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O Brasil precisa respirar

15 de Janeiro de 2021 às 00:27

No final de 2020, especialistas em epidemias alertaram para um perigo que se avizinhava. As aglomerações nas comemorações de Natal e réveillon, aliadas ao afrouxamento do isolamento, sobretudo entre os jovens, por conta das notícias da chegada das primeiras vacinas a alguns países do mundo, poderia representar um período crítico no combate à Covid-19.

Referência em pneumologia e uma das maiores autoridades no assunto, Margareth Dalcolmo, médica, pesquisadora e docente da Fundação Oswaldo Cruz, não mediu as palavras nos últimos dias de dezembro. “Corremos o risco de termos um dos janeiros mais tristes de nossa história”. Infelizmente, a julgar pelo que se passa no Amazonas, esse perigo é real.

Devido à alta no número de casos provocados pelo vírus, o maior Estado da região Norte vive situação dramática, conforme relatos que surgem a todo momento. O principal motivo é a falta de oxigênio nos hospitais. Segundo profissionais de enfermagem, as pessoas estão “morrendo asfixiadas”.

Eles classificam a situação como caótica e deplorável. O sistema de saúde do Amazonas está em colapso. O governador, Wilson Lima (PSC), decretou toque de recolher em todo o Estado, entre 19h e 6h, como forma de reduzir a incidência do vírus.

A medida terá validade inicial de 10 dias a partir da publicação do decreto. Pacientes estão sendo transferidos para o Piauí e outros Estados. Autoridades do governo tentam encontrar formas de levar oxigênio a Manaus.

É a segunda vez, em oito meses, que o sistema de saúde da região se mostra ineficaz por causa da alta de casos e mortes provocadas pela doença. Em maio, cenas que mostravam tratores abrindo covas coletivas a céu aberto para dar conta do número de enterros, chocaram o País e o mundo.

Agora, o medo de que isso se repita é grande. Na realidade, já está se repetindo. Em um mês, o número de sepultamentos em Manaus cresceu 193% em meio à explosão do número de infectados.

No dia 6 de dezembro, por exemplo, foram registrados 31 enterros na capital, número que subiu para 110 em 6 de janeiro, superando a marca das 100 mortes por coronavírus registrada em maio de 2020.

A conclusão dessa trágica e complexa situação é a de que os governantes -- independentemente de sua linha ou partido -- têm de liderar e chamar a responsabilidade. É para isso que foram eleitos.

Não importa em qual esfera -- federal, estadual ou municipal --, é preciso trabalhar com competência no gerenciamento das questões que impactam a população.

A ironia de tudo isso é que o Amazonas é considerado o pulmão do mundo, referência como região de produção de oxigênio para o planeta. Quando há um problema relacionado às questões ambientais, o mundo vira seus olhos para a região.

Não faltam bons conselhos, claro, mas também sobram palpiteiros de tudo quanto é fórmula mágica para a região. Que esse mundo se comova também agora para tentar ajudar os habitantes do Estado, da maneira que puderem.

Outra ironia: a White Martins, uma das maiores fornecedoras de oxigênio hospitalar no Brasil, possui uma planta de produção justamente em...Manaus, onde falta o insumo neste exato momento, o que gerou essa situação de guerra na capital amazonense.

De acordo com a companhia, a demanda por oxigênio hospitalar aumentou em cinco vezes nos últimos 15 dias, alcançando um volume de 70 mil metros cúbicos por dia, três vezes maior do que a capacidade de fornecimento da empresa em sua unidade local, que é de 25 mil m³/dia. Segundo a empresa, a demanda segue crescendo fora de controle e sem qualquer previsibilidade.

Para se ter uma ideia, durante a primeira onda da pandemia, entre abril e maio de 2020, o consumo alcançou um pico de volume de 30 mil metros cúbicos por dia.

Anteriormente à pandemia, a planta da empresa em Manaus operava com 50% de sua capacidade e isso era suficiente para atender a todos os clientes dos segmentos medicinal e industrial, que somavam um consumo na ordem de 10 a 15 mil m³ por dia.

A saída agora é importar por vias pluviais e aéreas oxigênio de outros lugares. A White Martins contou para isso até com a ajuda da FAB, mas não foi suficiente. A saída para a crise, contudo, pode estar na importação de outros países.

Enfim, em relação à pandemia no Brasil, é necessário um comando central, sem disputas e brigas políticas. Que haja uma mensagem única, disseminada para o País inteiro, com transparência, dados certos e boas práticas.

É preciso lembrar que os sistemas de saúde estão pressionados de várias formas. Além dos casos agudos de coronavírus existe também a demanda de casos de menor gravidade, mas que necessitam internação. Temos também um número de pacientes com sequelas da Covid-19 que vão precisar de atendimento médico.

E ainda há um outro grupo, que são as pessoas com outras doenças e cujos atendimentos e tratamentos foram represados. Pacientes que sofrem de doenças crônicas e agudas e precisam de cuidados médicos.

Ou seja, a situação é de atenção, cuidado redobrado e cobrança para que os políticos façam direito seu trabalho. É tarefa de todos não permitir que tal situação se alastre para o resto do País.