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Editorial

Blindagem de Lulinha e Frei Chico

05 de Dezembro de 2025 às 21:13
Cruzeiro do Sul [email protected]
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A decisão da CPMI do INSS de rejeitar a convocação de Fábio Luís Lula da Silva (Lulinha) e de José Ferreira da Silva (Frei Chico), respectivamente filho e irmão do presidente Lula, revela mais do que um mero cálculo político: expõe a seletividade na busca pela verdade e o uso das comissões de investigação como escudo — e até mesmo minando a sua credibilidade —, e não como instrumento de transparência. Ao blindarem dois personagens mencionados por testemunhas como possíveis beneficiários de um esquema de fraudes bilionárias no INSS por parte dos parlamentares que compõem a Comissão do Congresso, enviam ao País um recado perigoso: há brasileiros que não podem ser questionados, não por ausência de indícios, mas por excesso de conveniência.

Só para situalizar o leitor, na quinta-feira, os governistas conseguiram a rejeição do pedido de comparecimento de Lulinha à CPMI do INSS por 19 votos a 12 (da oposição).

Lulinha, filho mais velho do presidente Lula, é formado em Ciências Biológicas, já trabalhou como monitor de zoológico e tornou-se empresário nas áreas de tecnologia e mídia. Entre 2004 e 2014 declarou rendimento bruto de R$ 5,2 milhões, dos quais cerca de R$ 3,8 milhões vieram de dividendos da empresa da qual era sócio. Já foi investigado no âmbito da Operação Lava Jato por suspeita de repasses suspeitos da operadora de telefonia (durante governo do pai) para suas empresas, embora investigações anteriores tenham concluído haver “evolução patrimonial formalmente compatível”.

Mais recentemente, seu nome voltou ao noticiário por menções em depoimento na investigação da fraude no INSS, de acordo com o qual ele teria recebido pagamentos de “mesada” de R$ 300 mil e um repasse pontual de supostos recursos milionários, eventualmente feitos pelo Careca do INSS. Vale ressaltar que as acusações ainda não foram confirmadas judicialmente

Frei Chico, por sua vez, é dirigente sindical de longa data, irmão mais velho do presidente, e atualmente figura como vice-presidente de um sindicato de aposentados, pensionistas e idosos que está incluído nas investigações da fraude ao INSS. Segundo a Polícia Federal, o sindicato de Frei Chico teria arrecadado R$ 259 milhões de forma ilícita. Apesar dessas conexões e da relevância institucional de seu papel, ele também foi poupado do depoimento na CPMI.

A recusa em ouvir Lulinha e Frei Chico não é apenas uma omissão! É uma distorção institucional. A CPMI, criada para buscar verdades, preferiu poupar aqueles cujos nomes foram citados por testemunhas em acusações graves de corrupção e desvio. Ao agir assim, a comissão assume o papel de guardiã de privilégios em vez de fiscal da República. Para uma democracia madura, não há alternativa: o silêncio imposto não é indício de inocência, e sim de impunidade disfarçada.

As alegações envolvendo pagamentos mensais volumosos, repasses milionários e vínculos com operadores do esquema exigem mais que retórica indignada: exigem investigação aberta, transparente, fundamentada e sem blindagens políticas. Negar perguntas não resolve dúvidas. Apenas perpetua o que se pretende esconder.

Trata-se de um precedente perigoso. Não é a primeira vez que CPIs e comissões importantes cedem a pressões políticas e decidem quem pode ou não ser investigado. Comissões investigativas como as da “delação dos Correios” e a do “Petrolão” conviveram com omissões semelhantes, e pagaram o preço: crises prolongadas, descrédito institucional, impunidade de aliados próximos ao poder. A lógica é sempre a mesma: evitar perguntas prolonga o escândalo, aprofunda a suspeita e compromete a confiança pública.

Se o Brasil tem algo de que realmente carece neste momento, não é de blindagem e sim de coragem para perguntar, para cobrar e para punir, se houver culpa. Ao rejeitar as convocações, a CPMI escolheu o caminho mais cômodo para o governo, mas o mais danoso para a democracia e a confiança nacional. Ao fechar as portas do depoimento, fechou também as janelas da credibilidade.

A comissão pode ainda apresentar um relatório final. Mas este relatório será sempre incompleto, uma vez que as bases de sua construção optou pela omissão deliberada. A democracia exige mais do que palavras: exige fatos. E para que os fatos venham à tona, é preciso que ninguém esteja acima do escrutínio público.