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Retrocesso

24 de Agosto de 2018 às 08:20

Sorocaba deverá perder nos próximos dias os três últimos ecopontos existentes na cidade, um projeto que trouxe algum avanço na área ambiental e que agora deverá ser encerrado. A rede de ecopontos foi criada pelo município em 2007 e se destacou pela simplicidade de concepção e praticidade de uso pela população. Inserido no programa Cidade Super Limpa, os ecopontos foram criados para solucionar o problema do descarte irregular de entulhos em vias públicas, praças e terrenos da cidade. Foram criados 21 ecopontos para atender todo o município, todos dotados de caçambas onde deveriam ser depositados os restos de construção e aparas de jardim. Os recipientes eram retirados periodicamente por empresa contratada.

Esses locais foram construídos para auxiliar quem havia feito uma pequena reforma em casa ou podado o jardim e tinha até um metro cúbico de entulho para descartar. Quem tinha maior volume de restos de construção continuava dependendo do serviço particular de caçambas, pois o material transportado por profissionais vai diretamente para o aterro municipal de inertes, localizado na zona industrial, onde o acesso é proibido a particulares. Quando o projeto foi lançado, havia uma multa no valor de R$ 300 para aqueles que fossem flagrados jogando material em qualquer outro local que não as caçambas do ecoponto e ainda poderiam ter o veículo apreendido.

A Prefeitura de Sorocaba não fala abertamente em fechamento desses espaços, e sim em desativação temporária para readequação desses locais, mas não informa quando o serviço será retomado. Além do mau uso dos ecopontos, há a questão do fim do contrato com a empresa que fazia a manutenção. Os três ecopontos sobreviventes e que deverão ser fechados estão localizados no Jardim Sorocaba Park, Parque Vitória Régia e Vila Helena, todos na zona norte da cidade.

O projeto dos ecopontos é daquelas iniciativas públicas que precisam ser bem explicadas à população e fiscalizadas, caso os usuários não atendam às normas de funcionamento. Exige também um mínimo de civilidade dos usuários. Desde o começo de seu funcionamento, há mais de dez anos, foi mal utilizado. Pessoas começaram a depositar todo tipo de material nas caçambas e fora delas, inclusive lixo, eletrodomésticos quebrados, móveis velhos e em quantidades não previstas no projeto. O resultado é que a maioria dos ecopontos ganhou aspecto de lixão, tornou-se atrativo para catadores de recicláveis e o lixo acumulado, um local altamente propício para a proliferação de mosquitos transmissores de doenças, além de roedores e insetos. Em praticamente todos os bairros causou reclamações dos moradores das proximidades, incomodados -- e com razão -- com aquele lixão de vizinhança.

Um projeto que tem uma série de normas de funcionamento e facilmente pode desandar, precisa ser bem fiscalizado e mantido limpo e organizado sempre a maior parte do tempo. O ex-prefeito de Curitiba Rafael Greca, que ao lado de Jaime Lerner ajudou a transformar aquela cidade em um exemplo em vários setores, copiada por todo o Brasil, explicava como conseguia manter na década de 1990, milhares de vasos de flores decorando as ruas centrais da cidade. Segundo ele, no começo furtavam muitos vasos, mas toda noite eram repostos por funcionários da prefeitura. Até que chegou uma época em que a própria população, assistindo ao esforço do poder público em tentar manter a cidade bonita, passou a fiscalizar por conta própria e censurar quem levava os vasinhos para casa. É assim que deve ser. Espaços públicos são de todos, mas muita gente pensa que são de ninguém. É difícil de entender o que pensa uma pessoa que, cansada de seu sofá velho ou que trocou de colchão, simplesmente os depositem em um terreno ou em uma praça. Sorocaba está cheio desses exemplos.

Os ecopontos também se tornaram atrativos para catadores de material reciclável. Com todo o respeito que essas pessoas que buscam honestamente a sobrevivência merecem, esses não são locais apropriados para retirar esses materiais. É preciso que a cidade desenvolva um sistema de coleta seletiva digna desse nome -- que não temos até hoje -- e aproveite essa mão de obra de forma correta. Privar a cidade de ecopontos por não saber administrá-los é um retrocesso.