Buscar no Cruzeiro

Buscar

A represa pede socorro

26 de Março de 2019 às 00:41

Por ocasião das comemorações do Dia Mundial da Água, na última sexta-feira (22), o jornal Cruzeiro do Sul publicou extensa reportagem sobre a degradação da Área de Proteção Ambiental (APA) de Itupararanga e, consequentemente, da represa do mesmo nome, responsável pelo abastecimento de 80% dos moradores de Sorocaba e de oito municípios vizinhos. A reportagem de Esdras Felipe Pereira mostrou que esse manancial se encontra em situação preocupante, com níveis de poluição inimagináveis no passado e que têm como único culpado o descaso do poder público -- em todos os níveis -- em fiscalizar essa área vital para o abastecimento da região.

[irp posts="91245" ]

 

Por conta de sua importância regional, a APA de Itupararanga aparece com frequência neste espaço, onde são comentados problemas locais e regionais. Há ainda uma ligação mais forte entre este jornal e a área de proteção. Sua criação foi cobrada durante anos, principalmente no final dos anos 1990, por uma série de reportagens que mostravam os mesmos problemas que hoje afetam de maneira ainda mais séria esse manancial. Nessa época o Cruzeiro do Sul já denunciava o uso abusivo de agrotóxicos, o despejo de esgoto sem tratamento e a ocupação desordenada do solo, com o surgimento de condomínios e loteamentos clandestinos ao redor desse corpo d’água.

Desde a criação da APA em 1998 até agora, os problemas só aumentaram e já comprometem a qualidade de água. Segundo o professor da UFSCar, André Cordeiro Alves dos Santos, entrevistado pela reportagem, relatórios da Cetesb mostram que no início dos anos 2000, apesar das irregularidades constatadas no entorno da represa, a qualidade de sua água estava entre as melhores do Estado. Hoje, essa água é considerada regular e daqui a duas décadas, segundo o professor, talvez não seja possível usá-la como água potável. Preocupa a concentração de nitrogênio e fósforo na represa, resultado dos fertilizantes usados indiscriminadamente às margens da represa e pelo lançamento de esgoto sem tratamento.

Essa concentração inadequada desses dois elementos provoca o aumento de plantas aquáticas flutuantes que produzem toxinas e trazem sabor e odor à água, inviabilizando processos tradicionais de tratamento. No futuro, se esse processo aumentar, para retirar odor e sabor da água só será possível com processos de tratamento extremamente caros, como o que usa carvão ativado.

A APA de Itupararanga foi criada há 20 anos justamente para disciplinar o avanço de sua ocupação. Já naquela época existiam inúmeros loteamentos clandestinos, condomínios e uma grande quantidade de plantações com suas bombas de irrigação sugando água da represa. A área de proteção abrange a bacia hidrográfica chamada Alto Sorocaba, formadora da represa e compreende parte dos municípios de Alumínio, Cotia, Ibiúna, Piedade, Mairinque São Roque, Vargem Grande Paulista e Votorantim. Essa área, além de excelente manancial, abriga remanescentes importantes da Mata Atlântica e é refúgio de vida silvestre. A APA tem um Plano de Manejo desde 2012 e profissionais da área o consideram bem elaborado. O problema é a falta de colaboração dos municípios do entorno que nem sempre mencionam nas certidões de uso e ocupação do solo em qual zona de preservação o empreendimento está.

Muitos municípios -- e essa é uma tendência regional -- estão diminuindo suas áreas de ocupação rural transformando-as em urbanas para poder cobrar IPTU, o que provoca um crescimento desordenado em área de grande fragilidade ambiental.

Ainda é possível reverter esse quadro que poderá levar a um futuro sombrio. Mas isso só será possível se as autoridades responsáveis pelas ocupações no entorno da represa, sobretudo prefeituras e governo estadual, se conscientizem da necessidade de preservação. Algumas prefeituras, questionadas pela reportagem, sequer se deram ao trabalho de responder sobre projetos na área protegida. Órgãos fiscalizadores como a Cetesb e Polícia Militar Ambiental precisam fazer uma fiscalização rigorosa e constante e cabe principalmente às organizações não governamentais, Comitê de Bacias e à população denunciar toda e qualquer irregularidade nessa extensa área. A qualidade de vida da região no futuro dependerá de como vamos preservar a área de proteção e o manancial precioso.