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O viaduto que não traz qualidade de vida

09 de Dezembro de 2018 às 00:01

Há quem diga que quem dirige o trânsito de Sorocaba, não dirige. O trânsito de Sorocaba atravessa um de seus piores momentos. Em determinados períodos do dia, beira ao caos, com congestionamentos nas principais vias da cidade. Não bastasse o movimento extra provocado pela proximidade das festas de final do ano, quando a população procura fazer compras na região central e nos shopping centers e consequentemente multiplica o número de carros nas ruas, resolve-se justo nesta época do ano, desviar o trânsito por conta das obras do novo viaduto em construção sobre a rodovia Raposo Tavares, altura do km 101. Avenidas como a Armando Pannunzio, General Carneiro e Antônio Carlos Comitre, entre tantas outras, têm apresentado volume de trânsito acima do normal, mesmo para esta época do ano. E deverá continuar assim ainda por um bom tempo, uma vez que o viaduto só deverá estar concluído no mês de março do ano que vem.

Normalmente uma obra viária desse porte, que requer alto investimento e que serve para ligar dois pontos da cidade é bem-vinda. Em geral, o poder público, ao iniciar uma obra de impacto, o faz para atender parcela importante dos moradores que há bom tempo reivindica a benfeitoria. Não é o caso do novo viaduto que fará a ligação entre a rua João Wagner Wey, no Jardim São Carlos, com a rua Augusto Lippel, do outro lado da rodovia, na região que se convencionou chamar de altos do Campolim. Talvez seja uma das obras mais polêmicas de Sorocaba nas últimas décadas. Em especial porque invadiu com trânsito pesado bairros tranquilos, residenciais. Aliás, toda a região era considerada Z1.

Dizem que o novo viaduto vai diminuir o volume de trânsito no eixo formado pelas avenidas Antônio Carlos Comitre, Izoraida Marques Peres e Gisele Constantino, já no município vizinho de Votorantim. Essas avenidas dão acesso a shopping center, um corredor comercial importante, condomínios e vários bairros novos onde é grande o número de prédios. Esse eixo se tornou um grande gargalo no trânsito sorocabano, e poderia ser aliviado com a construção de mais uma pista de rolamento. Mas a futura alternativa, o novo viaduto, jogará trânsito pesado em bairros que tinham como sua principal característica -- e certamente foram escolhidos pelos moradores por conta disso -- a tranquilidade e tráfego apenas local de veículos, não apenas acabando com a tranquilidade dos moradores que escolheram aquele local, como desvalorizando os imóveis. E atropelando animais domésticos como aconteceu quando abriram, sem consulta à população do bairro, o acesso da Raposo Tavares por dentro do bairro. E, ao que tudo indica, continuará a ser assim.

A construção do viaduto em questão é uma compensação que construtoras oferecem ao município por conta do impacto que um enorme conjunto de prédios terá na região, um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) numa infeliz proposta do Ministério Público. Somente uma construtora ergueu 22 torres com oito andares cada uma em um bairro que já foi estritamente residencial e classificado como Z1. Isso ocorreu no governo do prefeito Pannunzio, assessorado pelos seus secretários. Porque tal fato ocorreu, ainda é um mistério. Por esse motivo, o custo da obra do viaduto está sendo bancado por construtoras e representará um investimento de aproximadamente R$ 8 milhões, ou seja, um custo ao redor de 20 apartamentos.

Desde que surgiu a ideia de interligar as duas regiões da cidade separadas pela rodovia naquele ponto começaram as reclamações. Associações de moradores protestaram e chegaram a recorrer à Justiça contra a obra. Para utilizar o futuro viaduto foi necessário que a Prefeitura de Sorocaba repensasse todo o trânsito na região, onde existem ruas estreitas para o futuro volume de trânsito, como a própria João Wagner Wey. Para isso será criado um sistema binário, utilizando além dessa rua Aclimação. Esse sistema se estenderá até a avenida Presidente Kennedy de um lado e a praça Nova York de outro, ou seja, uma série de improvisos e gambiarras para utilizar o novo viaduto que resultará, segundo os moradores da região, em um trânsito ainda mais complicado. O próprio viaduto terá dimensões modestas e em pouco tempo se tornará, ele próprio, um novo gargalo, uma vez que comportará apenas duas faixas de rolamento, uma para cada lado.

A própria entrada e saída do conjunto de prédios que nos horários de picos ainda criarão mais problemas na região -- os carros poderão chegar a mil saindo e entrando dos pequenos espigões sorocabanos -- quando poderiam ter entrada e saída diretamente na rodovia Raposo Tavares.

Sorocaba tem uma área relativamente pequena. Mudanças importantes foram introduzidas na polêmica revisão do Plano Diretor de Desenvolvimento Físico-Territorial que ocorreu em 2014, e que permitiu a expansão da malha urbana, reclassificação de bairros antes exclusivamente residenciais e diminuiu a zona de chácaras urbanas, criando zonas residenciais, entre outras medidas. Mudanças como essas provocam o aumento do adensamento urbano e tem potencial para diminuir ainda mais o já pequeno cinturão verde da cidade. Com esse adensamento forçado pela especulação imobiliária, a primeira vítima sempre é a qualidade de vida. É essa a cidade que o Legislativo e o Executivo querem para Sorocaba?