Editorial
Famílias ainda mais endividadas
Por mais que o presidente Lula (PT) insista em repetir que “a economia vai bem” e que o “desemprego está caindo”, as prateleiras da realidade cotidiana das famílias brasileiras continuam vazias. Os números macroeconômicos, apresentados com entusiasmo pelo governo lulista, não têm se traduzido em alívio real no bolso da população. Pior: enquanto os índices de desemprego recuam e o PIB dá sinais de resiliência, o endividamento das famílias atinge recordes históricos. A conta não fecha. E não é apenas uma questão de matemática, mas de percepção, política e estrutura econômica.
Segundo o IBGE, a taxa de desocupação no Brasil caiu para 7,1% no segundo trimestre de 2025, o menor patamar desde 2014. O governo comemora. Mas essa estatística, embora importante, esconde nuances. O mercado de trabalho, ainda que mais aquecido, tem gerado empregos de menor remuneração. Em outras palavras: há mais brasileiros trabalhando, mas ganhando pouco — e gastando muito mais do que podem para sobreviver.
A inflação desacelerou, mas não desapareceu. Os alimentos continuam caros, o custo de vida nas cidades aumenta, e o crédito, apesar de mais acessível do que no auge da pandemia, continua com juros proibitivos. O resultado é um ciclo vicioso: para manter um padrão mínimo de consumo, famílias recorrem a empréstimos, cartão de crédito e cheque especial. O alívio imediato vira dor prolongada.
Ao enfatizar os avanços econômicos de seu governo, Lula cumpre um papel político legítimo: defender sua gestão, estimular a confiança e evitar o pessimismo. No entanto, há um risco claro em pintar um Brasil otimista demais, quando a base da pirâmide social ainda sente o peso do custo de vida. O discurso oficial pode soar distante, quase insensível, àqueles que precisam parcelar até o básico. E, numa democracia, a desconexão entre a narrativa institucional e a experiência cotidiana do cidadão comum mina a confiança no governo, mesmo quando os dados estão, tecnicamente, corretos.
Há também um ponto estrutural que não pode ser ignorado: o Brasil cresceu, mas não distribuiu com eficiência. O crescimento recente do PIB foi impulsionado por setores como o agronegócio e a exportação de commodities, que pouco reverberam na vida da classe média urbana ou das periferias. Além disso, o sistema financeiro nacional, com lucros bilionários trimestre após trimestre, continua insaciável: cobra juros exorbitantes e penaliza quem mais precisa de crédito. É uma engrenagem que sufoca o cidadão comum.
Diante desse cenário, o lulismo precisa mais do que comemorar estatísticas e buscar soluções reais e não somente recorrer a falácias políticas parar agradar a bolha.
O Brasil de Lula, nesta terceira passagem pelo Planalto, convive com paradoxos. A economia cresce, o desemprego diminui, mas o brasileiro segue afundado em dívidas. Não basta dizer que está tudo indo bem, é preciso garantir que, de fato, “todos” estejam bem. Do jeito que está, a vida do povo continua difícil e o País não avança, apenas aparenta progresso.
Prova disso tudo vem dos dados mais recentes da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC): os brasileiros ficaram mais endividados e mais inadimplentes em julho. A proporção de famílias com contas a vencer cresceu pelo sexto mês consecutivo de altas, apontou a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, que considera como dívidas as contas a vencer nas modalidades cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, cheque pré-datado e prestações de carro e casa.
A proporção de consumidores com contas em atraso subiu para 30%, maior patamar desde setembro de 2023, quando essa fatia somava 30,2%. Um ano antes, em julho de 2024, a proporção de famílias inadimplentes era de 28,8%.
A fatia de consumidores que afirmaram não ter condições de pagar dívidas vencidas, ou seja, que permaneceriam inadimplentes, subiu para 12,7% em julho. Segundo a CNC, os resultados emitem um alerta de que famílias de renda baixa e média têm enfrentado mais dificuldades no pagamento de contas. Então, na realidade, o Brasil não está nada bem.