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Colapso a ser evitado

25 de Maio de 2019 às 00:01

Num momento em que o Brasil se vê às voltas com o contingenciamento de verbas que atinge o ensino superior, a informação sobre o abandono e reprovação de alunos do ensino básico somados à chamada “fuga de cérebros” de indivíduos que migram para outros países para desenvolver pesquisas e projetos, lança uma nuvem escura sobre o futuro do país.

O Brasil esperava que a curva de envelhecimento de sua população ocorresse por volta de 2030. Porém, essa curva enganou a muitos e ocorreu precocemente; hoje temos uma população idosa que rivaliza e supera a de jovens. Dados recentes do IBGE revelaram a redução de filhos por família, o que refletirá na mão de obra que deverá suportar os custos de uma população envelhecida e limitada na produção. E ainda, a necessidade de estar apta a competir num mercado global.

Com uma população mais velha e gerações mais novas desqualificadas pelo abandono do ensino, não há como não se questionar: o que se espera do País?

Esses dados complementam e agravam o cenário que o governo federal vem insistentemente mostrando com o desequilíbrio nas contas públicas provocado pelos custos da Previdência e a falta de investimentos em infraestrutura de modo mais amplo. Nosso parque industrial regrediu a patamares de 2016 ou ainda menos. Mesmo com a solução do déficit da Previdência, se efetivada nos moldes propostos, teremos um longo caminho até a almejada reserva em 10 anos de R$ 1 trilhão que não garante redução do risco de estarmos num ciclo de atraso agravado pela má formação de nossos jovens, seja por impossibilidade econômica ou até pela desilusão com o estudo. Já temos pessoas de nível superior nas filas de emprego aceitando “qualquer coisa”. Criamos a horrível figura, entre os desempregados, dos desalentados, aqueles que simplesmente desistiram de procurar qualquer coisa. Estes são quase 5 milhões de pessoas oficialmente contadas em março de 2019 que não aguentaram a desilusão do “não” à procura por uma vaga de qualquer trabalho.

Devemos considerar que estamos frente aos desafios de um mercado mundial que consome tecnologia e conhecimento com o mesmo apetite que cuida de áreas produtivas, parques industriais e infraestrutura. Uma perspectiva de aumento do conhecimento dá conta que por volta de 2030 os supercomputadores terão armazenado todo o conhecimento humano acumulado até hoje. Com tais dados, a base de conhecimento aumentará de modo exponencial a cada ano e não mais a cada século ou década. Como ficará o Brasil se os planos do governo fracassarem ou ficarem a meio caminho? Um milhão e oitocentos mil jovens deixaram a escola ou foram reprovados em 2018. Esse contingente de despreparados -- a população de um país como o Kosovo, no sudeste da Europa --, além do aspecto ético-moral do que estamos criando hoje, poderá custar um atraso que nem mesmo R$ 1,16 trilhão poderá compensar. Como alcançar esse patamar de conhecimento para competir?

Um conceito universal é o chamado “jogo de soma positiva”, um cenário no qual os agentes podem melhorar a situação dos dois jogadores ao mesmo tempo. Grosso modo: quando um tecelão produz mais casacos do que pode consumir, este trocará com alguém que tenha mais alimentos que possa comer. Cria-se assim a ideia central da economia moderna para gerar riqueza através da divisão do trabalho, porém só com indivíduos especializados que criem produtos diferenciados e que interessem ao outro -- não adiantaria trocar café por café --, para se poder entrar no jogo de soma zero ou positiva. É isso que ocorre entre as nações poderosas.

Não se faz mais guerras. Custam caro e não promovem a soma positiva. Faz-se o “comércio gentil”, como ocorre entre gigantes -- EUA e China -- com alguns momentos de menor carinho. Ninguém imagina crescer invadindo o outro militarmente, mas sim comercialmente.

Avaliações históricas já demonstraram que as gerações atuais no Brasil tiveram de trabalhar três vezes mais que seus pais para ter os mesmos bens, uma casa, um emprego, carro e, em média, dois filhos na escola. Hoje qualquer família adota um planejamento familiar pensando no que realmente podem assegurar aos seus filhos e com isso os nascimentos estão diminuindo e as pessoas se casando muito mais tarde. Não há fato isolado, tudo está interligado e interagindo.

Somados ao despreparo, abandono, falta de investimentos em pesquisa e especializações para formar uma geração competitiva, estamos condenando nossos filhos e jovens a serem servidores de países como os citados acima, pois não teremos nada de especializado para oferecer no jogo de soma positiva ou zero.