente da pandemia, o número de desempregados, que já era alto, cresceu. O comércio e os profissionais liberais sofrem com as restrições de circulação e lutam para sobreviver.

Um outro fato curioso sobre esse tema foi publicado em um artigo na plataforma New England. Como boa parte das pessoas que sofrem violência doméstica não procura auxílio, muitas vezes essas situações são identificadas e as vítimas, ajudadas, somente quando estão em clínicas, ambulatórios e hospitais.

São locais seguros para os pacientes revelarem o abuso, seja diante do exame físico ou a partir do comportamento da paciente. A avaliação em um ambiente clínico ou hospitalar permite a intervenção imediata, incluindo o envolvimento de assistentes sociais, planejamento de segurança e uma revisão dos serviços disponíveis para as vítimas e seus dependentes.

Mas com o advento da pandemia essa gama de oportunidades foi perdida. Diversas clínicas, consultórios e ambulatórios cancelaram consultas e reprogramaram as visitas não urgentes, e muitas mudaram para a telemedicina, tornando essa triagem para violência doméstica ainda mais difícil.

Não apenas os pacientes podem viver em áreas sem conexão com rede, como também os abusadores podem vigiar mais as vítimas, impedindo que elas revelem o aumento do abuso em casa.

E por falar em serviços para as vítimas, é importante lembrar que, apesar do aumento dos casos, Sorocaba possui uma ampla rede de atendimento e apoio às mulheres vítimas de violência doméstica.

Além da DDM, que funciona 24 horas por dia, a cidade possui o Centro de Referência da Mulher (Cerem), vinculado à Secretaria de Cidadania (Secid), e o Centro de Integração da Mulher (CIM), que é um abrigo para as vítimas que buscam esse apoio.

A cidade também possui a Vara da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, no Fórum de Sorocaba, e ainda o aplicativo Protege Mulher.

Direcionado a mulheres que já estão cadastradas e que possuem medidas protetivas contra o agressor, o aplicativo funciona como uma espécie de proteção para as vítimas, que podem acionar o Protege Mulher em situação de potencial ameaça.

Quando o aplicativo é acionado, imediatamente, um aviso com a exata localização da vítima é enviado ao Centro de Operações e Inteligência (COI) da Guarda Civil Municipal (GCM). Por fim, qualquer denúncia também pode ser feita pelo 190 da Polícia Militar, além dos Disque 100 ou 180.

Lembrando que ainda estamos no mês em que é comemorado o Dia Internacional da Mulher. Os dados são uma triste realidade e chamam a atenção para um problema recorrente e que precisa sempre estar em nosso radar.