Buscar no Cruzeiro

Buscar

Lava Jato avança

22 de Março de 2019 às 01:06

Uma semana depois de completar cinco anos, a Operação Lava Jato, considerada a mais organizada força-tarefa destinada ao combate à corrupção, mostra-se mais ativa do que nunca, apesar dos reveses que sofreu, também há uma semana, no Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem pela manhã, o braço da operação no Rio de Janeiro, por determinação do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, prendeu o ex-presidente Michel Temer (MDB) quando saia de sua residência na zona oeste de São Paulo. O ex-ministro de Minas e Energia e ex-governador do Rio, Moreira Franco, também foi preso preventivamente, assim como o coronel Lima, amigo do ex-presidente e sua esposa. Ao todo foram oito mandados de prisão preventiva, dois de custódia temporária e 26 de busca e apreensão nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Distrito Federal.

Em entrevista coletiva ontem à tarde, o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro informou que a soma de valores de propinas recebidas ou prometidas ao suposto grupo criminoso chefiado pelo ex-presidente ultrapassa R$ 1,8 bilhão. A Polícia Federal informou que a investigação ocorreu com dados colhidos nas operações Radioatividade, Pripyat e Irmandade, embasadas em colaboração premiada. A origem de toda investigação envolvendo o ex-presidente está em uma troca de e-mails de executivos da empresa Engevix sobre negociações de contratos da Usina Angra 3 apreendida pela Operação Lava Jato em Curitiba há quatro anos.

O conteúdo dos e-mails reforçou as suspeitas da força-tarefa de que houve propina nesse pacote de obras e deu origem às investigações que se estendem até hoje. Um levantamento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) revela que em outubro do ano passado, poucos dias antes do segundo turno das eleições, um emissário tentou depositar R$ 20 milhões em notas em uma agência de São Paulo na conta do coronel Lima, também implicado na investigação dos Portos, outro escândalo que tem o envolvimento do ex-presidente. As investigações mostram que diversas pessoas usadas no esquema de ocultação de ativos de Michel Temer continuam recebendo e movimentando valores ilícitos, inclusive no exterior. Temer responde ainda a nove inquéritos, sendo que cinco deles tramitavam no STF e foram encaminhados à primeira instância a partir do momento que ele deixou a Presidência.

A força-tarefa da Lava Jato revelou também a existência de um trabalho de contrainteligência na organização criminosa que tentava monitorar e até impedir, por meio da subtração de documentos, e confundir as investigações. A organização vigiava os policiais que estavam atuando no caso, fato inédito nas investigações recentes.

A prisão de Michel Temer reforça uma estatística constrangedora da política brasileira. Desde o fim do regime militar tivemos oito presidentes. Dois deles, Luiz Inácio Lula da Silva e Temer, foram presos por crime comum e outros dois (Dilma Rousseff e Fernando Collor) sofreram impeachment, o que mostra que há algo errado no mundo político brasileiro.

Outro dado vergonhoso: com a prisão de Moreira Franco, todos os ex-governadores eleitos do Rio de Janeiro vivos -- exceções de Nilo Batista e de Benedita da Silva, que eram vices e assumiram por alguns meses -- estão presos ou já passaram pela cadeia: Sérgio Cabral (condenado a mais de 120 anos de prisão), Luiz Fernando Pezão (preso em unidade da Polícia Militar de Niterói); Anthony Garotinho e Rosa Garotinho, estes últimos respondendo a processos em liberdade. Rodrigo Maia é conhecido nos meios políticos como “genro do genro do genro”, pois é genro de Moreira Franco que por sua vez foi genro de Ernâni do Amaral Peixoto casado com Alzira Vargas, ele interventor e governador do Rio de Janeiro em meados do século passado, ela filha e braço direito de Getúlio Vargas.

A prisão de Temer, segundo vários analistas, pode trazer ruídos para o avanço dos projetos do governo no Congresso, principalmente da reforma da Previdência. Seu partido, o MDB, perdeu muita força nas últimas eleições, mas ainda dispõe de 34 deputados federais. Essa situação, aliada à prisão de Moreira Franco, sogro de Rodrigo Maia, presidente da Casa e articulador da reforma no Congresso, poderá criar embaraços para a sua aprovação, pois o governo precisa de 60% dos votos da Câmara e Senado para aprová-la. Mesmo com essas novas dificuldades em questões cruciais para o futuro do País, é importante que a Operação Lava Jato prossiga na sua missão. A população brasileira espera que ela continue a investigar os escandalosos casos de corrupção que corroem a Nação, expurgando o ambiente político dos maus elementos que se organizam única e exclusivamente para obter vantagens pessoais e se perpetuar no poder. Ainda há muita podridão a ser descoberta -- e punida -- pela frente.