Editorial
Lula e o Congresso Nacional

Quanto mais 2026 se aproxima, trazendo em seu calendário as eleições, mais indecisas ficam as relações do governo Lula com o Congresso Nacional. Porém, há interesses escancarados dos dois lados. Enquanto o governo quer apoio para aprovar projetos de seu interesse no Parlamento, senadores e deputados — e seus partidos — lutam por Ministérios e outros cargos no Executivo e para garantir que as emendas não serão cortadas e sim ampliadas.
Os dois lados usam as “armas” que têm. Neste momento, senadores e deputados negociam quais vetos da Presidência da República devem ser mantidos ou derrubados na próxima sessão conjunta do Congresso Nacional prevista para terça-feira (17).
Um dos vetos a serem derrubados é ao projeto que previa pensão mensal, até o fim da vida, de R$ 7.786,02 a pessoas que nasceram com deficiência causada pelo vírus Zika durante a gestação. O VET 2/2025 barrou integralmente o Projeto de Lei (PL) 6.064/2023, que previa indenização única por danos morais de R$ 50 mil e uma pensão, paga mensalmente até o fim da vida, de R$ 7.786,02, o que equivale ao teto do Regime Geral de Previdência Social. Ambos os valores seriam corrigidos pela inflação (pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor) e seriam livres de Imposto de Renda.
No veto, Lula aponta em mensagem encaminhada ao Congresso que a iniciativa criaria despesa obrigatória contínua (o que engessa ainda mais as contas públicas) sem indicar prévio estudo e sem informar de onde viriam os recursos. Como alternativa, Lula editou, em janeiro, uma medida provisória (MP 1.287/2025) que dá R$ 60 mil de apoio financeiro, em parcela única, restrita a este ano, às crianças nascidas entre 2015 e 2024. A medida já teve sua vigência encerrada. Senadores opositores ao lulismo avaliam que a rejeição do veto é “uma vitória” para mães de crianças com deficiência intelectual grave decorrente do Zika vírus.
A pauta de quais vetos serão votados ainda não foi publicada, mas 64 estão na lista de espera. Será a primeira votação de vetos em mais de um ano. Havia 55 vetos aguardando análise em fevereiro, o maior acúmulo pelo menos desde 2018.
Os parlamentares podem votar a inclusão de trechos na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 e na lei do pacote de corte de gastos (Lei Complementar 211, de 2024) que vedaria o bloqueio de despesas provenientes de emendas parlamentares impositivas, tanto as individuais quanto as de bancadas estaduais. Hoje o contingenciamento é permitido para cumprir as regras de responsabilidade fiscal. Lula vedou esses trechos por meio dos vetos (VET) 47/2024 e VET 48/2024.
Os 64 vetos afetam temas relacionados a diversas áreas, como cultura, segurança, habitação e agricultura. Alguns dos que podem ser analisados pelos parlamentares são: VET 25/2024, que barrou totalmente o PL 397/2024, que adia por quatro anos o pagamento de parcelas de dívidas rurais de agricultores prejudicados por seca ou inundação; VET 14/2023, que impediu a criação da Autoridade Nacional para Prevenção e Combate à Violência e à Discriminação no Esporte pela Lei Geral do Esporte e manteve vivo trechos da Lei Pelé; VET 37/2024, que excluiu a previsão de que, no Cadastro Nacional de Pedófilos e Predadores Sexuais, o nome de pessoas condenadas por pedofilia seriam mantidos durante dez anos após o cumprimento integral da pena; VET 8/2025, que evitou a disponibilidade automática de recursos do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima para projetos do Programa de Aceleração da Transição Energética ou para a certos ramos do setor automotivo, como ônibus, equipamentos agrícolas e abastecimento de Gás Natural Comprimido; VET 49/2024, que impediu a obrigação de reservar, no mínimo, 2% dos recursos anuais do Programa Minha Casa, Minha Vida para a regularização fundiária e a proibição de contingenciamento desses valores; e VET 27/2024, que impediu a prorrogação de incentivos tributários à indústria de semicondutores e tecnologia da informação e comunicação (TICs) até 2073, mantendo-os até 2029.
Na mesma sessão conjunta, também poderá ser feita a leitura do requerimento que cria a comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) para investigar as fraudes no INSS. Protocolado no dia 12 de maio, o pedido tem assinaturas de mais de um terço da composição da Câmara dos Deputados e do Senado, o que garante direito à investigação. No texto, os parlamentares lembram que as investigações da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União apontaram, em abril, a existência de um esquema de cobrança de mensalidades irregulares, descontadas dos benefícios de aposentados e de pensionistas sem autorização. Os desvios, entre os anos de 2019 e 2024, são estimados em R$ 6,3 bilhões.