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Aos 45 do segundo tempo

06 de Novembro de 2020 às 00:01

É difícil identificar quando suspeitas de corrupção e política começaram a andar de mãos dadas na história do Brasil. Pesquisadores registram casos desde os primeiros anos do período colonial, passando pelo império e por toda a história republicana, com exemplos que se tornaram antológicos de como alguns poucos, em posição de mando, se beneficiaram e enriqueceram por meio de acordos espúrios em todas as áreas de atividade.

Mas só os escândalos e investigações deste século, que está agora em sua segunda década, já são suficientes para ilustrar o quanto ainda existe de atividades ilegais permeando o poder público em todas as instâncias e quanto ainda é preciso evoluir para extirpar essa praga da vida pública nacional.

Vejamos: em 2005, em entrevista bombástica concedida pelo então deputado federal Roberto Jefferson, foi denunciado o Mensalão, nome genérico adotado até pelos envolvidos que se referia a uma espécie de mesada que parlamentares de diversos partidos recebiam para votar em projetos de interesse do Poder Executivo, que tinha como presidente o sr. Luiz Inácio Lula da Silva.

Jefferson, estrela do chamado Centrão, lembrava inclusive que a prática ilegal havia sido criada pela cúpula petista, então no poder. A denúncia era tão grave e as provas tão contundentes que muitos pensaram ali terminaria a carreira política do presidente.

Apesar da atuação do Judiciário, que tinha como presidente do STF Joaquim Barbosa e condenou vários dos acusados, Lula não só conseguiu desvencilhar-se das denúncias como foi reeleito presidente, elegeu sua sucessora que, por sua vez, se reelegeu, e a prática continuou, mais voraz e sofisticada como ficamos sabendo após o início das investigações da Operação Lava Jato, quase uma década depois.

Essa operação, que começou no início de 2014 talvez seja, até agora, a mais completa investigação da corrupção nos bastidores do poder na história do Brasil. Investigações e delações premiadas mostraram que estavam envolvidos até o pescoço dirigentes da Petrobras e outras estatais, políticos dos maiores partidos do País, presidente da República, da Câmara dos Deputados, do Senado, governadores além dos maiores empresários de construtoras brasileiras.

Uma verdadeira ciranda de ilegalidades que ganhavam todos, menos o povo e os cofres públicos. A operação levou ex-presidente para a prisão, assim como vários ministros, deputados, presidente da Câmara, dirigentes partidários e parte dos empresários que participaram do esquema.

Mesmo sem a impetuosidade dos primeiros anos, alguns braços da operação ainda produzem vez ou outra alguns resultados, envolvendo alguns figurões ligados a tramoias.

Em várias das investigações da Lava Jato, principalmente relacionadas a investigações realizadas em São Paulo, surgiram figuras proeminentes do PSDB, o partido que desde 1995 governa o Estado.

Mas praticamente em todas as situações, somente personagens pouco conhecidas e que operavam o esquema encontraram problemas sérios com a Justiça, caso do engenheiro Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, que dirigiu várias empresas ligadas ao Estado de São Paulo, responde a inúmeros processos e chegou a ser preso algumas vezes.

O suposto operador de propinas do PSDB do Estado chegou a ser condenado a 145 anos por crimes diversos, sempre ligados à corrupção.

Em várias ocasiões, por exemplo, o senador José Serra, que também já foi prefeito e governador do Estado, teve seu nome relacionado com investigações da Lava Jato.

Em uma delas, foi realizada uma operação de busca e apreensão em sua casa, por conta de uma denúncia de que a Odebrecht teria pago R$ 4,5 milhões entre 2006 e 2007 para financiar sua campanha eleitoral para o governo do Estado e mais R$ 23 milhões entre 2009 e 2010, para liberação de créditos com a Dersa.

Em outra situação, o ex-governador e sua filha foram acusados de lavagem de dinheiro no exterior, resultante de obras do Rodoanel Sul.

Esta semana, por muito pouco, o tucano não se livra de outro inquérito, este por falsidade eleitoral, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

A peça foi enviada pela Promotoria e aceita pela Justiça horas depois do ministro Gilmar Mendes do STF devolver o caso para a primeira instância na véspera da prescrição do crime, que ocorreria na quarta-feira, dia 4.

As acusações se baseiam em delação de um empresário que relatou que os repasses de R$ 5 milhões foram ocultados por meio de notas fiscais de serviços que não foram realizados.

O inquérito estava travado desde setembro quando o ministro Gilmar Mendes puxou o caso para a Corte por vislumbrar suposta violação de prerrogativa de foro privilegiado do senador José Serra e só o liberou quando estava prestes a prescrever.

Caso passasse despercebido, seria mais uma daquelas coincidências que insistem em privilegiar certas agremiações políticas.