Editorial
O STF e as redes sociais

Neste momento — e até o dia 17 de junho — acontece no Brasil uma importante — e necessária — consulta pública, lançada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) para receber contribuições da sociedade sobre princípios para regulação de plataformas digitais de redes sociais no País.
A proposta preliminar com dez princípios pode ser acessada na plataforma Diálogos. Os dez princípios elaborados pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil são: soberania e segurança nacional; liberdade de expressão, privacidade e direitos humanos; autodeterminação informacional; integridade da informação; inovação e desenvolvimento social; transparência e prestação de contas; interoperabilidade e portabilidade; prevenção de danos e responsabilidade; proporcionalidade regulatória; ambiente regulatório e governança multissetorial.
A mobilização da sociedade em torno deste debate tem o propósito de ajudar no avanço da regulação de plataformas digitais no País. O entendimento é que esses princípios devem equilibrar o poder das plataformas com a responsabilização por eventuais efeitos nocivos causados à sociedade, garantindo transparência, proporcionalidade, respeito à diversidade e aos direitos humanos.
No documento que contém a proposta preliminar para regulação, as redes sociais são definidas como serviços digitais que permitem a criação, publicação, compartilhamento e circulação de conteúdos gerados por usuários, além da interação social entre pessoas, grupos ou perfis públicos. O material ainda enfatiza que as redes sociais operam por meio de mecanismos “frequentemente monetizados por publicidade ou serviços pagos, e desempenham papel central na formação de redes de informação, expressão, influência e mercado”, diz a nota do Comitê Gestor da Internet no Brasil.
O documento disponível defende que a regulação deve ser orientada por princípios que garantam a defesa da soberania nacional, da democracia, assim como a proteção dos direitos fundamentais, a promoção de um ambiente de informações saudáveis, a preservação da liberdade de expressão e o estímulo à inovação.
Enquanto acontece a consulta pública, o Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para a retomada do julgamento sobre a responsabilização das redes sociais pelos conteúdos ilegais postados pelos usuários. O reinício está previsto para começar hoje.
O julgamento foi interrompido em dezembro do ano passado por um pedido de vista do ministro André Mendonça, que devolveu o processo para julgamento nesta semana. O Supremo julga a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), norma que estabeleceu os direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.
De acordo com o Artigo 19 da lei, “com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”, as plataformas só podem ser responsabilizadas pelas postagens de seus usuários se, após ordem judicial, não tomarem providências para retirar o conteúdo. Até o momento, três ministros já proferiram seus votos sobre a questão.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, votou pela responsabilização parcial das plataformas. Para o ministro, as redes devem retirar postagens com conteúdo envolvendo pornografia infantil, suicídio, tráfico de pessoas, terrorismo e ataques à democracia. Pela proposta, a medida deve ser tomada após as empresas serem notificadas pelos envolvidos.
Contudo, no entendimento de Barroso, a remoção de postagens com ofensas e crimes contra a honra dos cidadãos só pode ocorrer após decisão judicial, ou seja, como ocorre atualmente.
Os ministros Dias Toffoli e Luiz Fux também votaram a favor da responsabilização das plataformas. De acordo com os ministros, as plataformas devem retirar, após notificação extrajudicial, conteúdos considerados ilegais, como mensagens com ataques à democracia, incitação à violência e racismo, entre outros.
O plenário do STF julga dois processos que discutem a constitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet. Na ação relatada pelo ministro Dias Toffoli, o Tribunal julga a validade da regra que exige ordem judicial prévia para responsabilização dos provedores por atos ilícitos. O caso trata de um recurso do Facebook para derrubar decisão judicial que condenou a plataforma por danos morais pela criação de perfil falso de um usuário.
No processo relatado pelo ministro Luiz Fux, o STF discute se uma empresa que hospeda um site na internet deve fiscalizar conteúdos ofensivos e retirá-los do ar sem intervenção judicial. O recurso foi protocolado pelo Google.
Pela relevância da questão, já que o assunto é de interesse dos brasileiros que usam a Internet para fazer postagens ou expressar suas opiniões, todos devem ficar atentos às decisões e participar, se possível, da consulta pública. A discussão sobre o Marco da Internet no Brasil é fundamental para equilibrar liberdade de expressão e responsabilidade nas redes sociais. Por um lado, a regulamentação busca combater a desinformação, discursos de ódio e conteúdos ilegais, protegendo os usuários e a sociedade. Por outro, há o risco de censura e de limitar direitos fundamentais, se as regras não forem bem elaboradas.
A chave está em criar um Marco que seja transparente, proporcional e respeite a liberdade de expressão, ao mesmo tempo em que responsabiliza plataformas por conteúdos ilícitos. Essa é uma oportunidade de fortalecer a democracia digital, mas exige cuidado para não transformar a regulamentação em instrumento de controle excessivo.
No cenário atual, o desafio é garantir que a legislação seja um aliado na construção de um ambiente on-line mais seguro e justo, sem abrir mão dos direitos essenciais de todos os cidadãos.