Editorial
De olho no céu
A autorização da Receita Federal para a internacionalização do Aeroporto Estadual Bertram Luiz Leupolz, em Sorocaba, representa um avanço logístico e econômico aguardado há mais de uma década. É uma conquista de peso para a cidade e para toda a região metropolitana. Agora, falta apenas a homologação final por parte da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) — deve ocorrer nos próximos dias — para que aviões vindos do exterior possam pousar diretamente em solo sorocabano com fins exclusivos de manutenção.
Esse passo estratégico coloca Sorocaba em um novo patamar no setor da aviação executiva. A cidade já é referência nacional em manutenção de aeronaves, com empresas como Embraer, Cirrus e outras operando em seus hangares. Com a internacionalização, deixa de ser apenas um destino doméstico de serviços para se tornar um polo logístico global — capaz de receber jatos executivos de qualquer parte do mundo, como os da americana NetJets, sem a burocracia de escalas em Guarulhos, Campinas ou Rio de Janeiro.
O impacto disso é direto e significativo. Mais aeronaves representam mais serviços prestados, mais profissionais especializados, mais contratos firmados, e, claro, mais impostos gerados para o município e para o Estado. Segundo o CEO da Rede Voa, Marcel Moure, isso pode gerar um fluxo contínuo de demanda, encurtando o tempo que as aeronaves ficam fora de operação e, com isso, aumentando o interesse das companhias em manter suas frotas em Sorocaba. A Embraer, por exemplo, poderá expandir seus serviços em um cenário cada vez mais competitivo no mercado da aviação executiva mundial.
Além disso, a movimentação econômica provocada pela internacionalização não se limitará aos muros do aeroporto. Ela se espraia por uma cadeia de empresas locais de serviços, tecnologia, transporte, logística e alimentação. Sorocaba poderá se tornar um polo ainda mais atrativo para micro, pequenas e médias empresas que orbitam o setor aeronáutico. Isso também deverá aquecer a demanda por formação técnica e qualificação de mão de obra, impactando positivamente o ensino profissional e a empregabilidade.
Do ponto de vista político e institucional, é justo reconhecer o papel da atual administração municipal. O prefeito Rodrigo Manga comemorou, com razão, a publicação do Ato Declaratório da Receita Federal, destacando o empenho de diferentes esferas e a visão de transformar Sorocaba em referência mundial. Vale lembrar que o processo foi iniciado em 2012, mas só deslanchou de fato com a chegada da Rede Voa em 2022, que retomou e praticamente refez os trâmites junto aos órgãos federais.
No entanto, é preciso olhar para além da euforia e avaliar os desafios que a internacionalização também traz. Um aeroporto internacional exige controle rígido, segurança total e protocolos padronizados. A comunicação entre os hangares e os órgãos fiscalizadores precisa ser eficaz e contínua. Cada chegada de aeronave deve ser informada com 72 horas de antecedência, o que exige um planejamento técnico-administrativo preciso.
Outro ponto sensível é que, neste primeiro momento, o aeroporto seguirá sem movimentação de passageiros ou carga internacional. Isso significa que, embora haja um ganho expressivo na aviação executiva e no setor de manutenção, ainda não estamos diante de um aeroporto comercial com voos internacionais para o público. É uma internacionalização parcial e muito específica e isso precisa estar claro para que não se crie uma expectativa desalinhada com a realidade.
Além disso, o crescimento da movimentação aérea na cidade precisa estar acompanhado de investimentos em infraestrutura urbana, mobilidade, segurança viária e transporte público. O entorno do aeroporto, localizado na zona norte, pode ser impactado diretamente pelo aumento da circulação de veículos pesados, prestadores de serviço e funcionários. A cidade precisa estar preparada.
Outro risco, ainda que remoto, é a concentração excessiva de investimentos em um único setor. Sorocaba é hoje uma cidade industrial e de serviços diversificados. A internacionalização é bem-vinda, mas não pode significar a negligência de outras áreas estratégicas.
Ainda assim, a notícia merece ser celebrada. O céu se abre para Sorocaba e com ele se abrem novas possibilidades de crescimento, inovação e visibilidade internacional. Cabe agora aos gestores públicos, empresários, trabalhadores e à sociedade civil garantir que esse avanço se transforme em desenvolvimento duradouro.
Com responsabilidade, fiscalização e foco em resultados, o aeroporto pode ser a principal porta de entrada de um novo ciclo para a cidade. Que essa decolagem seja apenas o começo de um voo alto e seguro.