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Isolamento e violência

22 de Abril de 2020 às 00:01

A pandemia provocada pelo novo coronavírus e a política de distanciamento social adotada por praticamente todos os governos em diferentes níveis, provocou modificações sérias na economia mundial, nos hábitos de consumo, de lazer e alterou até o modo de agir dos criminosos.

Grupos organizados, diante da nova realidade, mudaram seu campo de atuação para golpes eletrônicos aproveitando que a maior parte da população está muito mais tempo ligada na internet e nas redes sociais.

As autoridades de segurança, entretanto, alertam para o aumento nos casos de violência doméstica no período de quarentena, em que a mulher é geralmente a maior vítima.

No Estado de São Paulo descobriu-se que as agressões a mulheres em ambiente doméstico aumentaram muito. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, os pedidos de socorro emitidos de dentro de residências envolvendo violência cresceram perto de 20% desde o início do isolamento social decretado pelo governo paulista para conter a pandemia.

Os dados foram levantados tendo por base os atendimentos realizados pela Polícia Militar entre os dias 20 de março e 13 de abril, comparados com o mesmo período do ano passado.

Este ano foram 7.933 ocorrências desse tipo, contra 6.624 em 2019. Uma pesquisa obtida pelo jornal Folha de S.Paulo revela que houve aceleração nesse processo de violência nos últimos seis dias da análise, de 20 de março a 7 de abril, quanto terminava a primeira etapa de quarentena decretada pelo governo estadual.

Os dados de atendimento da PM são importantes para aferir o aumento da violência doméstica porque os acionamentos, muitas vezes, são feitos por vizinhos ou terceiros que percebem as agressões ocorrendo, e não necessariamente pelas vítimas.

O curioso é que esses registros de atendimento da PM são um termômetro mais realista da situação, pois atingem muitos casos que não chegam a ser registrados pela Polícia Civil e, dessa maneira, como não geram inquéritos ou BOs, não entram nas estatísticas oficiais do governo.

Outro levantamento também envolvendo violência doméstica mostra que o número de mulheres assassinadas dentro de casa dobrou no Estado de São Paulo no período de quarentena, em comparação com o mesmo período do ano passado.

De 24 de março, quando por decreto foi fechado o comércio, bares e restaurantes a 13 de abril, 16 mulheres foram assassinadas dentro de casa.

No mesmo período de 2019 foram nove, com base nos boletins de ocorrência registrados. Os registros policiais mostram que de janeiro até 13 de abril ocorreram 55 assassinatos de mulheres em casa, ante 48 em 2019, um aumento de 15%. Outro dado importante é que segundo pesquisa do Ministério Público de São Paulo, 66% dos feminicídios consumados ou tentados ocorreram dentro da casa da vítima.

Na opinião de especialistas, as mulheres já viviam em situação de violência, mas o confinamento faz com que cresçam os conflitos. Alguns fatores contribuem para o aumento desse tipo de violência durante o isolamento. Maior consumo de álcool e o estresse causado pela falta de recursos financeiros além do aumento de casos de depressão e ansiedade contribuem para deixar o ambiente doméstico violento.

O Núcleo de Gênero e do Centro de Apoio Operacional e Criminal, do Ministério Público do Estado de São Paulo, constatou um aumento de 29,2% no aumento de medidas protetivas tomadas em caráter de urgência a partir de março, com o início do isolamento.

Foram registrados 2,5 mil casos, com o aumento inclusive de 51% nas prisões em flagrante, em relação ao mês anterior. A própria Promotoria alerta que os números devem ser maiores, pois em ambiente de isolamento, as vítimas são mais facilmente controladas por seus agressores.

A questão da agressão contra mulheres em casa tomou tal dimensão com o distanciamento social que o governo federal, por meio do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, está lançando um aplicativo para celulares e computadores para receber denúncias de violência contra a mulher e crianças ocorridas em ambiente doméstico.

A violência doméstica tem crescido em praticamente todos os países e no Brasil não é diferente. De acordo com o Ministério, as notificações recebidas no Rio de Janeiro são 50% maiores do que as recebidas nos meses que antecederam a quarentena.

Além do aplicativo, que poderá ser baixado na internet, o Ministério coloca dois canais telefones -- 100 e 189 --, para recebimento de denúncias e pedidos de socorro.

O crescimento da violência doméstica mostra que o novo coronavírus traz consequências nefastas em várias áreas, mas uma das piores é violência em um ambiente que deveria ser de proteção, convivência saudável e resguardo.