Editorial
Arrecada bem, mas gasta muito
Em um primeiro momento é difícil de entender o que acontece com as contas do governo federal, pois fechou o primeiro semestre de 2024 com um déficit primário de R$ 68,69 bilhões, o pior desde 2020, e deve fechar o ano com uma cifra igualmente bilionária no negativo.
No entanto, a arrecadação da União com impostos e outras receitas teve recorde para o mês de setembro, alcançando R$ 203,17 bilhões, segundo dados divulgados ontem (22) pela Receita Federal. Também é o melhor desempenho arrecadatório para o acumulado de janeiro a setembro. No período, a arrecadação alcançou R$ 1,93 trilhão.
Quanto às receitas administradas pela Receita Federal, o valor arrecadado no mês passado de setembro ficou em R$ 196,64 bilhões. No acumulado do ano, a arrecadação do órgão federal alcançou R$ 1,84 trilhão. Os dados sobre a arrecadação estão disponíveis no site da Receita Federal.
Para o contribuinte — o(a) cidadão(a) brasileiro(a) pagador(a) de impostos — fica uma lógica o governo gasta muito mais do que arrecada. Porém, todo esse gasto, a grosso modo não interfere para melhor na vida do(a) cidadão(a). Ou seja, não há uma única melhoria na vida do povo brasileiro que justifique tanta gastança.
As contas públicas são objeto de atenção constante de gestores públicos, economistas, jornalistas, investidores e também do cidadão comum. Afinal, elas têm uma influência muito forte e decisiva no cenário econômico nacional e internacional e interfere na vida de todos. As contas públicas totalizam os gastos e as receitas do principal agente da economia nacional: o governo federal.
O governo recolhe impostos, taxas e contribuições para pagar a prestação de serviços à população. Ele também financia suas atividades levantando dinheiro com a venda de títulos públicos. As contabilidades dessas operações são feitas mensalmente e totalizadas em dois indicadores: o “resultado primário” e o “resultado nominal.”
O resultado primário indica o saldo entre os valores arrecadados e os valores gastos. Quando há mais arrecadação do que gasto, há superávit primário. Quando há mais gasto do que arrecadação — como vem ocorrendo continuamente no governo Lula —, há déficit primário.
O termo “primário” significa que o resultado não contabiliza outros valores, por exemplo aqueles que o governo desembolsou pagando juros ou resgates de títulos emitidos da dívida pública federal, e nem aquilo que arrecadou com a venda de novos títulos no mercado financeiro, dentro e fora do Brasil, junto a bancos, fundos de pensão, empresas e até pessoas físicas.
O indicador que faz essa contabilidade é o “resultado nominal”, que em síntese é a diferença, em determinado período, entre as receitas totais (arrecadação mais aplicações financeiras) e as despesas totais (gastos mais despesas com juros). Os resultados nominais acumulados são totalizados no estoque da dívida pública.
De acordo com o diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Marco Antônio Cavalcanti, “a maioria dos países olha para a geração de superávits primários como sendo o requisito necessário para que os governos consigam levar uma trajetória sustentável da dívida pública de forma virtuosa”.
O resultado primário é o caminho mais fácil para se avaliar se o déficit eventualmente é causado por conta de o governo estar gastando muito. E é esse o caso.
Segundo ele, o resultado primário é uma informação muito sensível aos investidores. “Quando alguém resolve comprar títulos da dívida pública, avaliar a possibilidade de montar um negócio no Brasil ou expandir as suas operações, precisa ter algum grau de certeza de que o país não corre o risco de quebrar. Eles estão olhando, na verdade, se o governo tem capacidade, ou pelo menos está na trajetória, de conseguir arcar com as suas despesas de forma mais estrutural”.
Resumindo, é notório que algo não vai bem. O dinheiro entra fácil e a todo momento nas contas do governo. Mas, ao que parece, também sai com uma velocidade impressionante. Há de se buscar um equilíbrio em nome do bem estar de todos os brasileiros e fechar, urgentemente, a torneira da gastança desenfreada.