Buscar no Cruzeiro

Buscar

Editorial

Muy amiga, muy amigo

25 de Julho de 2025 às 22:51
Cruzeiro do Sul [email protected]
placeholder
placeholder

A expressão “aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei” reflete uma prática histórica e cultural brasileira e é associada a um sistema onde a aplicação da lei era seletiva, beneficiando aqueles com relações de poder e afetando aqueles que não as possuíam.

Pensando na mensagem da frase e nas coisas que estão acontecendo no Brasil, pode até haver uma permissão coloquial para adaptar a afirmação e deixá-la da seguinte maneira: “aos amigos tudo é permitido, aos inimigos tudo é motivo para julgar, incriminar, caluniar, detrair, desacreditar, injuriar, maledizer e de escárnio”.

Vamos aos fatos, há neste momento, no Brasil, uma tempestade de incertezas sobre a taxação de 50% aos produtos brasileiros anunciada pelo presidente norte-americano Donald Trump, a ser aplicada a partir de 1º de agosto. Há muito burburinho, discussão, críticas, discursos indignados e pouca análise sobre a motivação e quase nenhum empenho em negociar, como vem fazendo outro países junto aos EUA, como Japão, os membros da União Europeia e até a China.

Enquanto isso, ontem, começou a circulação uma informação que recebeu pouca atenção da mídia: A Venezuela começou a taxar os produtos importados do Brasil com alíquotas que variam de 15% a 77%, mesmo nos casos em que deveria haver isenção mediante apresentação de certificado de origem. A medida foi adotada sem aviso prévio, e há dúvidas se ocorreu por um erro burocrático ou de propósito. A informação sobre a cobrança inesperada é da Folha de Boa Vista, de Roraima, e foi confirmada pela Federação das Indústrias do Estado de Roraima (Fier) em nota enviada à Veja Negócios.

Essa é a íntegra da nota: “O Centro Internacional de Negócios (CIN) da Federação das Indústrias do Estado de Roraima (Fier) informa que já iniciou apurações internas para identificar as dificuldades quanto à aceitação dos Certificados de Origem de produtos brasileiros por parte das autoridades venezuelanas. Paralelamente, está em contato direto com as autoridades competentes do Brasil e da Venezuela, em busca de esclarecimentos e soluções rápidas que visem a normalização do fluxo comercial bilateral.”

Pelo que se vê, a Venezuela já iniciou a taxação e o governo brasileiro se aquietou, enquanto gasta verbo para maldizer algo que ainda vai acontecer e pode ser revertido se souber [e quiser] negociar.

Afinal, a Venezuela é “muy amiga” do Brasil e seu ditador, Nicolás Maduro, “muy amigo” do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Aliás, segundo a própria Veja, em publicação de 19 de maio deste ano, a Venezuela [do ditador muy amigo de Lula] deve ao Brasil mais de US$ 1,7 bilhão (cerca de R$ 10 bilhões), “mas ignora sistematicamente” o fato.

Segundo a Veja, o tamanho da dívida venezuela para com o Brasil consta em um documento enviado ao Congresso Nacional pela secretária de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Tatiana Rosito, em resposta a um requerimento do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG).

De acordo com a apuração de Veja, “a dívida nasceu durante os anos de bonança petista e chavista, quando Lula e o falecido ditador Hugo Chávez [outro ‘muy amigo’ do presidente brasileiro] orbitavam juntos em torno de uma utopia sul-americana de integração econômica. O Brasil, por meio do BNDES, financiou obras grandiosas na Venezuela, como a expansão do metrô de Caracas e a construção da Siderúrgica Nacional. O modelo era simples: o BNDES emprestava o dinheiro, empreiteiras brasileiras executavam os projetos, e o país contratante — no caso, a Venezuela — reembolsava os valores.”

Mas a Venezuela nunca pagou. O dinheiro dos brasileiros fez a alegria de muita gente em solo venezuelano, a exemplo do que aconteceu por aqui em um passado não tão distante assim e que causou desvios bilionários, durante um verdadeiro show de corrupção. O que se sabe é esse assunto cai, a cada dia, no buraco de esquecimento.

Sobre a dívida não paga da Venezuela, quem vai acertar as contas deverá ser o FGE — Fundo de Garantia à Exportação — do governo brasileiro vinculado ao Ministério da Fazenda, com o objetivo de garantir operações de seguro de crédito à exportação. Ou seja: mais uma vez a Venezuela vai usufruir do dinheiro dos brasileiros e fica por isso mesmo. “Aos amigos tudo!”.