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Por que a pressa, prefeito Manga?!

09 de Janeiro de 2021 às 01:03

Na primeira sessão extraordinária realizada neste ano, a Câmara Municipal de Sorocaba aprovou, ontem (8), por 13 votos a seis (maioria simples), a contratação de um empréstimo no valor de US$ 56 milhões (cerca de R$ 303 milhões).

O projeto de lei 33/2021, de autoria do Poder Executivo, foi idealizado pelo prefeito Rodrigo Manga (Republicanos). Segundo ele, o recurso será usado no programa Desenvolve Sorocaba, que contempla obras públicas e melhorias de infraestrutura na cidade, incluindo o sistema viário, de lazer e de iluminação.

Pelo projeto, os recursos serão obtidos por meio de linha de financiamento de crédito junto a duas instituições financeiras internacionais. Uma delas é a Fonplata -- banco de desenvolvimento formado por Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai. A outra é o New Development Bank (NDB), banco multilateral composto pelos países do grupo econômico Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

A administração municipal optou por financiamentos internacionais porque a taxa de juros é de 1,4% ao ano. Segundo o chefe do Executivo, o porcentual é menor do que o oferecido pela Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

A votação e a aprovação não chegam a ser novidade. Na quarta-feira (6) à noite, no site, e na edição impressa de quinta (7), o Cruzeiro trouxe, em sua manchete, a notícia de que Manga iria protocolar tal projeto na Câmara para tentar a autorização desse empréstimo. A informação, que acabou se confirmando, foi dada em primeira mão pelo repórter Marcel Scinocca.

Mas o que chamou a atenção de muita gente foi a rapidez com que tal projeto foi protocolado, discutido, colocado em votação e aprovado.

É comum no meio político que recém-eleitos tentem aprovar o máximo possível de projetos no início do mandato. Os motivos são óbvios. Primeiramente aproveitar a “lua de mel” com o eleitorado. Em muitos casos também tentam pegar o embalo da renovação da casa legislativa -- como ocorreu em Sorocaba.

Para fechar, é naturalmente mais fácil aprovar algo antes de eventuais desgastes que possam ocorrer no exercício do cargo. Manga apostou nisso. Colocou muitas fichas logo na primeira sessão extraordinária do novo governo e conseguiu aprovar o projeto. Ao todo, 19 vereadores estiveram presencialmente na votação. Só Péricles Régis (MDB) participou virtualmente, pois não estava na cidade.

Mas precisaria ser tão rápido assim? Não seria melhor o prefeito e sua equipe explicarem melhor o projeto para a população, detalhar onde a verba será usada, mostrar os prós e contras dessa linha de crédito? Em prol da discussão e da transparência, quem sabe até audiências públicas.

O resultado final -- a aprovação -- poderia até ser o mesmo, claro. Até pela dinâmica de funcionamento do Executivo/Legislativo, seriam grandes as chances de isso acontecer. Mas pelo menos a situação ficaria mais clara para todos os envolvidos. Sobretudo para a parte mais interessada, que é a população.

Afinal, trata-se de uma decisão de extrema importância e que certamente vai impactar a cidade e seus cidadãos nos próximos anos. Para o bem ou para o mal, diga-se. Por quê? Pois trata-se de um empréstimo milionário e que um dia terá de ser quitado, claro. Por melhores que sejam as condições de pagamento, cotações e taxas, dívida é dívida e um dia alguém terá de pagar.

Aqui foi empregado o termo “um dia” pois o prazo para pagamento é extenso. Pelo o que foi aprovado, a Prefeitura pode pagar o empréstimo em 16 anos -- 11 anos, com mais cinco de carência. Isto é, a quitação será iniciada apenas a partir de 2026. Aparentemente a perder de vista, sim. Mas somente de juros, por exemplo, serão pagos em torno de US$ 8 milhões (cerca de R$ 44 milhões).

A questão nem é se o empréstimo é bom ou ruim para a municipalidade ou se as obras são necessárias ou não. Independentemente de qualquer juízo de valor sobre elas, o que chama a atenção para o caso é a pressa com que algo desse tamanho foi sugerido (pelo prefeito), votado e aprovado (pelos vereadores). E tudo isso no meio de uma pandemia, que demanda esforços e muito dinheiro.

Por fim, o mais estranho de tudo é que empréstimo semelhante já havia sido tentado pelo ex-prefeito José Crespo (Democratas). E justamente para obras praticamente iguais às que estão sendo cogitadas. Só que naquela ocasião, em 2019, o projeto de lei não foi aprovado. A principal justificativa era óbvia.

A Prefeitura não deveria se endividar. E curiosamente, um dos que mais criticaram a tentativa de empréstimo foi justamente o então vereador Rodrigo Manga. Um vídeo da 17ª Sessão Ordinária da Câmara, ocorrida em 4/4/2019, mostra Manga dizendo não fazer sentido uma pessoa fazer um empréstimo e ficar endividado. E ainda acrescenta: “O problema (do então pedido de empréstimo) não são os juros.

O problema é que o empréstimo está sendo feito em dólar. A sugestão que eu dou é a seguinte: o BNDES faz empréstimos às prefeituras. Que a Prefeitura possa fazer esse empréstimo em reais, assim não vamos ficar reféns de uma possível variação de dólar”.

Pelo jeito, em menos de dois anos, Manga mudou radicalmente de opinião em relação a praticamente tudo sobre esse assunto.