Editorial
CPI das Bets rejeita relatório final

A CPI das Bets rejeitou ontem o relatório final apresentado pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) por quatro votos a três. A votação marca o fim melancólico da comissão criticada por falta de foco, lobby das casas de apostas e denúncias de extorsão.
Votaram contra o relatório: Angelo Coronel (PSD-BA), Eduardo Gomes (PL-TO), Efraim Filho (União-PB) e Dorinha Seabra (União-TO). A favor: Eduardo Girão (Novo-CE), Alessandro Vieira (MDB-SE) e Soraya Thronicke.
O documento acusava 16 pessoas de cometer crimes (indiciamento), incluindo influenciadores digitais como Virgínia Fonseca e Deolane Bezerra. O texto ainda apresentava 20 projetos de lei para conter os malefícios causados pelas apostas virtuais. Entre eles, havia projetos para a proibição de jogos semelhantes a caça-níqueis, o que não afetaria apostas esportivas de tempo real e a proibição de pessoas inscritas no CadÚnico (instrumento que identifica famílias de baixa renda) de apostar na internet.
Com o total de 21 reuniões, a CPI escutou 19 pessoas. Isso representa pouco mais de 10% do total de depoimentos aprovados. Além disso, em diversas ocasiões, os integrantes do colegiado foram surpreendidos com a ausência dos convocados: seis pessoas não apareceram para depor.
A comissão ainda analisou 192 requerimentos de informações sigilosas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), dos quais metade foi aprovada. Em resposta aos requerimentos, o Coaf enviou 63 documentos à comissão até o início de junho.
A “tietagem” que rolou nas reuniões da CPI foi um capítulo à parte. A influência e proximidade de alguns influenciadores digitais com senadores foi um tema recorrente e polêmico durante os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito.
A principal figura que gerou discussão sobre “tietagem” foi Virgínia Fonseca, que foi convocada como testemunha e, apesar de ter um habeas corpus que a permitia ficar em silêncio, respondeu à maioria das perguntas. Essa presença e a relação com senadores e membros da comissão levantaram questionamentos sobre a influência de influenciadores na CPI e sobre a necessidade de regulamentação das apostas on-line. No dia que Virgínia foi à CPI, não faltaram sessões de fotos, como se ela fosse uma importante celebridade.
Apesar do revés, a relatora afirmou que vai encaminhar as informações que reuniu para órgãos que poderão abrir investigações criminais, como o Ministério Público Federal.
A CPI enfrentou problemas para formação de quórum necessário para votação de requerimentos. Na apreciação do relatório final, que pedia o indiciamento de 16 pessoas, foi permitida votação remota.
A principal manifestação contrária ao acolhimento do relatório foi a do senador Eduardo Gomes. Ele sugeriu a retirada dos indiciamentos e disse que funcionamentos de CPIs no Congresso precisam ser revistos para evitar “xerifes”, “circo”, “pirotecnia”, “demagogia” e a “hipocrisia”. O senador Angelo Coronel criticou o prazo de dois dias entre a apresentação do documento e a votação.
A CPI sofreu forte pressão do lobby das apostas. Algumas reuniões tinham mais representantes e advogados das bets do que senadores. Além dos indiciamentos, o documento final sugeria a proibição do “jogo do tigrinho” e reajuste anual da taxa de outorga que bets precisam pagar para ter autorização de funcionamento.
A fase inicial dos trabalhos foi marcada por acusações de extorsão e pela atuação de senadores da “bancada das bets”. A balança pendeu para o lado das casas de apostas. As maiores do mercado se viram livres de quebras de sigilos financeiros e acabaram blindadas.
O declínio foi acentuado após a denúncia de que um lobista ligado a Soraya Thronicke estaria se apresentando a empresários ligados a empresas de apostas para oferecer blindagem. A suposta tentativa de extorsão teria ocorrido com um empresário piauiense.
A comissão de inquérito começou em 12 de novembro de 2024 e foi prorrogada em 30 de abril. O novo prazo final é 14 de junho. A relatora tentou nova prorrogação, mas o pedido não foi apreciado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).